Como o Natal era celebrado na Rússia tsarista? (FOTOS)

História
ALEKSANDRA GÚZEVA
Os bolcheviques proibiram a antiga tradição cristã e a substituíram por uma pródiga celebração do Ano Novo. Mas como era o Natal antes da Revolução?

Na URSS e na Rússia de hoje, as pessoas estão acostumadas com a ideia de que o principal feriado de final de ano é o Réveillon. Eles o celebraram muitas vezes com grandes festanças e muitos amigos e familiares. Há muita comida, saladas, caviar, tangerinas e champanhe, além do discurso obrigatório de felicitações do presidente do país na televisão pouco antes do toque da meia-noite. Depois disso, há diversão até de manhã e fogos de artifício na rua.

Mas a tradição da celebração do Réveillon só surgiu na década de 1930. O governo soviético decidiu promover esse feriado principalmente para crianças, para que elas pudessem ganhar presentes. Além disso, a URSS tomou de empréstimo o principal atributo do Natal: a árvore de Natal (que, na Rússia, é “árvore de Ano Novo”). Aos poucos, todos os adultos acostumados a uma grande celebração no meio do inverno se juntaram às comemorações.

Antes da Revolução, os cristãos ortodoxos russos celebravam o Natal em 25 de dezembro, assim como os católicos. Em 1918, os bolcheviques trocaram de calendário, passando do juliano ao gregoriano, e o feriado passou a ocorrer 13 dias mais tarde. Desde então, o Natal da Igreja Ortodoxa Russa é comemorado em 7 de janeiro. 

O Natal sempre foi mais que uma simples celebração noturna. As pessoas ansiavam pela data. A véspera começava com festas, passeios incontidos e máscaras, e isso se prolongava por mais duas semanas. Essa tradição tinha raízes eslavas antigas.

Lev Tolstói descreve assim esse feliz período do ano em seu romance “Guerra e Paz”: "Os servos  arrumados, ursos, turcos, donas de estalagem e senhorinhas, os assustadores e os engraçados, traziam consigo o frio e a alegria, primeiro se arrastando timidamente para o salão; depois, escondidos uns atrás dos outros, se amontoavam no salão e, timidamente, se tornavam cada vez mais alegres e amigáveis, começavam as canções, as danças, os corais e jogos natalinos.”

Antes do Natal, muitas cidades realizavam bazares de caridade.

A primeira coisa a fazer era certificar-se de que todas as crianças recebessem presentes. As autoridades municipais muitas vezes arranjaram presentes para dar às crianças mais pobres.

Entre o final do século 19 e o início do século 20, o envio de cartões de Natal tornou-se moda. Normalmente, os cartões eram assinados e entregues nos correios com antecedência. Os cartões eram desenhados por artistas famosos. Essa tradição também teve continuidade nos tempos soviéticos.

Um evento importante era a escolha da árvore de Natal. Para tanto, os nobres mandavam seus criados para a floresta, enquanto os menos abastados buscavam árvores pequenas.

A maioria dos moradores urbanos, entretanto, ia aos mercados de pinheiros, que se assemelhavam aos dos dias atuais.

Mas entregar uma árvore enorme e linda era algo mais problemático: era impossível sem uma carruagem ou um transporte pessoal.

A árvore de Natal era enfeitada em segredo e escondida das crianças. Quando ficava pronta, as crianças eram chamadas com um sino para ver o milagre de Natal — e ficavam muito impressionadas!

Lev Tolstói escreveu sobre o Natal, em 1870: "No dia de Natal havia uma magnífica árvore. Hannah, as crianças e eu torramos as nozes com antecedência, vestimos as bonecas, colamos as caixas e fizemos flores. A família Diakov trouxe belos brinquedos, escolhidos com gosto e amor especiais. À tarde todos foram patinar... e o ambiente estava alegre e feliz."

Boris Pasternak descreve assim a celebração de Natal pré-revolucionária de uma família nobre no início do século 20: "Desde tempos imemoriais, as árvores de Natal da família Sventitski tinham sido arranjadas seguindo este padrão. Às dez horas, quando as crianças estavam dispersas, uma segunda era acesa para os jovens e adultos e eles se divertiam até de manhã. Os mais velhos jogavam cartas a noite inteira [...] Ao amanhecer, eles almoçavam com toda a comunidade.”

Ele continua com a descrição dos vestidos suntuosos e brilhos que passavam pela árvore e as danças que se desenrolavam ao seu redor.

A preparação do jantar de Natal era  planejada com antecedência e as provisões eram adquiridas muito antes da efeméride. As pessoas mantinham um jejum rigoroso até a véspera de Natal, e naquela noite podiam comer presunto, caviar e tortas com recheios variados.

Jantares e festas de Natal eram realizados após a efeméride e se estendiam até o Ano Novo.

Até mesmo na frente de batalha ninguém se esquecia do Natal. Havia sempre padres regimentais nas tropas russas e, durante a Primeira Guerra Mundial, em 1914, houve até mesmo uma pausa nos combates na noite de Natal. Naquela época, os ortodoxos ainda celebravam o Natal em 25 de dezembro, assim como os católicos.

LEIA TAMBÉM: Natal russo (ou “Como os bolcheviques bagunçaram o feriado”)