A família Morozov é conhecida como uma das mais ricas do Império Russo. Savva Timofêevitch Morozov, que administrou o negócio têxtil da família entre o final do século 19 e o início do século 20, também foi um grande filantropo. Foi com seu dinheiro que foi construído, por exemplo, o prédio do Teatro de Arte de Moscou. Mas o comerciante não investia só em arte, como também na revolução.
Cientista, reformador e filantropo
Morozov recebeu uma excelente educação e estudou química em Cambridge, onde defendeu também seu doutorado. Mas as circunstâncias familiares o obrigaram a voltar à terra natal: a saúde de seu pai piorava rapidamente. Savva foi forçado a entrar de cabeça nos negócios da família e esquecer a carreira de cientista.
Morozov ingressou nos negócios do pai de uma forma completamente nova e iniciou reformas na indústria têxtil. Como parte disso, ele importou, na época, as mais modernas tecnologias do exterior, construiu fábricas modernas, confortáveis alojamentos de tijolos para os trabalhadores e os incentivava a estudar.
Os melhores alunos dos cursos eram enviados para praticar na Inglaterra e na Alemanha. Assim, os lucros da manufatura Nikôlskaia, que pertencia a Morozov, se tornaram maiores que os de seus concorrentes.
Os interesses de Morozov não se limitavam a suas atividades econômicas, e ele doava grandes somas para instituições de caridade. Foi ele, inclusive, quem fundou e construiu o Teatro de Arte de Moscou. Morozov doou 10 mil para abrir o teatro, uma quantia enorme para aquela época.
Desde a juventude, Morozov amava apaixonadamente o teatro, apoiava várias instituições teatrais em Moscou e São Petersburgo e até criou um teatro para seus trabalhadores. Além disso, Morozov gostava da ideia dos fundadores do Teatro de Arte de Moscou sobre uma acessibilidade geral do teatro e a produção de peças que refletissem a realidade da vida moderna.
Ajuda financeira ao Partido
Morozov logo começou a investir em outro negócio: ele se tornou o principal patrocinador dos revolucionários. Isso aconteceu depois que ele conheceu a atriz Maria Andreeva.
De acordo com as memórias de seus contemporâneos, Andreeva era muito bonita e talentosa, e poucas pessoas imaginavam que, desde o início de 1897, Andreeva era fascinada pelas ideias revolucionárias. Na época da primeira estreia no Teatro de Arte de Moscou, ela já era uma marxista inveterada.
Na época em que Morozov conheceu Andreeva, o relacionamento com sua esposa estava completamente abalado. Assim, iniciou-se um caso entre ele e a atriz.
Embora Andreeva sempre enfatizasse que apenas uma forte amizade a ligava a Morozov, um amigo do comerciante, Dmítri Olsufiev, escreveu em suas memórias: “Sabíamos em Moscou que em toda essa paixão [pelo Teatro de Arte] havia uma influência feminina de um dos membros da trupe.”
O diretor teatral russo Konstantin Stanislávski, em uma carta pessoal a Andreeva, a repreendeu por abusar da confiança de Morozov: “As relações de Savva Timofêevitch com você são excepcionais. Esses são os relacionamentos que destroém uma vida, você sabe disso, e deve tratar deles com cuidado e respeito".
Por meio de Andreeva, Morozov conheceu outros marxistas, aos quais começou a fornecer enorme ajuda financeira a pedido dela. O comerciante pagava a fiança de revolucionários presos, comprava roupas e comida para os exilados na Sibéria etc.
Segundo as memórias do escritor soviético Maksim Górki, futuro marido de Andreeva, Morozov também doava 24 mil rublos por ano ao jornal bolchevique Iskra. Serguêi Witte, presidente do Conselho de Ministros, afirmou em suas memórias que, no total, Morozov doou aos revolucionários milhões de rublos.
O industrial esteve sob a influência de Andreeva até sua morte, em 1905, quando a atriz já morava com Maksim Górki havia dois anos.
Morte misteriosa
A paixão de Morozov pelos bolcheviques acabou quando eles, apesar de seu enorme apoio financeiro à revolução, entraram em greve em sua fábrica em Orekhovo-Zuevo. Savva Morozov ficou chocado com isso.
Em 1905, rumores sobre a loucura de Morozov se espalharam por Moscou. Olsufiev escreveu que, após a greve, ele encontrou o amigo completamente deprimido e confuso.
Em abril do mesmo ano, por insistência de sua esposa e de sua mãe, foi convocado um conselho de médicos que chegou à conclusão de que Savva tinha “um grave colapso nervoso geral, expresso em excitação excessiva, ansiedade, insônia ou estado deprimido, crises de melancolia etc.”.
No entanto, diversos historiadores afirmam que é pouco provável que ele estivesse gravemente doente. Segundo eles, Morozov, tentava, com a ajuda da suposta doença, se livrar dos bolcheviques, que continuavam a extorqui-lo e ameaçá-lo.
Górki escreveu a um aliado do partido: “Estou preocupado com o ‘padre’ [como os bolcheviques chamavam Morozov]. Em nossos tempos destrutivos, é tão fácil quebrar o crânio de um homem". Poucos dias após a consulta médica, o industrial e sua esposa viajaram para o exterior — oficialmente, em busca de tratamento médico.
Há um evento muito importante na misteriosa história da morte de Morozov. Em 1904, ele fez um seguro de vida de 100 mil rublos (uma quantia muito significativa para os bolcheviques) e em nome de Maria Andreeva.
A viagem de Morozov ao exterior durou menos de um mês. Segundo a versão oficial, ele se suicidou, em 13 de maio, em um quarto de hotel em Cannes. Segundo depoimentos de parentes, naquele dia ele estava de ótimo humor, convidou a esposa para uma viagem a Monte Carlo no dia seguinte, pediu morangos com creme para o jantar e, aparentemente, nem pensava em morte.
Por volta das quatro da tarde, a esposa de Morozov ouviu um tiro e, correndo para o quarto, segundo depoimento, viu um homem fugindo pela janela. Tudo o que restou foi uma nota, em que se lia: "Peço que não culpe ninguém pela minha morte", sem data, nem assinatura.
A investigação reconheceu a morte de Savva como suicídio. Parentes e amigos discordavam e afirmavam que Savva havia sido morto pelos comunistas.
Maria Andreeva recebeu o seguro de 100 mil rublos — e deu parte deles, 60 mil, ao partido bolchevique. Nem ela, nem Górki participaram do funeral de Savva Morozov.
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