Fim de uma era: Moscou se despede dos trólebus soviéticos (FOTOS)

História
NIKOLAI CHEVTCHENKO
Este foi o último ano desse meio de transporte que ajuda os moscovitas a se movimentarem pela cidade desde 1933.

A necessidade de novos transportes para a capital russa surgiu na década de 1930, quando a população de Moscou cresceu consideravelmente. O principal meio de transporte na época ainda era o bonde: mais de 90% dos moradores o usava todo dia.

Um dos aliados mais próximos de Stálin, Lazar Kaganovitch ficou responsável pelo plano geral para reconstruir Moscou e trabalhou intensamente para lançar a primeira linha de metrô e aumentar o número de ônibus na cidade. O trólebus, como meio de transporte, não foi prioridade para o ideólogo do novo plano da capital.

No entanto, Nikita Khruschov – que mais tarde se tornou líder da URSS, mas não era tão influente quanto Lazar Kaganovitch na década de 1930 – gostava da ideia de criar rotas de trólebus em Moscou. Para garantir o futuro desse meio de transporte, Khruschov propôs nomear o primeiro trólebus em homenagem a Lazar Kaganovitch. Assim, surgiu o modelo inicial de trólebus para Moscou, denominado “LK”.

A primeira rota de trólebus da capital soviética foi inaugurada em 15 de novembro de 1933, na área da avenida Leningradski.

No final de 1934, já havia 50 trólebus em operação em Moscou. Outras cidades soviéticas também adotaram o transporte, dentre elas Kiev, Rostov-no-Don, Tbilisi e Leningrado (atual São Petersburgo).

No entanto, a história do trólebus em Leningrado foi marcada por um trágico incidente. Em 26 de dezembro de 1937, um LK-5 caiu no rio Fontanka. A tragédia matou todos os 11 passageiros a bordo. Em meio ao expurgo de Stálin, o chefe do serviço de trólebus da cidade, o engenheiro-chefe de estacionamento e outras pessoas relacionadas com o acidente foram presos e mais tarde executados. Todos os trólebus da família LK foram retirados de serviço em Leningrado.

A primeira versão dos trólebus LK estava longe de ser perfeita: algumas de suas partes mais importantes eram feitas de madeira. O material não era confiável o suficiente para proteger cabos, outras peças e até passageiros dessas partes, muitas vezes causando impacto negativo para a imagem do transporte.

Os primeiros modelos também não tinham sistema de aquecimento nem para-brisa, o que dificultava a operação nas condições severas do inverno russo.

Mesmo assim, o novo transporte foi se tornando popular entre os russos, que o consideraram uma nova atração e quase um entretenimento.

Em 1936 foi lançado um modelo novo e mais avançado de trólebus soviético, nomeado “YATB-1” por sua fábrica estar localizada em Iaroslavl.

Durante uma viagem de negócios ao Reino Unido em 1935, um dos engenheiros-chefe da fábrica soviética havia comprado dois modelos de trólebus britânico, que se tornaram o protótipo do YATB-1 soviético.

Ainda que o corpo do veículo também fosse feito de madeira e coberto apenas com uma camada fina de aço, ele era melhor que seu antecessor: tinha sistema de aquecimento e assentos acolchoados. O principal problema deste modelo era que o equipamento elétrico não ficava suficientemente protegido contra umidade e poeira.

Um novo modelo denominado MTB-82 chegou às ruas em 1946. Produzido na Fábrica nº 82 do Comissariado do Povo da URSS e projetado por um engenheiro de aviação chamado Naum Tcherniakov, o MTB-82 era o modelo de trólebus mais comum na União Soviética na década de 1950.

Antes de o modelo seguinte fosse lançado, os engenheiros soviéticos fizeram uma tentativa fracassada de substituir o MTB-82 pelo trólebus TBU-1. Mas somente um protótipo e um lote experimental de 10 ônibus foram construídos. Os engenheiros encontraram erros graves no projeto, e a produção acabou sendo interrompida.

Ainda assim, o experimento fracassado permitiu que os engenheiros criassem um modelo muito melhor de trólebus chamado ZiU-5.

O novo modelo, montado em quatro versões diferentes, foi lançado em 1959. A modificação mais espaçosa podia acomodar até 120 passageiros. Também era muito mais rápido do que todos os seus antecessores.

Em 1972, foi a vez do ZiU-9 surgir no mercado e virar sensação internacional: a URSS exportou esse modelo para Hungria, Grécia, Alemanha, Bulgária... e até Argentina. O novo bonde era muito espaçoso e tinha uma terceira porta no centro. Um total de 42 mil trólebus desse modelo foram fabricados na URSS e, posteriormente, na Rússia, de 1972 a 2013 – o que fez do ZiU-9 o modelo mais produzido no mundo.

Aos poucos, os trólebus começaram a ser substituídos por ônibus elétricos em Moscou. A maioria das antigas linhas áreas de trólebus foram desmontadas em 2019. Na noite de 24 para 25 de agosto deste ano, o último trólebus da capital russa fez sua última viagem e foi estacionado permanentemente.

No entanto, uma rota de trólebus permaneceu intacta para a reforma: em 4 de setembro de 2020, uma linha que vai da estação de metrô Komsomólskaia à Praça Ielokhóvskaia foi inaugurada como uma homenagem ao meio de transporte que circulou pela cidade e transportou tantos moscovitas por décadas.

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