5 escritores russos superestimados, de Lev Tolstói a Joseph Brodsky

Sputnik, Public Domain
Talvez você tenha se cansado do moralismo de Tolstói, dos intermináveis discursos dos protagonistas de Dostoiévski ou do imaginário selvagem de Bulgákov. Nós ainda amamos estes autores, mas acreditamos que eles tenham sido superestimados... Descubra por quê!

1. Lev Tolstói (1828-1910)

Nem todos os russos gostam de Lev Tolstói, frequentemente classificado como “o maior escritor russo”. Na escola, a maioria dos russos era forçada a ler a enorme edição em quatro volumes de “Guerra e Paz”.

O próprio Tolstói não gostava deste romance. Ele confessou estar feliz por "não ter que escrever esse tipo de tolice de novo" e, quando era louvado pelo romance, dizia: "É o mesmo que se alguém dissesse a Edison que ele é ótimo em dançar a mazurca".

“Guerra e Paz” é tão cheio de frases desconexas que você esquece o começo quando chega ao final. Muito além disto: para todos os russo, as notas de rodapé com o francês traduzido eram excruciantes. Ah, e tem também todo o quarto volume dedicado a moralismo, pregação e teorias históricas infantis.

A maior parte do moralismo de Tolstói está em contradição com a vida que ele teve. Apostador incontrolável na juventude, ele foi o maior mulherengo durante a vida toda (apesar de se odiar ele mesmo por isso).

A maior parte de seus filhos ficou irada com ele, que os privou de sua fortuna, e seu relacionamento com a mulher, Sofia, foi cheio de brigas, lágrimas e outras mulheres.

Então, fala sério, ele realmente seria o cara certo para ensinar ética aos leitores? Enquanto isso, cada romance e conto de Tolstói tem final moralista.

  1. Fiódor Dostoiévski (1821-1881)

Durante sua vida, Fiódor Dostoiévski foi considerado um escritor de segunda classe, autor de histórias policiais (como "Crime e Castigo") e de prosa sentimental ("Os Irmãos Karamázov").

Isto ocorreu por uma boa razão: Dostoiévski usou a maior parte do dinheiro que recebeu de direitos autorais correndo contra o relogio para pagar as dívidas que contraiu no jogo. E é por isso que a maior parte de seu trabalho foi escrita com muita pressa e pouca atenção, para dizer o mínimo.

“Uma mesa oval de forma redonda em frente ao sofá”: isto é ele descrevendo um móvel no primeiro capítulo de “Crime e Castigo” (linha editada em todas suas traduções). O editor russo do romance, Mikhaíl Katkóv, chamou a atenção do autor para o erro. Mas Dostoiévski pensou um pouco e disse: “Só deixe como está”.

E os tradutores do século 19 de Dostoiévski, por exemplo, cortavam, tachando de excessivo, um “O Grande Inquisidor”, um poema em prosa que ligava a visão do autor sobre filosofia cristã e a vida em geral.

Isto além dos intermináveis ​​discursos do Príncipe Míchkin em “O Idiota”. Não surpreende nada saber que eles são tão longos porque os romances de Dostoiévski eram publicados em revistas literárias - que pagaram o autor por linha, portanto, quanto mais fosse escrita, mais ele recebia.

Bem, de qualquer maneira, não foi ele quem escreveu a maioria desses discursos à mão doi sua mulhere e secretária, Anna Dostoiévski, quem o fez. Isto não impediu que Fiódor, o jogador, vendesse seus anéis de casamento e o vestido de noiva dela para pagar uma dívida de jogo contraída na Europa.

  1. Mikhaíl Bulgákov (1894-1940)

Durante sua vida, Mikhaíl Bulgákov não esteve entre os melhores escritores russos. Ele inicialmente estudou medicina e trabalhou como médico. Coincidentemente, seu trabalho literário começou logo depois de ele desenvolver um carinho especial, digamos assim, pela morfina, durante a Guerra Civil Russa (1918-1921).

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A maioria de suas obras eram contos curtos e peças de teatro, e sua fama se iniciou quando sua peça "Os dias dos Turbin", encenada pela primeira vez em 1926, caiu nas graças de Stálin.

Durante os anos 1930, porém, Bulgákov esteva em perigo. O escritor tentou lisonjear o tirano escrevendo uma peça dedicada à juventude de Stálin, mas o “vójd” não gostou e ordenou que a montagem fosse cancelada. Depois disso, a saúde de Bulgákov piorou rapidamente, levando a sua morte prematura em 1940.

Ainda durante a década de 1930, Bulgákov trabalhou em segredo no romance "O Mestre e Margarida", ao mesmo tempo em que abusava do uso da morfina - manchas da droga foram encontradas até no manuscrito do romance, décadas mais tarde.

Este romance ganhou fama apenas alguns anos após sua morte e ofuscou os outros trabalhos do escritor - a maioria dos leitores do mundo não se lembra de seu “Zapiski iunogo vratcha” (em tradução livre “Notas de um jovem médico”, publicado em inglês como “A Young Doctor’s Notebook” e em espanhol como “Diario de un joven médico”),  que relata o início de sua vida como médico drogado de aldeia.

Já “O Mestre e Margarida”, apesar de todos o louvor em torno de si ao longo dos anos, é um romance com um enredo frouxo, que se apoia fortemente em imagens “místicas” desgastadas, aparentemente inspiradas pelo estado delirante do escritor. As imagens do romance se baseiam fortemente na literatura expressionista alemã, mais notadamente nos romances de Gustav Meyrink, um dos escritores favoritos de Bulgákov.

  1. Serguêi Dovlátov (1941-1990)

Um dos muitos escritores russos e soviéticos que não foram publicados na URSS por causa da grande ironia de sua obra - o que apontou para o absurdo da realidade soviética -, Serguêi Dovlátov se tornou mais famoso quando emigrou para os Estados Unidos.

Graças aos esforços de seus amigos e de empreendedores literários no exterior, sua fama cresceu rapidamente e, no final dos anos 2000, ele se tornou um dos escritores mais “famosos” dos anos 1970 – algo que não se podia dizer dele nos próprios anos 1970, quando ainda estava vivo.

Em primeiro lugar, Dovlátov não escreveu ficção. Seus contos, ou melhor, seus esboços, eram trechos modificados de sua própria vida cotidiana, temperados com um humor amargo e tristes recordações do passado e do presente de um perdedor.

No reino da língua russa do século 20, houve explorações muito maiores nesse campo, começando por Mikhaíl Zoschenko, autor de cenas de humor que eram extraordinariamente populares entre os russos por seu humor mordaz e composição elegante.

Em russo, a prosa de Dovlátov é interessante sobretudo pelo vernáculo contemporâneo que ele recriou, perdido ou muito menos intrigante em tradução. Em russo, no entanto, sua prosa se torna obsoleta porque a realidade que ele descreveu não é mais relevante.

Assim, é melhor deixar Dovlátov àqueles que só amam seu estilo - mas ele dificilmente poderia ser visto como um escritor que define a literatura russa.

  1. Joseph Brodsky (1940 - 1996)

Premiado com o Nobel de Literatura e considerado como o poeta que definiu o desenvolvimento da língua russa no final do século 20, Joseph Brodsky recebeu de elogios excessivos até mesmo em seus dias.

Ele foi indicado como poeta laureado de um país que fala inglês – e não a língua materna de Brodsky, russo. No final das contas, ele simplesmente não fazer as pazes com o inglês. De qualquer forma, as autotraduções de suas obras para o inglês, assim como de sua prosa e seus poemas escritos já em inglês, são russos em sua sintaxe desajeitada.

Distanciando-se da problemática lírica em seus poemas, em seus anos finais o poeta “norte-americano” Joseph Brodsky (ele gostava de se identificar como tal, e até mudou a grafia de seu nome original, Iôssif) transformou seus poemas em uma teia enrolada de intertextos e alusões obscuras (vide “Vertumne” ou “Centauro I-IV”), que dificilmente poderiam ser decifrados ​​por um leitor menos proficiente em literatura mundial que o próprio Brodsky - e isto significa basicamente quase todos os leitores!

A poesia não é uma conferência sobre a história da literatura, e foi justamente isto que Brodsky pensou e propagou. Isto nos levou a adorar seus poemas iniciais, sinceros e de coração, mais que a persona lírica cansada do mundo de seus últimos anos.

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