O ‘outro Tolstói’ em 5 obras imperdíveis!

Cultura
ALEKSANDRA GÚZEVA
Aleksêi Tolstói, criador da 'versão russa de Pinóquio', era parente distante do autor de Guerra e Paz.

Apesar de não ter sido um pensador de influência global como seu aparentado conde Lev, Aleksêi Tolstói deixou um legado muito interessante que é até mesmo incluído nos currículos escolares russos.

Em 2018, celebra-se o aniversário de 135 anos desde o nascimento do escritor. O Russia Beyond apresenta aqui suas obras mais renomadas:

1.“O caminho dos tormentos” (1921-41)

A trilogia “Khojdênie po mukam” (publicado pela editora Civilização Brasileira nos anos 1960 como “O caminho dos tormentos”) é especialmente atual devido à celebração, no ano passado, do centenário da Revolução de 1917, quando foram lançados muitos novos livros e filmes sobre os eventos que levaram os bolcheviques ao poder.

Já escrevemos por aqui sobre as obras russos mais famosas sobre esses acontecimentos, obrigatórios para se compreender melhor a revolução, mas há ainda outro título que vale a pena e que foi adaptado para o cinema e a TV diversas vezes na Rússia.

Os três volumes – “Irmãs”, “O ano de 1918” e “Manhã Sombria” – são escritos no estilo do “realismo monumental”, como o próprio autor dizia.

A obra se inicia em meio ao caos e a ruína de São Petersburgo em 1914 e termina com a vitória esmagadora do Exército Vermelho sobre o Branco na Guerra Civil. O romance retrata o destino da “inteligentsia” russa durante este tumulto e, como em qualquer romance clássico, Tolstói mostra o verdadeiro amor.

O primeiro tomo foi escrito no início dos anos 1920 e é uma narrativa calma e imparcial, mas o último, finalizado em 1941, é marcado pela ostensiva propaganda e caráter pretensioso. Aliás, a trilogia rendeu o Prêmio Stálin a Tolstói.

2.“Conde Cagliostro” (1921)

Nós provavelmente não incluiríamos este livro na lista de obras obrigatórias de Tolstói, não fosse pelo lendário filme soviético, que acabou ganhando mais popularidade ainda que o texto.

Utilizando-se de fontes documentais, Tolstói criou sua própria versão da controversa figura italiana do século 16 e suas aventuras na Rússia. O alquimista e trapaceiro Cagliostro criou uma balbúrdia em uma pequena cidade de província e, quando suas fraudes foram descobertas, teve que fugir.

A trama é uma coisa totalmente à Woody Allen (apesar de muitíssimo anterior) e o romance até chegou a ser chamado no início de “Umidade do Luar”. Isso te remete a “Magia ao Luar”?

A escolha do tema pode parecer estranha, mas no final do século 19 a aristocracia russa estava interessada em todo o tipo de rituais mágicos, ocultismo e curas místicas.

O interesse emanava, em grande parte, da imperatriz Aleksandra, mulher de Nikolai II. Ela era a maior fã de tudo o que era místico e convidou milagreiros para a corte, tais como Maître Philippe e Grigóri Rasputin.

O livro não foi vertido para o português.

3.“O declínio de Marte” (1923) e “A máquina infernal do engenheiro Garin” (1927)

A gama de gêneros que Tolstói percorreu inclui também a ficção científica e, na realidade, ele foi um de seus pioneiros. O romance “Aelita”, publicado em português como “O declínio de Marte” pela editora Ulisseia nos anos 1960, retrata terráqueos viajando a Marte, e foi escrito inicialmente para adultos.

Mais tarde, porém, Tolstói transformou a obra em juvenil. O livro conta a história de um engenheiro, Mstislav Los, que cria uma nave espacial interplanetária e decola para o planeta vermelho com um ex-soldado do Exército Vermelho.

Em Marte, eles veem os mesmo problemas políticos e sociais que na Terra – um ditador oprime o povo, mas um corajoso proletário lidera um grupo revolucionário.

Para retratar de maneira precisa questões técnicas, Tolstói estudou a pesquisa espacial de Konstantín Tsiolkovski, e para outro livro de ficção científica seu, “A máquina infernal do engenheiro Garin” (publicado em português em 1959 pela editora Brasiliense), o autor pediu conselhos ao cientista Piotr Lazárev sobre física molecular.

O engenheiro Garin cria o “hyperboloide”, um equipamento similar ao laser, e com sua ajuda destrói uma ilha no Oceano Pacífico e começa a mineração de outro nas entranhas mais profundas da Terra.

Ele se torna um ditador até que corajosos revolucionários soviéticos aparecem para salvar o mundo.

4.“Pedro o Grande” (1930-34)

Este livro enorme, que saiu em dois volumes em português em 1978 pela Editora Dois Amigos, retrata os primeiros anos do primeiro imperador da Rússia, Pedro, o Grande. Foi um livro que aterrorizou as crianças russas, porque era leitura obrigatória nas férias de verão.

Como novela histórica, o livro é claramente fruto de seu tempo, porque cede à propaganda. Historiadores dizem que ele teria sido escrito por ordem direta de Stálin, como parte dos esforços para impulsionar o culto a sua personalidade.

Assim como o filme de Eisenstein “Ivan, o terrível”, o livro claramente se refere ao líder soviético.

Neste caso, porém, Tolstói traça paralelos entre Stálin e Pedro, o Grande. O principal objetivo da arte realista socialista era justificar o grande número de pessoas mortas durante a construção do futuro “paraíso” socialista.

O título, porém, tem certa exatidão histórica e usa muitos detalhes para retratar cenas em diversas locações: igrejas, pequenas casas de madeira e palácios. O mais importante, porém, é que ele é muito interessante de se ler!

5.“A chavezinha de ouro ou as aventuras de Buratino” (1936)

Aleksêi Tolstói escreveu diversos contos infantis e contos de fadas, mas o menino de madeira Buratino é, provavalmente, uma de suas mais famosas criações.

Você acha que já ouviu algo parecido? Claro! “A chavezinha de ouro ou as aventuras de Buratino” (publicado em português pela Editora Raduga em 1990) foi inspirado em “As aventuras de Pinóquio”, de Carlo Collodi.

Ao editar a tradução russa do conto italiano, Tolstói introduziu mudanças significativas para aproximar o livro mais do público russo, tornando-o mais fácil e claro para as crianças soviéticas. Por exemplo, o nome original do pai, Geppetto, foi alterado para Papa Carlo.

Tolstói resolveu escrever sua própria versão porque a história de Collodi não era considerada “progressista” o suficiente para a nação soviética. Assim, o livro de Tolstói tem algumas diferenças na trama e nos personagens, e o nariz de Buratino não cresce quando ele mente.

Na verdade, o “Pinóquio russo” nem chega a mentir muito, porque isso não seria um bom exemplo para as crianças soviéticas.

O livro também foi adaptado para uma animação e se tornou o conto mais amado das crianças soviéticas.

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