O roteiro do filme foi escrito pelos irmãos Strugátski livremente baseado em seu próprio romance de ficção científica “Piquenique na Estrada”. Durante muito tempo foi considerado impossível transportar suas obras para as telonas, pois eram muito significativas para o formato cinematográfico. Porém, tudo mudou quando Andrei Tarkóvski (também grafado Tarkovsky) se interessou pelo projeto. O cineasta, que já era conhecido na época, preferia a literatura clássica russa, então, mudou o enredo e os personagens da história. A ficção tornou-se uma parábola filosófica sobre os perigos do desejo.
O resultado? Um prêmio especial do júri para um filme fora de competição em Cannes em 1980, lotando os cinemas dos Estados Unidos, França e Alemanha. “Stalker” causou sensação e colocou Tarkóvski no mesmo patamar dos eminentes diretores da época.
O filme foi rodado perto de Tallinn, na República Socialista Soviética da Estônia, porém originalmente seria filmado em Isfara, no atual Tadjiquistão. Um terremoto repentino na região, porém, mudou os planos da equipe de filmagem e o desenvolvimento visual da ficção científica nos anos seguintes.
Afinal, se a Odisseia no Espaço de Kubrick abriu o mundo para o cosmos cinematográfico, “Stalker” era um mundo pós-apocalíptico cinza e verde. No filme, a civilização desapareceu e deixou para trás a Zona, um lugar perigoso para onde os personagens se encaminham.
Este território está cheio de armadilhas e quebra-cabeças, mas paradoxalmente agrada aos olhos, ao contrário, por exemplo, da cidade do início do filme, que Tarkóvski mostra deliberadamente em feios tons de amarelo e cinza. Paisagens verdes, postes elétricos cobertos de musgo, cascatas: a natureza da zona parece ter enlouquecido e recuperado a sua beleza original. As técnicas visuais ajudam o diretor a formar uma imagem da área como um lugar incomparável, quase mágico.
No entanto, isso não foi fácil. De acordo com algumas recordações das filmagens, Tarkóvski controlava maniacamente tudo em seu trabalho — até mesmo a cor e o comprimento da grama no enquadramento.
“Estive me preparando para este filme a minha vida toda e filmei-o durante dois anos”, disse Tarkóvski sobre o trabalho árduo para a execução do longa. E é verdade: “Stalker” se tornou não apenas o seu último filme rodado em sua terra natal, mas também o ponto culminante de sua jornada criativa.
Ao longo de toda a sua carreira, Tarkóvski preocupou-se com a busca do transcendente, ou do sentido da vida. Em suas obras levantou questões sobre Deus e o lugar do homem no mundo. “Stalker” aborda o problema através do prisma da fé.
Porém, Tarkóvski é lembrado ainda mais por outra característica: seu amor por lentidão, diferente de tudo. O mínimo de cortes e montagem, os monólogos de personagens tendo como pano de fundo paisagens, e as longas pausas sem palavras.
A narrativa meditativa de Tarkóvski é bem explicada pelo crítico de cinema norte-americano Roger Ebert. Segundo ele, os longos planos do diretor não são para entreter, mas para serem absorvidos.
Ainda hoje é fácil encontrar referências a “Stalker” em várias produções. Alguns tentam repetir a narração cuidadosa, outros chupinham quase que todo o enredo do filme. Foi o que fizeram os criadores do filme “Aniquilação”, de 2018, com Natalie Portman no papel principal.
A influência de “Stalker” é evidente fora do cinema: as técnicas artísticas de Tarkóvski ajudaram os criadores da série de games de mesmo nome, os autores da série “Chernobyl” e muitos outros. O próprio cenário pós-apocalíptico seria diferente se não fosse pela perigosa zona verde-acinzentada “desenhada” por Tarkóvski nas terras devastadas da Estônia.
Seis anos após o lançamento do filme, ocorreu uma das piores tragédias da União Soviética: a explosão da usina nuclear de Chernobyl. Uma zona de exclusão foi construída ao redor do local e, depois de um tempo, guias (stalker) começam a ir até lá, procurar coisas estranhas e fazer excursões, assim como no filme.
O livro dos Strugátski e o filme de Tarkóvski não apenas forneceram uma linguagem para descrever o mundo após a tragédia, mas também previram as paisagens da região, seu clima incomparável que atingiu o mundo em 1986.
O acidente de Chernobyl tornou-se um símbolo do final do período soviético e, ao mesmo tempo, “Stalker” foi seu principal reflexo no cinema.
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