Em junho de 2021, cientistas russos descobriram um rotífero que datava de, pelo menos, 24.000 anos atrás. Além disso, eles conseguiram revivê-lo e ele até começou a se reproduzir. O experimento para reviver vermes microscópicos, porém multicelulares, de uma amostra de permafrost siberiano foi realmente realizado em 2015, mas descrito na renomada revista Current Biology apenas agora. Durante esse tempo, os cientistas estudaram o genoma dos rotíferos e tentaram estabelecer se os vermes sobreviveriam ao congelamento.
“Até agora, esta é a evidência mais confiável de que organismos vivos multicelulares podem viver por dezenas de milhares de anos em um estado em que seu metabolismo para quase por completo”, explicou o pesquisador do Instituto de Ciência do Solo, Stanislav Maliavin, um dos autores do estudo.
Os rotíferos são muito tenazes, capazes de se “dessecar” em condições extremas: quando há falta de água em uma seca (ou quando a água se transforma em gelo), eles rapidamente removem toda a água remanescente de suas células e começam a produzir substâncias com as quais entram em uma forma de animação suspensa. No entanto, ninguém jamais imaginou que eles seriam capazes de fazer isso por um período de tempo tão longo.
O estudo mostrou que os rotíferos “ressuscitados” lidaram bem com o congelamento, enquanto muitas espécies modernas não são capazes de tal, pois suas células acabam sendo destruídas com a formação de cristais de gelo. Aparentemente, os antigos rotíferos tinham um mecanismo biológico de proteção, que os cientistas buscam em seu genoma.
Mas engana-se quem acredita que este não é o único organismo multicelular a “ganhar nova vida” depois de milhares de anos repousando no permafrost.
Nematoides de 42.000 anos
O recorde de longevidade dos rotíferos foi quebrado por nematoides antigos (lombrigas), que ganharam destaque em 2018. Na época, o mesmo Instituto de Ciência do Solo, que pertence à Academia Russa de Ciências, relatou a descoberta de nematóides com 42.000 anos.
O mais curioso é que eles foram encontrados por acaso. Cientistas colocaram amostras de solos congelados em placas de Petri com meio de nutrição a fim de estudar comunidades de organismos unicelulares congelados. Mas, junto com eles, os nematoides multicelulares também ganharam vida. “Só vimos os vermes quando eles começaram a se mover. Foi cerca de duas semanas depois que eles descongelaram”, disse a pesquisadora Anastassia Chatilovitch.
Nematode from soil, head part
LiudmilaLim (CC BY 4.0)Atualmente, algumas dessas lombrigas estão congeladas, outras permanecem desidratadas e há ainda aquelas que estão vivas e se reproduzindo. Porém, assim como com os rotíferos, ainda não está claro o que exatamente lhes permitiu sobreviver a uma criopreservação tão longa. Levando em conta as reações bioquímicas bem conhecidas em organismos multicelulares, isso não deveria ter acontecido sob circunstância alguma.
Filhotes pré-históricos
Também foram encontrados no permafrost da Iakútia três múmias de filhotes pré-históricos. Dois foram descobertos em 2011 e 2015 nas margens do rio Salakh. Eram filhotes de três meses da mesma ninhada que haviam permanecido no solo congelado por 12.500 anos. Os filhotes foram provavelmente mortos em um deslizamento de terra, mas ambos estavam muito bem preservados. Um deles até tinha o cérebro praticamente intacto.
O terceiro filhote mumificado foi encontrado em 2018 sob o solo por moradores locais no distrito de Abiski, a 360 km ao norte da primeira descoberta. Um estudo mostrou que o ser tinha menos de dois meses, ainda possuía dentes de leite e passou cerca de 18.000 anos no permafrost. Não tinha apenas a pelagem e os bigodes intactos, mas também os cílios e o nariz aveludado. No entanto, ainda não está claro de qual espécie se tratava o animal pré-histórico - um lobo, um cachorro ou um cachorro-lobo. As amostras do genoma do filhote foram enviadas ao Centro Sueco de Paleogenética (CPG), que possui o maior banco de DNA canino da Europa, mas não acharam nenhuma correspondência genética para o filhote da Iakútia. Os cientistas acreditam que possa ser um dos mais antigos animais domesticados.
Cavalo extinto
Outro achado único foi a única carcaça do mundo de um cavalo de Lena extinto, que passou 42.000 anos no permafrost. Foi encontrado na cratera Batagaika, também conhecida como ‘Portões do Inferno’.
De acordo com Semion Grigoriev, diretor do Museu do Mamute, este cavalo é a descoberta da Idade do Gelo mais bem preservada do mundo. A carcaça não apresentava danos visíveis.
Um exame forense mostrou que, na época de sua morte, o cavalo tinha cerca de duas semanas: havia caído na cratera e se afogado na lama, como evidenciado pelos restos de lodo em seus órgãos internos. A lama congelou rapidamente, o que impediu que o os órgãos internos do cavalo entrassem em estado de putrefação: mesmo depois de 40.000 anos, seus tecidos moles permaneceram avermelhados e os cientistas conseguiram extrair amostras de sangue líquido dos vasos de seu coração, tornando-o “o mais antigo sangue no mundo”. Junto com cientistas em Seul, eles tentaram extrair células viáveis do sangue, que poderiam ser usadas para decodificar o genoma e até clonar as espécies extintas, mas até agora seus experimentos não obtiveram o sucesso esperado.
Filhotes de leão-da-caverna
Naquela mesma época, enormes leões-das-cavernas, também conhecidos como Panthera leo spelaea, caminhavam pelo território da Sibéria moderna. Eles tinham dois metros de comprimento e pesavam cerca de 260 quilos. Pistas sobre sua aparência puderam ser extraídas de quatro filhotes de leão, cujos corpos foram encontrados em 2015, 2017 e 2018. O mais antigo deles havia passado 47.000 anos no permafrost.
A descoberta confirmou a teoria de que os leões-das-cavernas tinham pelagem manchada. Até então, a teoria prevalecente era que o artista pré-histórico que pintou leões nas paredes da caverna Chauvet, na França, havia aplicado certa licença artística. No entanto, duas das múmias de filhotes de leão encontradas na Iakútia realmente têm pelos grossos e malhados.
Inúmeros mamutes
Cerca de 70% dos ossos de mamutes e outros vestígios de mamutes existentes no mundo estão localizados no território de Iakútia. É por isso que eles são os mais encontrados na região. O primeiro mamute foi descoberto ainda em 1799. O mamute de Lena (também conhecido como mamute Adams) foi o primeiro esqueleto completo de mamute que os cientistas conseguiram encontrar - mas levou algum tempo para a notícia vir à tona. Primeiramente, o povo local, os evenki, esperou por quatro anos pelo descongelamento do permafrost no qual a carcaça do mamute estava alojada; em seguida, retirou as presas e as vendeu a um comerciante local. Por meio disso, os relatos da descoberta chegaram a Mikhail Adams, um zoologista associado da Academia Imperial de Ciências, que levou ao museu Kunstkamera, em São Petersburgo, tudo o que havia restado do mamute: o esqueleto com grandes pedaços de pele, duas pernas e um olho.
No entanto, o mamute mumificado mais bem preservado é o de uma jovem fêmea que viveu há cerca de 28.000 anos. Iuka, como ficou conhecida, foi descoberta em 2011 na costa sul do mar de Laptev. Tinha 165 cm de altura e mais de dois metros de comprimento, considerando da base do tronco à cauda. Os núcleos de suas células musculares estavam tão bem preservados que os pesquisadores os transferiram para oócitos vivos de camundongos, e cinco deles apresentaram “sinais de atividade biológica”: reações que geralmente ocorrem antes da clivagem. Mas a clivagem em si nunca ocorreu.
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