Cena do filme "Doutor Jivago".
David Lean/Metro-Goldwyn-Mayer (MGM), Carlo Ponti Production, Sostar S.A., 1965Cena de "Tiro de Pistola", uma das histórias de "Contos de Belkin".
Naum Trakhtenberg/Mosfilm, 1966Púchkin, que ficou famoso principalmente como poeta, escreveu várias obras em prosa que viraram verdadeiros clássicos russos. A crítica literária soviética adorava e elogiava “Contos de Belkin”, uma obra em estilo realista baseada em notas de um narrador que as teria perdido – e Púchkin escrevia tê-las simplesmente encontrado.
Mas os contemporâneos de Púchkin não deram o devido valor ao livro na época de seu lançamento. Embora os críticos notassem sua escrita “fluida”, repreendiam uma suposta “falta de ideias” da obra.
Os contos da obra foram chamados de “anedotas” e eram bastante extensos. "Os ‘Contos de Belkin’ são fáceis de ler, porque não fazem pensar" - escreveu o jornal de São Petersburgo "Sévernaia ptchelá" (do russo, “Abelha do Norte”). "As farsas são apertadas por um espartilho de simplicidade sem nenhuma piedade", lia-se à época na revista "Moskovski telegraf" (Telégrafo moscovita).
Vissarion Belínski, o principal crítico literário do século 19, escreveu que “Contos de Belkin” foi recebido com frieza pelo público e pelas revistas. Em um ciclo de artigos sobre Púchkin, ele elogiou seus talentos, mas observou: “Embora não possamos dizer que ele não fosse dotado de talento, estes contos não eram dignos nem do talento nem do nome de Púchkin. Um deles em especial é de dar dó: ‘A sinhazinha camponesa’, improvável, ao estilo vaudeville, representando a vida do proprietário de terras de um ponto de vista idílico...”
Alguns pesquisadores acreditam que todos os contos eram uma paródia das anedotas de costumes, mas com um desfecho inesperado. Infelizmente, porém, os contemporâneos puchkinianos não captaram seu senso de humor.
Mais tarde, na década de 1860, os críticos revisaram sua posição sobre esses contos e seu narrador, Belkin, e o elogiaram como um exemplo da alma russa, mansa e humilde.
Dostoiévski, por sua vez, escreveu que as coisas verdadeiramente belas da literatura russa são “todas tiradas do povo, a começar pelo tipo humilde e simplório de Belkin”.
Cena de "O Inspetor Geral".
Vladimir Petrov/Mosfilm, 1952Gógol apresentou a leitura desta comédia pela primeira vez em 1836 na casa do poeta Vassíli Jukóvski, onde todo o mundo literário se reunia. Muitos riram, e até Púchkin “rolou de rir” (que foi quem deu a ideia do enredo ao autor).
Mas houve quem imediatamente condenasse a peça como "um insulto à arte da farsa". Teve quem chamasse a comédia de grosseira e sem graça. E também quem repreendesse Gógol pela implausibilidade - supostamente, um cidadão urbano não podia confundir o inspetor com um simples aventureiro.
"Não tinha razão para calúnias na Rússia", escreveu o crítico conservador Faddei Bulgárin, que também acusou Gógol de uma escassez de personagens positivas.
Coincidentemente, a comédia sobre funcionários provinciais corruptos obteve autorização de publicação e encenação no teatro pelo tsar Nicolau 1°, que não via na peça uma metáfora da Rússia. Na estreia, porém, ele riu e disse: "Que peça! Todos a entenderam, e eu mais ainda que qualquer um."
O sucesso no teatro foi colossal, mas Gógol considerava a peça um fracasso - parecia-lhe que os atores não tinham entendido o conceito e tinham atuado mal. Desconsolado, ele chegou a viajar para o exterior por um tempo.
Belínski lê "Gente Pobre". Ilustração soviética de 1948.
TASSEsta foi uma das primeiras obras psicológicas da literatura russa e tratava de um pequeno e modesto funcionário. O crítico Belínski admirou o manuscrito e apelidou o autor de "novo Gógol".
Antes mesmo da publicação da obra impressa, Belínski falou aos quatro ventos em São Petersburgo sobre o novo escritor que havia descoberto. Isso teve um efeito duplo sobre sua recepção.
Por um lado, seu elogio serviu para Dostoiévski de porta de entrada ao mundo literário. Por outro, muitos críticos ficaram receosos e até céticos em relação à obra. Alguns chegaram até a acusar Dostoiévski de ter sido demasiadamente influenciado por Belínski.
De certa forma, era verdade: sob a influência de Belínski, o jovem autor foi participar do revolucionário Círculo de Petrachévski. Mais tarde, ele leu ali a carta proibida de Belínski para Gógol, na qual ele criticava a Rússia. Por causa disso, Dostoiévski quase acabou executado – sua pena capital foi comutada no último segundo pelo tsar.
"Gente Pobre" foi criticado pela falta de forma e conteúdo pouco claro: "Ele tentou construir um poema, um drama, e não saiu nada, apesar de todas as pretensões de criar algo profundo", escreveu o jornal "Abelha do Norte". Muitos criticaram a extensão da obra e o excesso de detalhes tediosos. E, mais tarde, o próprio Belínski admitiu que o romance era muito prolixo.
O crítico Apollon Grigoriev disse que havia um falso sentimentalismo no autor e que ele não "venerava" realmente tantas personagens das baixas camadas da sociedade.
Houve quem acusasse Dostoiévski de imitar Gógol em seus “Contos de Petersburgo”. Aliás, Gógol leu o romance de Dostoiévski e elogiou o talento do escritor, mas observou que o autor ainda era jovem e concordou que ele era prolixo: "Teria ficado muito mais vivo e forte se tudo fosse mais conciso."
Cena de "Doutor Jivago".
David Lean/Metro-Goldwyn-Mayer (MGM), Carlo Ponti Production, Sostar S.A., 1965Atualmente, este romance sobre a Guerra Civil é considerado uma das melhores obras da literatura russa do século 20. Pasternak recebeu o Prêmio Nobel de Literatura por ele. Entretanto, na URSS, ele não só foi proibido até a Perestroika, como também levou a uma verdadeira perseguição do autor.
O conselho editorial da revista Nôvi Mir, que publicava novos livros, disse em uma carta aberta que o livro retratava de forma caluniosa a Revolução de Outubro e as pessoas que "fizeram essa Revolução e a construção do socialismo na União Soviética".
O Prêmio Nobel foi considerado um ataque político. Na opinião dos editores "verdadeiramente soviéticos", o prêmio estava ligado "à propaganda antissoviética em torno do romance" e não refletia, de forma alguma, "as qualidades literárias da obra de Pasternak".
Cena de "Lolita".
A.A. Productions Ltd., Anya, Harris-Kubrick Productions, Transworld Pictures, 1961Nos puritanos Estados Unidos, quatro editoras se recusaram a publicar este "romance erótico" – apesar de elogiarem a obra. Muitas temiam as consequências desagradáveis a sua reputação e até mesmo possíveis processos.
O diretor da primeira editora que se atreveu a publicar o romance, na França, elogiou especialmente o modo como o autor "conseguiu transferir a tradição literária russa para a prosa inglesa moderna".
O livro tinha todas as chances de passar despercebido, mas ocorreu tal escândalo em torno dele na imprensa britânica, que virou um verdadeiro best-seller. Nas páginas do “The Times”, o escritor Graham Greene recomendou "Lolita" como um dos melhores livros de 1955 — mas o editor do “Sunday Express”, John Gordon, contrariou o jornal concorrente, dizendo se tratar do "livro mais sujo" e de "pornografia pura".
O romance, que trata da relação entre um homem adulto com uma menina menor de idade, foi proibido por muito tempo em diversos países. Publicar um livro em que a pedofilia era retratada de forma tão romantizada era considerado prejudicial e até perigoso.
O livro também foi proibido na França após sua primeira publicação, mas a editora recuperou posteriormente o direito de publicá-lo nos tribunais.
Na URSS, é claro, o livro também foi proibido oficialmente. No entanto, ele foi distribuído em “samizdat” (cópias caseiras), e alusões a "Lolita" surgiram em obras dos famosos poetas Andrêi Voznessenski e Evguêni Ievtuchenko.
Na URSS, porém, não foi só o teor pedófilo que levou à proibição do romance, como também a própria figura de seu autor. A imprensa soviética repreendeu Nabôkov pelo "texto cheio de esnobismo e destinado a burgueses curiosos".
Em 1970, o jornal “Literaturnaia Gazeta” (Gazeta Literária) publicou um artigo que definia "Lolita" como um “produto de um emigrante que traiu e vendeu sua terra natal”. O jornal recebeu muitas cartas furiosas de pessoas que tinham lido o tal "romance do emigrante do Exército Branco Nabôkov" e pediam que ele fosse incluído na lista internacional de pessoas buscadas pela justiça.
Em 1989, "Lolita" foi finalmente publicado por uma editora na URSS, causando um verdadeiro furor.
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