Coisas ‘tradicionalmente’ russas que não são realmente russas (FOTOS)

Estilo de vida
EKATERINA SINELSCHIKOVA
É verdade que as primeiras botas de feltro (as ‘válenki’ russas) foram encontradas em um antigo cemitério iraniano? Ou que elas só surgiram na Rússia no final do século 18? Contamos sobre os mais famosos objetos russos e suas origens!

Válenki

Algo muito semelhante às “válenki” (botas de feltro russas) era usado pelos antigos habitantes das montanhas do Altai. Os cientistas descobriram isso há mais de 30 anos atrás, enquanto escavavam o planalto Ukok, em Altai: devido ao congelamento, se conservaram ali os túmulos de tribos iranianas dos séculos 4 a 3 antes de Cristo. Hoje, naquela área fica a fronteira entre a Mongólia, China, Rússia e Cazaquistão, mas naqueles dias havia apenas pastagens de verão, trilhas de inverno e trilhas nômades.

O feltro era um material bem disseminado por todos os povos da Ásia Central, especialmente as tribos túrquicas e mongólicas. Eles o usavam para fazer roupas, tapetes, pontas de flechas, enfeites e sapatos. Na antiga Rus, os sapatos eram feitos de couro, líber e peles, mas só foram descobertos sapatos de feltro a partir da invasão tártaro-mongol, no século 13. Mas até mesmo depois disso as “válenki” não se disseminaram: só podiam pagar por elas quem era bastante rico.

As “válenki” já no “formato russo” surgiram no final do século 18, quando os velhos crentes da província de Níjni Nôvgorod inventaram uma tecnologia para selar sem costura o feltro. O método industrial de produção também barateou seus custos e as “válenki” passaram a ficar associadas à Rússia após a “Grande Exibição de Produtos Industriais de Todas as Nações” de Londres, em 1851. Depois disso, as “válenki” foram expostas na “Feira Mundial” de Viena (1873), Chicago (1893) e Paris (1900).

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Kokôchnik

Símbolo do traje tradicional russo, esta tiara teria três “pátrias”. Reza uma das lendas que o “kokôchnik” chegou à Rússia vindo de Bizâncio. A tiara bizantina teria agradado muito as filhas dos príncipes russos durante um período de intensas trocas religiosas e culturais.

Uma descrição do adorno, em forma de pente com uma chapa, foi encontrada pelos historiadores nas crônicas de Nôvgorod dos séculos 11. Há outras hipóteses, porém, para sua origem, que seria muito anterior aos “kokôchnik” tradicionais russos, já usados pelas tribos mongóis e de Mordóvia.

Mas, de onde quer que o enfeite tenha vindo, na Rússia ele se disseminou rapidamente. Teve grande influência nesse fenômeno uma relação especial dos russos com os cabelos: na mitologia eslava, o cabelo feminino solto era uma imagem bastante ameaçadora e uma moça com os cabelos desarrumados significava má sorte.

Assim, o “kokôchnik” veio a calhar para as mulheres de todas as camadas sociais. Mas ele foi gradualmente foi descartado por Pedro, o Grande, que em decreto de 1701 obrigava a aristocracia a usar roupas europeias e dispensar o “kokôchnik” — medida que afetou comerciantes, burguesas e camponesas.

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Gjel

A famosa porcelana “gjel” pintada de azul e branco surgiu na Rússia de Pedro, o Grande. Esses ornamentos de cobalto foram feitos “em homenagem aos holandeses”, porque, assim como todos os outros empréstimos culturais europeus feitos pelo tsar russo, o “azul Delft” — um estilo especial de pintura dos mestres da cidade de Delft, na Holanda — também veio do Ocidente.

A vila de Gjel, perto de Moscou, já era um centro de referência da cerâmica e lar das primeiras porcelanas russas. Mas, durante a época Petrina, elas eram pintadas com cores brilhantes — ocre, esmeralda e bordô —, enquanto os artefatos retratavam cenas cotidianas no estilo dos "lubok".

O “azul Delft” só começou a ser produzido mais tarde ali, em meados do século 19. Por um lado, isso foi ditado pela moda (inclusive das porcelanas chinesas). Por outro, os mestres perceberam que o “gjel” monocromático era mais demandado no mercado europeu. Flores com camadas múltiplas e profundas se tornaram a marca registrada do “gjel” e lhe renderam fama por todo o mundo.

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Adorno “ogurets”

A icônica impressão “de pepino” (em russo, “ogretchni”) ou Caxemira é uma estampa muito antigo. Considera-se que ela tenha surgido no antigo império Sassânida (também chamado de Segundo Império Persa) que existiu em território do Iraque moderno e do Irã no início do primeiro milênio.

Por rotas comerciais, o ornamento espalhou-se pela Índia, Oriente e África, e chegou à Europa chegou no século 17 graças aos colonizadores britânicos, que  o chamavam de “paisley”. No século seguinte, ele foi parar na Rússia, unindo organicamente a linha de ornamentos vegetais, que eram populares ali.

A estampa, considerada chique, tornou-se uma das mais demandadas pelos mestres dos xales de Pavlovsk Possad — e o xale dali talvez seja o mais famoso da Rússia pelo mundo afora hoje.

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Uchanka

Este é outro objeto cujas raízes remontam ao planalto Ukok. Durante aquelas mesmas escavações supramencionadas, foi encontrado um capacete de feltro do século 4 antes de Cristo – com uma ponta no topo, encimado pela imagem de uma cabeça de um pássaro e com “orelhas”.

Mais tarde, este tipo de chapéu se espalhou entre os povos da Ásia Central: os mongóis, os quirguizes, os bachquires e os buriates. Acredita-se que o protótipo da “uchanka”, o chapéu russo com “orelhas”, tenha sido um chapéu mongol pontiagudo chamado “malakhai”.

Desde então, ele passou por muitas modificações e ainda não se tornou arcaico. Nos anos 1940, a “uchanka” passou a fazer parte do uniforme de inverno do Exército Vermelho.

Se os mongóis valorizavam o “malakhai” porque flechas de menor velocidade não conseguiam penetrar uma proteção tão quente, os camponeses, soldados e até mesmo as rainhas (a mãe de Pedro, o Grande, por exemplo, tinha três deles no guarda-roupa) o adoravam pelo fato de que era simplesmente indispensável nos rigorosos invernos russos!

Descubra mais sobre a uchanka aqui!

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