Quando Maradona perdeu o avião e chegou a Moscou na maior estica

História
IGOR ROZIN
No dia do último desfile da Revolução de Outubro, em 7 de novembro de 1990, o jogador argentino Diego Maradona disputou sua última partida na Liga dos Campeões, no Estádio Lênin. A véspera, porém, foi cheia de reviravoltas curiosas.

Novembro de 1990. A União Soviética teria pouco mais de um ano de vida (conturbada) quando o Napoli chegou a Moscou para as oitavas de final da Liga dos Campeões. A partida seria contra a equipe local do Spartak. O mais esperado era, obviamente, o jogador de futebol argentino Diego Armando Maradona, que havia dado ao Napoli o segundo título no campeonato anterior.

Mas Maradona não saiu do avião. Os repórteres soviéticos souberam pouco depois que o campeão havia passado uma de suas famosas noitadas e chegara tarde ao aeroporto, perdendo o voo. A reação foi uma mistura de alívio para o time do Spartak, que teria a sorte de jogar sem seu adversário mais perigoso, mas também de pesar, já que os jogadores e fãs soviéticos não poderiam conhecer a lenda pessoalmente.

Depois de algumas horas, porém, surgiu outro boato: Maradona estava voando para a União Soviética em um jato particular. E assim foi.

Quando soube-se que ele passaria a noite com a mulher, Claudia Villafañe, no Hotel Berlin (atualmente conhecido como ‘Savoy’), uma multidão de curiosos se reuniu do lado de fora do estabelecimento. Por outro lado, havia apenas alguns repórteres e um único fotojornalista: Aleksandr Jakovlev, da agência de notícias Tass. Foi ele quem imortalizou Maradona em uma foto realmente incomum: vestindo um casaco de pele longo e grosso. E vestido assim, o “Pibe de Oro” resolveu fazer um tour por Moscou.

Seu avião pousou na capital soviética às 11 da noite, 18 horas antes do início da partida. Era meia-noite e quarenta quando ele fez check-in no hotel e pediu algo pra comer. Mas não foi possível, porque a cozinha estava fechada há algum tempo.

Maradona ficou decepcionado e, para consolá-lo, ofereceram-lhe um passeio exclusivo pelas ruas desertas de Moscou à noite em um carro da “milítsia” (nome da polícia na época). Ele saiu às 2h10, cercado de admiradores e policiais sorridentes.

No dia seguinte era o aniversário da Revolução de Outubro e, como de costume, seria realizado um grande desfile na Praça Vermelha. Os policiais, em uma quebra de protocolo sem precedentes, conseguiram ainda levá-lo para passear na praça fechada.

Naquela noite de 7 de novembro, aconteceria a partida entre o Spartak e o Napoli no Estádio Lênin (atual Lujniki). O técnico do Napoli, Albertino Bigon, estava em uma posição difícil: deixar Maradona jogar ou puni-lo por violar as regras de conduta? Na equipe do Spartak também havia dúvidas: Maradona jogaria ou não após o ocorrido?

Como castigo, e por não ter conseguido treinar com a equipe, o jogador argentino iniciou a partida no banco como reserva. Mas, para alegria dos mais de 1000 mil torcedores que se aglomeraram no Estádio Lênin sob o forte granizo de novembro, Maradona enfim entrou aos 20 minutos do segundo tempo.

Jogou bem, e até fez algumas boas tentativas, mas não conseguiu marcar gol. Quando o juiz apitou, encerrando o segundo tempo, ainda estava 0 a 0. E assim foi após a prorrogação. Então o jogo foi para os pênaltis. Embora Maradona não tenha decepcionado, seu companheiro de equipe Marco Baroni selou o destino do Napoli ao perder o pênalti, e os soviéticos saíram vitoriosos com os cinco gols.

Segundo o fotógrafo da TASS, que havia clicado Maradona no hotel Berlin, a única foto que ele gostou ainda mais do que as imagens históricas do jogador em casaco de pele foi a que ele tirou naquela noite em campo: uma defesa precisa do zagueiro do Spartak Boris Pozdniakov que deteve Maradona em um lance perigoso.

Naquela noite de novembro, entre entrevistas com jornalistas soviéticos e presentes dos adversários do Spartak, que fizeram fila no vestiário para apertar sua mão, chegou ao fim a participação de Maradona na Liga dos Campeões.

Pouco depois, em março de 1991, após testar positivo para cocaína e “fugir” do Napoli, sua estada na Itália também se encerrou. Maradona faleceu nesta quarta, 25 de novembro, trinta anos depois daquela viagem maluca a Moscou. Mas sua histórico como lenda permanece na Rússia: a de um dos melhores jogadores de futebol de todos os tempos – e a de um jogador vestido com pele na Praça Vermelha deserta.

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