As superstições dos cosmonautas russos

Ciência e Tecnologia
ALEKSANDRA GÚZEVA
É surpreendente como áreas de alta tecnologia, como a dos voos espaciais, incorporaram rituais, presságios e superstições. Muitos deles remontam aos tempos de Iúri Gagárin, primeiro homem a ir ao espaço.

Pessoas sérias que dominaram a ausência de gravidade nunca admitirão que suas "tradições" são, na verdade, superstições. Mas que são, são. Veja só as coisas que todos eles devem fazer para espantar qualquer azar:

1. Plantar árvores

Se o lançamento do foguete eacontecer em uma época quente do ano, os cosmonautas plantam uma árvore antes dele. No pátio do hotel “Kosmonavt”, em Baikonur, já existe uma avenida inteira de árvores plantadas por equipes russas e estrangeiras.

Em uma entrevista, Valentina Tereshkova, a primeira mulher a ir ao espaço, disse que a árvore plantada por Iúri Gagarin tinha cuidados especiais.

O herói da Rússia e cosmonauta Aleksandr Misurkin, que voltou de órbita há apenas um ano, disse a Russia Beyond que, para ele, é sempre um prazer plantar uma árvore ou regar uma que ele já tenha plantado antes.

2. Visitar o museu de Baikonur

"Depois da segunda prova do traje espacial, os cosmonautas sempre vêm ao nosso museu. Isto acontece quatro ou cinco dias antes do lançamento", explica Antonina Bogdanova, diretora do Museu Baikonur, em entrevista à agência de notícias russa TASS.

A tradição se iniciou em 1983 e, desde então, os cosmonautas vão ali ver o ônibus espacial soviético Buran e entrar na casa onde Iúri Gagárin passava a noite antes de seus voos e as instalações que o engenheiro de espaçonaves Serguêi Korolióv usava como escritório.

3. Assistir ao filme ‘O Sol Branco do Deserto’

"Antes do lançamento, gostamos muito de assistir ao ‘O Sol Branco do Deserto’", afirma Misurkin.

Acredita-se que os tripulantes da Soiuz-12, Vassíli Lazarev e Oleg Makarov, foram os primeiros a assistir ao filme antes de serem lançados ao espaço, em 1973. Após o pouso bem-sucedido, brincaram que havia um terceiro tripulante no espaço: o Camarada Sukhov (o protagonista do filme), que os animava em momentos difíceis. Desde então, acredita-se que o filme traga boa sorte.

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O herói da Rússia e cosmonauta Fiódor Iurtchikhin, que esteve em missões espaciais cinco vezes, disse ao Russia Beyond sobre o sentido prático de assistir ao filme: "por meio deste filme os cosmonautas aprenderam sobre o trabalho do cameraman. No passado não havia câmeras como hoje. Havia câmeras de cinema e com filmes, mas era impossível revelá-los e verificar a qualidade das filmagens no voo. Era preciso fazer tudo direto sob uma boa luz, em bom enquadramento e com o foco certo... Como editar, alternar close- ups com planos abertos e como filmar um rosto foi algo que os cosmonautas aprenderam por meio do filme também".

Os experientes cosmonautas brincavam com os recém-chegados dizendo que, a menos que tivessem visto “O Sol Branco do Deserto” dez vezes, não estavam prontos para ir ao espaço.

Iurtchikhin relembra outra história - os cosmonautas tinham que fazer um teste para demonstrar quanto sabiam do filme, respondendo a perguntas sobre detalhes específicos e reproduzindo citações exatas do filme.

4. Ouvir a música ‘Travá u dôma’ (Grama na casa)

É costume ver a tripulação em sua espaçonave sob a trilha sonora de “Travá u dôma”. Em 2009, a agência espacial russa Roscosmos chegou a designá-la como hino dos cosmonautas russos.

Ela trata de cosmonautas que olham para a distante Terra a partir de um porto de observação e sonham não com o espaço ou com o ruído do cosmódromo, mas com a grama verde do jardim de sua casa. Ela se tornou a música favorita de todos os cosmonautas.

"Existem diferentes versões da música, mas sempre pedi a que foi gravada por Igor Românov. Acho que a música se transformou quando a banda Zemliane começou a tocá-la", diz Iurtchikhin ao Russia Beyond.

5. Tomar joelhada do chefe

Sim, literalmente. Quando uma equipe em seus trajes espaciais sobe os degraus até o elevador do foguete, ela é acompanhada por três pessoas: o construtor geral, o chefe do grupo técnico e o chefe da Roscosmos. E espera-se que um dos chefes lhes dê uma joelhada leve, mas perceptível, para um bom lançamento.

6. Fazer xixi na roda do ônibus que leva os cosmonautas para o lançamento

Reza a lenda que este ritual peculiar remonta ao próprio Iúri Gagarin, que decidiu se aliviar antes do voo apenas por segurança, porque sabia que o escafandro o deixaria sem opção de urinar por algumas horas.

Os cosmonautas são pessoas de alta cultura e não comentam o costume conosco. Só em uma entrevista o cosmonauta Maksím Suraiev mencionou algumas "paradas rituais a caminho do lançamento".

7. Pintar o foguete de branco

Aleksander Misurkin brinca que a tradição mais importante é que a equipe de back-up pinte o foguete para a tripulação principal.

"Quando chegamos ao Baikonur pela primeira vez, chamamos a atenção para o fato de que, dois dias antes, quando o foguete foi movido para a plataforma de lançamento, era verde ou cinza. E ali, logo antes do lançamento, estava branco. Perguntaram-nos se sabíamos o por quê e nos disseram que era porque a equipe de back-up pintava o foguete para a tripulação principal."

Na verdade, diz Misurkin, há uma explicação científica mais engenhosa. O foguete é preenchido com oxidante e combustível super-resfriados, e assim uma fina crosta de gelo se forma do lado de fora. E é por isso que ele fica branco.

8. Levar um amigo a bordo

Fiódor Iurtchikhin disse ao Russia Beyond sobre sua tradição pessoal de levar um amigo a bordo – na verdade, um cachorro de brinquedo. "Não é nem um mascote, nem um amuleto", diz o cosmonauta. O cachorrinho servia como um indicador de ausência de peso - os cosmonautas amarravam-no com uma corda para ver se ainda estavam na ausência de gravidade.

"Levei este brinquedinho comigo em todos os meus cinco vôos, e nós até escalamos o Monte Elbrus juntos", diz Iurtchikhin.

9. Fazer refeições juntos na estação espacial

Durante os longos meses na Estação Espacial Internacional, os cosmonautas geralmente sentem falta de casa. Portanto, passar tempo juntos é muito importante, mesmo para uma equipe internacional. "

Eu não chamaria isso de tradição, mas uma vez, ou até mesmo duas vezes por semana, nós nos reunimos para jantar juntos e assistir a um filme", ​​diz Aleksandr Misurkin.

10. O cosmódromo de Baikonur não funciona em 24 de outubro

Isso não se aplica a voos espaciais tripulados, mas a data é considerada um dia de azar para o cosmódromo. Duas vezes, em anos diferentes, dezenas de pessoas morreram nesta data em acidentes no Baikonur: em 1960, um veículo de lançamento ICBM R-16 explodiu e, em 1963, um míssil R-9A pegou fogo. Por isto, o trabalho no cosmódromo é interrompido e nenhuma tentativa de lançamento é feita nesta data.