Como uma menina de três anos passou 12 dias sozinha na taiga e sobreviveu

Estilo de vida
EKATERINA SINELSCHIKOVA
Os familiares perceberam que Karina Chikitova havia desaparecido apenas três dias depois. E a história de seu resgate chocou os socorristas — ninguém imaginava que uma criança pudesse sobreviver por tanto tempo em condições tão adversas.

Olom é uma pequena aldeia na Iakútia, a região mais fria e extensa da Rússia. Nesse vilarejo vivem algumas poucas famílias compostas apenas de pessoas idosas. Olom é cercado pela taiga e pântanos; a cidade mais próxima fica a 70 km. Também não há conexão telefônica nem estrada direta para essa aldeia.

Em julho de 2014, Karina Chikitova, de três anos e oito meses, e sua mãe de 21 anos chegaram à aldeia para visitar parentes. Em 29 de julho, a menina acordou, tomou café da manhã com panquecas, foi brincar fora da casa com um cachorrinho chamado Kirachaan (“bebê”, na língua iacuta) e sumiu.

O primeiro dia

A mãe da menina estava trabalhando no palheiro, e a avó tinha que cuidar da criança. Mas ela pegou no sono após o café da manhã e, ao acordar, não encontrou a menina — e supôs que ela estivesse com a mãe.

À noite, as duas se reuniram, não viram Karina e pensaram que ela estava com o pai: o homem morava com outra família ao lado e tinha informado a mãe que pretendia levar a filha com ele por dois ou três dias.

No entanto, três dias depois, o pai de Karina apareceu em Olom sozinho. “Não levei a minha filha comigo”, disse, acrescentando que no dia do desaparecimento havia sido chamado com urgência para o trabalho.

Foi apenas naquele momento que os locais perceberam que o cachorrinho também desaparecera.

Tudo congelava

A operação de busca começou no terceiro dia após o desaparecimento. A polícia abriu uma investigação criminal por suspeita de assassinato. Cerca de cem equipes de resgate e mais voluntários saíram nas buscas. Cachorros e drones patrulhavam 30 quilômetros quadrados de área selvagem.

“Todos os dias a nossa esperança diminuía, especialmente após encontrar um urso na área de busca”, disse um dos participantes da equipe.

À noite, mesmo no verão, a temperatura na área cai para 1 ou 2 graus negativos. “É um frio surreal à noite: acordei tremendo todo, apesar de estar em um saco de dormir quente”, disse o socorrista.

Os membros da equipe perderam a esperança de encontrar a criança viva. Em pouco tempo, encontraram as botas e a jaqueta da menina afogadas no pântano. Isso significava que Karina estaria apenas de meia e camiseta.

No entanto, no 9º dia após o desaparecimento, o cachorrinho de Karina apareceu inesperadamente na aldeia. Faminto, sujo e assustado, recusou-se a deixar o vilarejo e levar os socorristas para o lugar de onde veio. Os cachorros de busca, porém, sentiram o rastro, e, três dias depois, ajudaram a localizar o paradeiro de Karina.

Cama de bagas

“Ela estava sentada em uma moita em silêncio. Eu nem a vi. Foi ela que me viu primeira e estendeu as mãos. Eu a peguei, ela era tão pequena, leve como uma pena. Pernas, mãos e rosto estavam todos com marcas ensanguentadas de picadas de insetos. Ela estava morrendo de medo, sem sapatos, imediatamente pediu água, disse que queria comer e começou a chorar”, relatou o voluntário Artiom Borissov, que encontrou a menina.

Karina foi encontrada a seis quilômetros da aldeia, no 12º dia após o desaparecimento. Havia se perdido na floresta enquanto brincava com o cachorro. “Era fisicamente impossível que ela sobrevivesse por quase duas semanas em condições tão extremas, disseram os socorristas. Durante esses 12 dias, a criança perdeu um terço de seu peso; ela comia bagas, bebia água de um riacho e à noite se aquecia aconchegando-se ao cachorrinho.

“Fiquei chocada com o fato de como sabia se preparar para a noite: ela escolhia um lugar correto, cortava a grama para sua cama. Ela também sobreviveu graças ao cachorro. Era importante que, em uma situação como essa, houvesse uma alma viva por perto, disse a jornalista Viktória Gábicheva, que escreveu um livro sobre os acontecimentos trágicos.

Karina passou mais de 20 dias no hospital. Durante esse período, recebeu alimentação especial e não conseguia sair da cama: as suas pernas estavam inflamadas devido às picadas de insetos.

A história mudou radicalmente a vida da menina. Após o incidente, ela se tornou alvo de muita atenção. Um ano depois, um monumento a Karina e seu cachorrinho foi erguido no aeroporto da cidade de Iakutsk.

Mais tarde, foi estudar na Faculdade de Coreografia de Iakutsk. Hoje, continua estudando balé e sonha em dançar no balé O Lago dos Cisnes.

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