Os 3 patriarcas mais importantes da Igreja Ortodoxa e da história da Rússia

História
ALEKSANDRA GÚZEVA
Essas pessoas não apenas lideraram a Igreja na Rússia, mas também estavam ativamente envolvidas na política, foram missionários e reformadores e afetaram o desenvolvimento de todo o país.

1. Filareto (viveu de 1553/1554 a 1633; foi patriarca de 1619 a 1633)

Fiódor Romanov nunca teve planos de se tornar monge ou patriarca. Filho de um nobre boiardo e sobrinho da primeira esposa de Ivan, o Terrível, ele era um homem altamente instruído e também conhecido nas camadas superiores da sociedade moscovita no final do século 16.

No entanto, foi a sua proximidade com a família real que determinou o seu destino. Após a morte do tsar Teodoro 1º, último representante da dinastia ruríquida, não sobrou nenhum herdeiro direto. De acordo com uma versão, o futuro tsar Boris Godunov considerava Fiódor Romanov um rival na luta pelo trono e o tornou um monge à força para privá-lo desse direito.

A ascensão de Filareto aconteceu durante o Tempo de Dificuldades e na intervenção polonesa, o Falso Demétrio 1º libertou o monge e o nomeou metropolita. Durante o reinado de Falso Demétrio 2º, Filareto desempenhou o papel de patriarca e depois foi capturado pelos poloneses.

Posteriormente, ficou claro que Filareto estava realmente muito perto de se tornar o novo Tsar de Toda a Rússia. Em 1613, seu filho, Mikhail Romanov, foi nomeado tsar Miguel 1º e se tornou o fundador da dinastia Romanov.

Filareto foi solenemente resgatado do cativeiro em 1619 e se tornou o patriarca legítimo da Igreja Ortodoxa Russa. Na verdade, Filareto era cogovernante com seu filho, pois resolvia a maioria das questões do Estado e assinava importantes documentos governamentais.

2. Nikon (viveu de 1605 a 1681; foi patriarca de 1652 a 1666)

Nikon nasceu na região de Níjni Nôvgorod. Antes de se tornar patriarca, foi padre, casou-se — sim, na Igreja Ortodoxa Russa o casamento é permitido aos padres — e constituiu família. Mas, quando seus filhos morreram, ele se enclausurou em um mosteiro, onde mais tarde se tornou o abade.

No século 18, abades recém-nomeados costumavam ir a Moscou para conhecer e se curvar ao monarca; foi então que Nikon conheceu e causou boa impressão no tsar Aleixo. O monarca nomeou Nikon para um cargo elevado em um dos mosteiros de Moscou e o aceitou no círculo dos “fanáticos da piedade”.

Nikon estabeleceu relações próximas com o tsar e, quando o então patriarca José morreu em 1652, Aleixo da Rússia convidou Nikon para assumir o cargo mais alto da Igreja Ortodoxa Russa.

Tendo recebido a promessa do soberano de não interferir nos assuntos da Igreja, Nikon concordou e começou a realizar a maior reforma eclesiástica da história russa. Uma das maiores preocupações da Nikon eram os livros sagrados. Enquanto monge, ele trabalhou em várias igrejas por toda a Rússia, e em todos os lugares os textos eram traduzidos e interpretados de maneiras diferentes. O objetivo da Nikon era unificá-los. Ele tomou por modelo os textos gregos de Bizâncio, pois foi de lá que a Rússia adotou a Ortodoxia.

A missa e sua simbologia também sofreram alterações. Uma das mais notáveis e controversas foi a introdução do sinal da cruz de três dedos, em vez dos dois anteriores. Além disso, as prosternações até o chão foram substituídas por reverências até a cintura.

Muitos clérigos da alta hierarquia foram contra, mas Nikon continuou a colocar as suas reformas em prática, contando com o apoio do tsar. Quem resistia era taxado de cismático e, mais tarde, “velho crente”.

Outra grande assembleia do clero – o Grande Sínodo de Moscou de 1666-1667, do qual até o patriarca Paisius, de Constantinopla, participou – decretou que os cismáticos eram rebeldes e deviam ser punidos.

Muitos “velhos crentes” foram exilados para a Sibéria, alguns fugiram da Rússia e hoje até vivem no Brasil.

A perseguição aos “velhos crentes” foi impiedosa: os padres que pregavam contra Nikon corriam o risco de ter suas línguas cortadas. O líder dos “velhos crentes” Avvakum também foi preso e queimado vivo em uma casa de madeira. Isso levou a uma onda de autoimolações entre os “velhos crentes” em protesto (leia mais sobre isso aqui).

Como resultado de intrigas e conspirações palacianas, Nikon perdeu a confiança e o favoritismo do tsar. O Conselho da Igreja o despojou de sua posição patriarcal e o enviou para o exílio no remoto Mosteiro Ferapontov.

Após a morte do Aleixo, o já velho e doente Nikon foi libertado e autorizado a retornar ao seu Mosteiro de Nova Jerusalém, perto de Moscou. Mas o ex-patriarca acabou morrendo no caminho.

3. Tikhon (viveu de 1865 a 1925; foi patriarca de 1917 a 1925)

Os amigos da Academia Teológica de São Petersburgo chamaram, brincando, Vassíli Bellavin de “patriarca”, não sugerindo seriamente que ele poderia se tornar um. Afinal, no final do século 19, quando ele estudou no seminário e se formou em teologia, o patriarcado na Rússia não existia há quase dois séculos.

A posição de patriarca e toda a instituição de patriarcado foram abolidos pelo primeiro imperador russo Pedro 1º, o Grande, no início do século 18, quando o Santo Sínodo começou a governar a Igreja Ortodoxa Russa. Seu chefe era um funcionário secular, essencialmente um ministro.

O destino de Tikhon é digno de uma adaptação de Hollywood. Ele se tornou monge em 1891, foi professor de seminário e subiu rapidamente na hierarquia da Igreja. Em 1898, ele foi nomeado bispo do Alasca, fez um trabalho missionário excepcional e se tornou arcebispo norte-americano. Tikhon desenvolveu ativamente a Igreja Ortodoxa nos Estados Unidos, transferiu a cátedra ortodoxa de São Francisco para Nova York e abriu muitas novas igrejas, seminários e mosteiros. Ele retornou à Rússia apenas em 1907, quando já era um clérigo respeitado e até acompanhou a família imperial durante a celebração do 300º aniversário da Casa de Romanov.

Depois que a Revolução de Fevereiro de 1917 derrubou a monarquia, parecia que a Ortodoxia teria a chance de passar por uma reforma. O Conselho Local de 1917 da Igreja Ortodoxa restaurou o Patriarcado como instituição e elegeu Tikhon o primeiro Patriarca de Moscou e da Rússia, após quase 200 anos.

Tikhon deveria liderar todos os russos ortodoxos. Mas a época não era favorável à Igreja e, em novembro daquele ano, a Revolução Bolchevique inaugurou um governo comunista ferozmente contrário à instituição religiosa.

O patriarca Tikhon confrontou o poder: em 1918, ele condenou “os ímpios”, não mencionando diretamente o governo, mas escrevendo sobre “os poderes que prometeram estabelecer o direito e a verdade, mas mostram somente violência a todos, especialmente, à Santa Igreja Ortodoxa”.

Em 1922, Lênin ordenou o confisco de objetos de valor da Igreja por toda a Rússia, sob o pretexto de ajudar os famintos. Os atos violentos levaram a conflitos. Cerca de 2.000 padres e outras pessoas que buscavam proteger as igrejas foram fuzilados.

Pouco tempo depois, o governo soviético prendeu o patriarca, tanto por seus contatos na Igreja no Exterior quanto pela recusa em vender objetos religiosos. Tikhon condenou abertamente os bolcheviques, o derramamento de sangue e a Guerra Civil. Sob a influência ativa do NKVD (órgão que precedeu a KGB), começou uma divisão entre o clero. Alguns ficaram do lado de Tikhon, enquanto outros exigiram sua destituição. O patriarca foi temporariamente detido em 1923. Dois anos depois Tikhon adoeceu e faleceu. Sua morte, em 25 de abril de 1925, deu origem a suspeitas de envenenamento. Ele foi canonizado em 1981 pela Igreja Ortodoxa Russa no Exterior, e depois pela Igreja Ortodoxa Russa, em 1989.

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