Corpo de líder soviético permanece em mausoléu na Praça Vermelha há quase um século
Oleg Lastochkin/RIA NovostiEnquanto está vivo, o fundador do Estado Soviético, Vladimir Lênin, jamais expressou qualquer vontade de ter o corpo preservado após a morte. Sua viúva, Nadejda Krúpskaia, chegou, inclusive, a escrever uma carta ao Politburo do Partido Comunista para que o luto por Lênin não fosse transformado em culto à personalidade. “Era um fardo que ele carregava enquanto estava vivo”, escreveu.
Vários líderes bolcheviques também se opuseram à idéia de conservar o corpo. Mas nada disso fez diferença: Stálin, que gradualmente apertava seu domínio sobre o país, estava convicto de que Lênin deveria ser preservado como um santo socialista.
Retrato de Vladimir Lênin em 1922, dois anos antes de sua morte
Zuma Press/Keystone Pictures USA/Global Look PressHavia duas maneiras possíveis de conservar o cadáver, que lentamente entrava em decomposição: congelar ou embalsamar o corpo. Embora o governo tivesse optado pela primeira, um bioquímico chamado Boris Zbarski convenceu a liderança de que o embalsamamento era melhor, pois evitaria que a pele de Lênin mudasse de cor.
Passo a passo
Com a ajuda do anatomista Vladimir Vorobiov, Zbarski começou suas operações com o corpo de Lênin em março de 1924. Fizeram cerca de 20 incisões, mais furos no crânio (o cérebro e os olhos já haviam sido removidos, juntamente com a maioria dos outros órgãos internos), e mergulharam o corpo em uma banheira com formaldeído por algumas semanas para matar germes e bactérias – e impedir a putrefação. Na sequência, o corpo passou por outro banho – desta vez, para melhorar o tom da pele e mascarar os traços cadavéricos, afinal, a morte do líder já completava dois meses.
Os cientistas usaram, por último, uma solução de glicerol para suavizar a pele do cadáver, que seria colocado em uma pose definida. Ninguém na Rússia tinha feito algo parecido antes; Zbarski e Vorobyov estavam trabalhando no escuro e arriscando tudo – especialmente, a fúria de Stálin – caso falhassem. Mas eles conseguiram.
Vida póstuma
A dupla de cientistas teve seus quinze minutos de fama após o governo reconhecer o sucesso da experiência. “Foi um desafio único e incomum – embalsamar todo o corpo deixando as formas e a estrutura celular intactas”, escreveu o cirurgião russo-soviético Iúri Lopukhin em seu livro sobre o embalsamamento de Lênin.
Famoso mausoléu foi construído na década de 1920 para receber o corpo de Lênin
Chromorange/Bilderbox/Global Look PressDesde então, o corpo do ex-líder passou por algumas aventuras, incluindo uma evacuação para a cidade de Tiumen (2.100 km a leste de Moscou) durante a Segunda Guerra Mundial e várias tentativas de destruição.
De tempos em tempos, quando o Mausoléu na Praça Vermelha está fechado, cientistas de um laboratório especial o colocam em conservante e injetam soluções especiais. A composição química exata, porém, continua sendo segredo de Estado.
Mundo afora
Dispostos a ajudar os camaradas socialistas no mundo todo, a URSS assistiu na preservação do corpo do líder vietnamita Ho Chi Minh em 1969. Assim como Lênin, Ho não queria ser embalsamado, mas ninguém se importou com isso. Uma equipe de especialistas de Moscou chegou ao país asiático, realizou o trabalho e, depois que o Vietnã do Norte venceu a guerra, Ho foi instalado em um mausoléu em Hanói.
Líder vietnamita Ho Chi Minh também tem corpo conservado por métodos soviéticos
Getty ImagesO mesmo aconteceu com o norte-coreano Kim Il-sung (morto em 1994) e Kim Jong-il (2011). Embora a URSS tenha caído em 1991, cientistas russos ajudaram os coreanos.
Atualmente, Lênin, Ho Chi Minh, e os dois Kims são os únicos quatro líderes do mundo embalsamados usando a tecnologia soviético-russa; o búlgaro Gueórgui Dimitrov, o tchecoslovaco Klement Gottwald, e o angolano Agostinho Neto foram todos enterrados depois que os socialistas perderam o poder em seus países.
Já Mao Tsé-Tung, o famoso líder comunista da China morto em 1976, não teve a chance de ser embalsamado adequadamente, já que Moscou e Pequim não mantinham boas relações na década de 1970. Os chineses empregaram seu próprio método de preservar o corpo, que era “muito mais primitivo”, segundo Aleksêi Iurtchak, autor de “Corpos de Lênin: A Ciência Oculta da Soberania Comunista”.
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