A história ganhou um novo capítulo na noite de Halloween do ano 2000, quando o foguete russo Soyuz decolou do cosmódromo de Baikonur, no Cazaquistão. A bordo da espaçonave estavam o astronauta norte-americano William Shepherd e dois cosmonautas russos – Iúri Gidzenko e Serguêi Krikalev. Em dois dias, o trio atracou na Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês), tornando-se os primeiros humanos a viver temporariamente em órbita próxima à Terra.
Nas duas décadas que se seguiram, a ISS abrigou 241 homens e mulheres de 19 países. Alguns tiveram a honra de chamar o lugar de casa por quase um ano inteiro.
Espaço insuficiente
Em termos de número de membros da ISS, a Rússia perde apenas para os Estados Unidos – mas com uma diferença três vezes menor. No total 151 astronautas americanos já viveram a bordo da estação espacial; a Rússia enviou apenas 49.
Por incrível que pareça, a diferença se deve à capacidade de assentos das naves espaciais. O ônibus espacial norte-americano, que colocava cargas e humanos em órbita, tinha mais espaço do que o Soyuz russo: os norte-americanos podiam transportar oito pessoas de uma vez, enquanto os russos só conseguiam enviar três. Mesmo após a catástrofe envolvendo o Columbia (uma das cinco revisões do ônibus espacial), em 1º de fevereiro de 2003, quando ficou claro que o destino do Programa de Ônibus Espacial dos EUA estava selado, os americanos ainda mantiveram um lançamento em 2004: o Grupo de Astronautas 19 da Nasa foi o último com 11 membros a voar a bordo do ônibus espacial. Eventualmente, todos eles, exceto Shannon Walker, visitaram a ISS como parte da missão do ônibus espacial.
Além disso, eram os ônibus espaciais americanos que mais entregavam carga à ISS, o que exigia uma tripulação humana todas as vezes. É exatamente por isso que a esmagadora maioria dos americanos que já estiveram no espaço nunca permaneceu muito tempo. Ao observar o número de expedições de longo prazo, os EUA têm apenas 61 de um total de 151 em seu currículo, enquanto a Rússia pode se gabar de 43 das 49 viagens – tudo porque os russos usam o foguete não tripulado Progress para entregar sua carga – que segue voando piloto automático.
Quem é permitido a bordo da ISS?
Quem são esses 49 cosmonautas? A seleção é realizada pela agência espacial russa Roscosmos e pelo Centro de Treinamento de Cosmonautas Iúri Gagárin. A decisão é tomada com base nos resultados de um concurso público. Esse formato é usado desde 2012, o que abre as portas para viagens espaciais não apenas para pilotos militares e profissionais da indústria espacial (que era o caso até recentemente), mas também para uma variedade de cientistas. Um biólogo agora pode se tornar capitão de missão.
Em termos gerais, não há idade mínima, mas o candidato deve possuir diploma universitário e pelo menos três anos de experiência em sua área – o que significa que o candidato geralmente já está na casa dos 20. O limite máximo é de 35 anos.
Homens e mulheres podem se tornar cosmonautas, mas até agora, apenas uma russa esteve a bordo da ISS. O nome dela é Elena Serova.
Durante o recrutamento, o candidato deve passar com sucesso em uma entrevista e depois uma série de testes, seguido por ao menos seis anos de preparação.
“Por exemplo, um cosmonauta precisa ser capaz de pular de paraquedas de um avião e resolver uma tarefa antes que o paraquedas abra. Tem também o teste de resistência a estresse”, conta o cosmonauta Serguêi Riazanski, que viajou para a ISS duas vezes.
“Em um dos testes, você fica trancado em um quarto minúsculo sem dormir por três dias e é obrigado a fazer algo constantemente – escrever, falar, se concentrar totalmente em uma tarefa. Se você for forçado a realizar um pouso de emergência, precisará ser capaz de reagir rapidamente, porque um segundo perdido em tal situação equivale a um desvio de 80 a 200 quilômetros de seu destino na Terra”, acrescenta.
Após o processo seletivo, o candidato felizardo aguarda para ser designado para uma tripulação, que se tornará sua “família” no espaço. No entanto, pode ser que isso jamais aconteça. Uma parte substancial dos selecionados nunca irá viajar ao espaço. Depois que o Columbia se partiu na atmosfera, matando sua tripulação de sete astronautas, a Nasa decidiu, em 2005, comprar as vagas para cientistas a bordo da espaçonave russa Soyuz. A ideia era não investir em um programa novo de ônibus espacial, mas esperar pelo primeiro voo espacial com financiamento privado – o Crew Dragon, que fez história em 2020. Antes disso, o Soyuz era a única maneira de levar os astronautas para a ISS. Atualmente, existem 31 cosmonautas russos ativos (em espera). Destes, 19 nunca foram ao espaço.
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