5 razões para assistir à mais nova adaptação russa de ‘O mestre e Margarida’

Cultura
NIKOLAI KORNÁTSKI
Filme adaptado do icônico romance de Mikhail Bulgákov lidera as bilheterias russas desde a primeira semana de lançamento.

A história sobre as desventuras do Diabo na Moscou da era Stálin foi difícil de publicar durante muito tempo; o mesmo destino se abateu sobre as adaptações para as telonas. Muitos tentaram adaptar o romance “amaldiçoado”, incluindo Baz Luhrman e Elem Klimov (o diretor por trás do lendário filme antiguerra de 1985 ‘Vá e Veja’). No entanto, muitas destas versões jamais viram a luz do dia. A adaptação atual é a sexta da fila e, segundo público e a crítica especializada, acerta como nenhuma outra. Vejamos as razões para isso:

1. Todo mundo fala sobre o romance de Bulgákov como sendo amaldiçoado – e a produção mais recente não é diferente

A imprensa adora especular sobre a suposta maldição de ‘O mestre e Margarida’ e todas as tentativas de adaptá-la para as telonas. Houve um tempo em que Oleg Basilachvili, que interpretou Woland na série de TV russa de 2005, perdeu brevemente a voz durante as filmagens. Os jornalistas também notaram a estranha sequência de mortes de atores que se seguiram à estreia do programa – 18 delas, no espaço de alguns anos. Superstições à parte, é verdade que todas as tentativas de adaptar o romance de Bulgákov para o cinema foram repletas de obstáculos. E este último filme não foi uma exceção.

Nikolai Lebedev (‘Lenda nº 17’) era o primeiro na fila para dirigir a adaptação atual e também é a figura por trás do roteiro original. Porém, houve uma confusão inicial, uma vez que diferentes descendentes de Bulgákov teriam vendido os direitos autorais a empresas diversas: descobriu-se que, enquanto o atual filme russo estava em produção, Hollywood estava ocupada fazendo a sua própria adaptação com o realizador australiano Baz Luhrman (“O Grande Gatsby”, de 2013) no comando das filmagens.

Assim que a questão legal foi resolvida, veio a pandemia de covid-19, interrompendo a produção. Lebedev voltou a concentrar sua atenção em seu drama de guerra ‘Nurnberg’, enquanto ‘O mestre e Margarida’ foi passado para uma produtora diferente, que reformulou totalmente o roteiro existente.

2. O promissor diretor Michael Lokshin, cujo ‘Cidade de Gelo’ se tornou um sucesso da Netflix, esteve envolvido

O norte-americano Michael Lokshin ganhou destaque pela primeira vez como diretor de peças publicitárias e videoclipes. Entre outras coisas, esteve por trás do anúncio de 2014 da cerveja ‘Sibirskaya Korona’, estrelado por David Duchovny, conhecido como o Mulder da série cult ‘Arquivo X’ (1993-2018) – e que, aliás, tem raízes russas. No pequeno clipe, que se tornou viral na Rússia, Duchovny fantasia sobre como seria se ele tivesse nascido na Rússia.

A estreia de Lokshin nas telonas veio com ‘Cidade de Gelo’ (2020) — um conto de Natal sobre uma pequena gangue de ladrões patinadores no gelo na São Petersburgo tsarista, que entrou no Top 5 da Netflix após o lançamento.

‘O mestre e Margarida’ é apenas a segunda tentativa de Lokshin de dirigir um filme completo. Já o roteiro foi escrito pelo autor de ‘Cidade de Gelo’, Roman Kantor, que trabalhou anteriormente em ‘Cidade dos Mortos’.

3. O filme recorre a uma narrativa não linear à la Christopher Nolan

A versão cancelada da adaptação escrita por Nikolai Lebedev mantinha a estrutura narrativa original do romance, porém Lokshin e Kantor optaram por uma abordagem mais pós-moderna, semelhante a ‘A Origem’ (2010) e a ‘O Terceiro Passo’ (2006), ambos de Christopher Nolan.

O arco da história foi mantido no romance: vê-se a história de amor entre o mestre e Margarida, bem como a interferência de Woland e o 'evangelho do mestre' - uma brincadeira com a história de Cristo e Pôncio Pilates, o promotor romano encarregado de crucificá-lo. Mas o roteiro tornou-se mais complexo e agora se assemelha a uma boneca russa matriochka, em que uma história existe dentro de outra e assim por diante – com cada uma progredindo simultaneamente.

A escolha de seguir esse caminho também não é um artifício, mas uma tentativa de explicar o método do próprio Bulgákov. O resultado é que o atual “mestre” tornou-se uma aproximação mais próxima do estilo original do escritor do que o testemunhado no romance propriamente dito. Evguêni Tsiganov – um dos atores russos mais requisitados da atualidade – interpreta o próprio autor. Podemos testemunhar fatos reais da biografia de Bulgákov – a luta contra a censura, a repressão e a traição às mãos de amigos – que se desenrolam na tela sob a forma de histórias fantasmagóricas.

4. O ator alemão August Diehl interpreta Woland, enquanto Pilatos é interpretado pelo dinamarquês Claes Bang

O elenco é fantástico em todos os aspectos. No passado, Woland costumava ser retratado como um velho sábio e malvado, enquanto o retrato de Diehl é mais como um brincalhão espirituoso, divertido e travesso. E realmente se diverte executando seu julgamento sobre os moscovitas. Enquanto isso, Pôncio Pilatos é interpretado pelo ator dinamarquês Claes Bang, mais conhecido por seu papel na série de TV ‘Drácula’ da BBC. Os atores russos também estão bem escalados – especialmente Tsiganov como o Mestre e Iúlia Snigir como sua amada Margarida (os dois são casados na vida real). Snigir será reconhecida por alguns por seus papéis, como em ‘Duro de Matar - Um Bom Dia para Morrer’ (2013) e ‘The New Pope’ (2020).

5. O visual do filme combina art déco no estilo Gatsby com steampunk stalinista

O filme se passa na mente de seus protagonistas, portanto, reproduzir a verdadeira Moscou da década de 1930 não era a principal preocupação dos artistas visuais. O pomposo estilo Império Stalinista é ampliado a níveis grotescos – há os constantes arranha-céus das “Sete Irmãs”, reminiscentes dos zigurates mesopotâmicos. Com recursos de CGI, os criadores se comprometeram a exibir os projetos não realizados – entre eles, o grandioso Palácio dos Sovietes, com sua estátua de 100 metros de Vladímir Lênin, bem como os tradicionais zepelins de aparência futurista nos céus.

Os moscovitas do filme certamente sabem festejar. Os shows de jazz em um clube exclusivo de escritores lembram algo saído de “O Grande Gatsby” de Baz Luhrman; uma sessão de magia negra no teatro parece mais um desfile de moda parisiense; e a comitiva de Woland é retratada de forma colorida, de forma muito commedia dell’arte. Já o grande baile de Satanás aparece como uma espécie de evento pré-cristão: o guarda-roupa e o design de interiores parecem remontar à era do Antigo Egito e da Babilônia.

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