O que fazer com o Mausoléu de Lênin: manter, derrubar ou transformar em museu?

Arquivo; Agência Moskva
Arquitetos já discutiram a possibilidade de transformar templo comunista em um museu. Mas a questão do corpo de Lênin sempre foi tema de debates calorosos entre os russos.

O primeiro mausoléu de madeira foi erguido na Praça Vermelha em 1924, logo após a morte de Vladímir Lênin. Foi somente em 1930 que surgiu o atual, construído em pedra. O corpo de Lênin foi embalsamado e permanece ali desde então; mas para isso requer procedimentos constantes que mantêm o corpo em “boas” condições. 

Mausoléu temporário de madeira em 1924

De acordo com pesquisas diversas, de 40% a 80% dos russos não estão felizes com o fato de o cadáver ainda estar em exibição na Praça Vermelha. Muitas pessoas sugerem enterrar Lênin próximo às muralhas do Kremlin, onde outros oficiais e generais soviéticos honorários descansam em paz, incluindo Stálin.

Stálin foi vizinho de Lênin no mausoléu por algum tempo. Foto de 1957

Concurso de arquitetura para reaproveitamento do mausoléu

Em setembro de 2020, o Sindicato dos Arquitetos da Rússia anunciou um concurso para encontrar a melhor maneira de reutilizar o mausoléu.

Os porta-vozes do Sindicato garantiram que o concurso visava apenas à criação de um “banco de ideias” sem qualquer motivação política. Mas a iniciativa causou uma tempestade em termos de reação pública: de comentários negativos e até ameaças ao presidente do Sindicato a infinitos memes nas redes sociais.

Entre as piadas mais populares, estava a de abrir um nostálgico “riumotchnaia” (bar de vodca”) em estilo soviético no mausoléu. Esse tipo de estabelecimento era comum funcionar em Moscou, mas agora restam muito poucos. Também sugeriram transformar o mausoléu em um supermercado, ou em loja de alimentos e bebidas alcoólicas, algo que o centro de Moscou, de fato, carece.

O famoso crítico de cinema e blogueiro Anton Dolin acha que o mausoléu deveria ficar como está – com o corpo de Lênin –, mas é preciso transformá-lo em uma espécie de museu. Isto é, sem a presença de guarda honorário, apenas um segurança e uma bábuchka-guarda de museu, além de uma loja de suvenires na saída.

Já o comediante russo Denis Nikolin, sugeriu a construção de uma ‘Leninlândia’ em Moscou. Segundo Nikolin, isso atrairia milhões de turistas, já que a Rússia ainda está muito associada à União Soviética.

“Não sugerimos tirar o corpo de Lênin nem reconstruir o mausoléu, nós apenas sugerimos achar uma solução para fazer mais uso dessa grande peça da arquitetura soviética”, afirma Nikolai Chumakov, presidente do Sindicato dos Arquitetos.

Um dos projetos do mausoléu, 1924

A coordenadora do concurso, Irina Korobina, acha que, mais cedo ou mais tarde, o futuro do corpo de Lênin será decidido e deve haver um plano pronto para a reutilização do mausoléu, para que esse processo não se prolongue por anos a fio.

Apesar de todas as explicações dos arquitetos sobre os motivos para realizar o concurso, três dias após o seu anúncio, o Sindicato teve de cancelá-lo. No entanto, não é a primeira vez que tais ideias são discutidas abertamente.

O que fazer com o corpo de Lênin

Antes da perestroika, ninguém era corajoso o suficiente para debater o passado comunista e considerar o enterro do corpo de Lênin. As discussões sobre o mausoléu começaram apenas às vésperas do colapso da URSS. Em 1989, o deputado Iúri Kariakin sugeriu que o corpo fosse enterrado e lembrou ao público que a vontade pessoal de Lênin era que fosse sepultado ao lado do túmulo de sua mãe.

Após o discurso de Kariakin, o país começou a discutir abertamente que manter a múmia em exibição contradizia as práticas do Cristianismo e da Ortodoxia – e o enterro de Lênin se tornou um dos temas mais calorosos na década de 1990, quando as novas autoridades não comunistas queriam se livrar de todas as relíquias soviéticas o mais rápido possível. Mas os tempos turbulentos fizeram as autoridades se concentrarem em questões mais relevantes e urgentes. No final de sua presidência, Boris Iéltsin expressou a vontade de resolver a questão envolvendo o corpo de Lênin, mas ele deixou seu cargo e o assunto permaneceu em aberto.

Cartaz com os seguintes dizeres: “Ilitch, estamos contigo!” [Ilitch era o nome do meio de Lênin]. 1991

Em 2017, a candidata às eleições presidenciais Ksênia Sobtchak disse que o enterro de Lênin era um dos pontos de sua agenda e sugeriu organizar um referendo para que os russos pudessem decidir o que fazer com o mausoléu.

Três anos depois, o excêntrico político Vladímir Jirinóvski sugeriu vender a “múmia” de Lênin, presumindo que algum país comunista a compraria de bom grado.

O que fazer com o mausoléu

O ex-patriarca da Igreja Ortodoxa Russa Aleksêi 2º defendeu a ideia de escolher um lugar fora da Praça Vermelha e construir uma necrópole para todos os revolucionários e líderes soviéticos.

Em 2019, outro excêntrico deputado, Vitáli Milonov, sugeriu a demolição do mausoléu, porque ele impede as pessoas de patinarem na anual Feira de Natal de inverno, que acontece bem em frente ao monumento.

A presidente do Conselho da Federação (Senado), Valentina Matveienko, acredita que a questão só deva ser levantada quando o povo russo estiver pronto e também sugeriu fazer um museu com o túmulo de Lênin, nos moldes do ‘Les Invalides’ em Paris.

Mausoléu em construção

Vladimir Putin expressou diversas vezes a opinião de que Lênin “não deve ser tocado”. O atual presidente acha que, para muitas pessoas, ele simboliza as conquistas anteriores do país. Para os comunistas, é uma certa relíquia, e Putin compara o significado que o mausoléu tem para os comunistas com os restos mortais dos santos para os cristãos. Por esse motivo, ele sugeriu focar no futuro e desenvolver o país no presente, em vez de discutir o destino do corpo de Lênin.

O último ponto, porém não menos importante, é que o mausoléu é um patrimônio da UNESCO. Desse modo, não é possível realizar qualquer mudança crucial no edifício, já que a organização o avalia como um grande monumento da arquitetura soviética.

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