Como dois homens transformaram o jiu-jitsu japonês em uma arte marcial soviética única e letal

História
NIKOLAI CHEVTCHENKO
Desenvolvido nos primeiros anos da União Soviética, o sambo se tornou um estilo de luta livre reconhecido internacionalmente.

Antes do chamado sambo se tornar um esporte popular, esse estilo de luta livre era muito bem guardado e usado apenas para melhorar as habilidades de combate corpo a corpo da polícia e dos militares na União Soviética.

Misturando as técnicas mais eficazes de outras artes marciais, o sambo é um acrônimo que significa “autodefesa sem armas” (do russo, samozaschita bez orujia).

A modalidade de arte marcial foi desenvolvida na URSS por dois homens que seguiam rumos independentes, chamados Vassíli Oschepkov e Viktor Spiridonov. Eventualmente, os dois estilos semelhantes, porém concorrentes, se fundiram para criar a única arte marcial soviética conhecida hoje como sambo.

Órfão aos onze anos, Oshchepkov acabou indo parar no Japão, depois que a ilha Sacalina do Sul foi transferida para o Japão, como resultado da Guerra Russo-Japonesa. Foi então que a missão ortodoxa russa no Japão ajudou o jovem a conseguir uma vaga em um seminário clerical em Kyoto, onde, entre outras coisas, ele estudou a arte marcial do judô.

O jovem russo se destacou nos esportes de luta e foi endossado por seu treinador para o vestibular do Instituto de Judô Kodokan, em Tóquio, fundado pelo atleta japonês Jigoro Kano.

Em 15 de junho de 1913, Oschepkov passou nas provas e, enfim, recebeu sua faixa preta. Muito mais tarde, em 1917, ele se tornou o primeiro russo e o terceiro europeu a receber um segundo dan (faixa preta de segundo grau) no judô.

Ao retornar para a Rússia em 1913, Oschepkov começou a trabalhar na contraespionagem. Paralelamente à sua ocupação principal, o atleta fundou a primeira escola de judô da Rússia e treinou a polícia russa de Vladivostok.

Em 1929, Oschepkov foi transferido para Moscou para trabalhar como instrutor na Universidade Estatal Russa de Educação Física, Esporte, Juventude e Turismo, fundada em 1918. Ali, aprofundou-se em várias artes marciais e incorporou diferentes elementos ao jiu-jitsu japonês a fim de criar uma arte marcial mais adequada para o combate de guerra.

Nessa mesma época, outro homem estava trabalhando na criação de uma arte marcial soviética única também baseada no jiu-jitsu japonês: Viktor Spiridonov, veterano ferido da Primeira Guerra Mundial, estava retornando aos treinos à medida se recuperava dos ferimentos, depois ter abandonado o esporte em meio à guerra.

Em 1923, Spiridonov lançou um curso de “ataque e defesa” dentro da sociedade esportiva e de bem-estar Dínamo em Moscou. Com 14 alunos no início, o número de participantes saltou significativamente como resultado das palestras e apresentações públicas de Spiridonov.

O veterano de guerra lançou três livros sobre a evolução da arte marcial. Muitas vezes, os títulos apresentavam a frase “autodefesa sem armas” – seguindo a tradição soviética de criar siglas, Spiridonov cunhou o novo termo ‘sambo’.

No entanto, ele não registrou os direitos exclusivos para o novo acrônimo e, logo, os atletas começaram a se referir ao sistema de competição de Oschepkov como sambo.

Acredita-se, no entanto, que as duas versões de sambo diferiam. O sistema de Spiridonov pretendia ensinar os alunos a infligir dano máximo ao inimigo para incapacitá-lo de imediato. A formação militar de Spiridonov explicaria a aparente crueldade do método.

Com o tempo, o sambo foi oficialmente dividido em uma versão de combate e outra esportiva. A versão de combate misturava técnicas de artes marciais e incorporava luta livre com habilidades de soco. Assim, desenvolveu-se em algo semelhante às lutas marciais mistas. A versão esportiva se concentrava principalmente nas técnicas de luta livre.

A popularidade do sambo cresceu exponencialmente e a arte marcial soviética se espalhou mundo afora. Em 1968, um órgão regulador internacional para os esportes de luta livre amadora, chamado FILA, reconheceu o sambo como um estilo distinto. 

No entanto, devido a questões políticas, o órgão regulador do esporte mudou para a Federação Internacional de Sambo Amador (FIAS).

Embora o sambo ainda não tenha sido incluído em nenhum jogo olímpico até agora, o Comitê Olímpico Internacional emitiu uma nota de reconhecimento à FIAS em 20 de julho de 2021. Com isso, abre-se a possibilidade de a arte marcial soviética ser apresentada como um esporte olímpico oficial pela primeira vez nas Olimpíadas de 2028 em Los Angeles.

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