Eugenio Yacovleff, o russo que dedicou sua vida ao estudo da arte pré-colombiana no Peru

Museu Histórico e Etnográfico de Toda a Rússia
Arqueólogo russo fez parte do Movimento Branco, razão pela qual, após a Revolução de 1917, decidiu emigrar para a América Latina. Já em Lima, dedicou-se ao estudo da cultura nasca e tornou-se um renomado cientista.

O nome de Eugenio Yacovleff (nascido Evguêni Iakovlev, 1895-1934) é praticamente desconhecido na Rússia. Apenas um pequeno círculo de arqueólogos sabe quem ele é. No entanto, na capital peruana Lima, é considerado um grande cientista e existe uma praça em sua homenagem – que há pouco tempo foi convertida na Alameda Eugenio Yacovleff.

Eugenio nasceu na Rússia em 1896 na cidade de Torjok, na região de Tver. Os seus pais eram professores, mas, devido a suas atividades revolucionárias, acabaram sendo enviados para exílio em Arkhanguelsk e depois se mudaram para Torjok, onde viveram 30 anos.

Eugenio foi um dos seis filhos que o casal teve. Seus pais transmitiram a paixão pela pintura, música e leitura.

“Meu irmão mais velho, Jenia [Eugenio – nota do Russia Beyond], desenhava muito bem, e os menores observavam, e tentávamos desenhar o que podíamos também. Meu irmão tinha um caderno onde redesenhava diferentes animais do livro de Brehms [Brehms Tierleben, Vida de Animais de Brehm – nota do Russia Beyond]. Nós olhávamos esses desenhos com inveja e ele nos falava dos diferentes bichos”, relembrou a irmã de Eugenio, Nina.

Além disso, Nina destacou o interesse que o irmão demonstrava pela química:

“O quarto do meu irmão mais velho Eugenio era interessante. Ele gostava de química. Ele tinha um laboratório inteiro, prateleiras cheias de frascos, fazendo algum tipo de experimento. [...] Em uma das jarras havia um pequeno tubarão azul. Ocorreu a meu irmão pendurar um crânio de cabra com chifres, que ele havia encontrado na casa de campo, no canto da frente. Na parede havia uma coleção de borboletas e insetos que meu irmão havia apanhado.

Depois de estudar no Instituto Novotórjskoe, Eugene cursou uma das primeiras instituições de ensino superior de Moscou, a Academia Petrovsko-Razumóvskaia, hoje conhecida como Academia Agrícola de Moscou de K.A. Timiriázev. Naquela época, a universidade era famosa por seus professores, sobretudo ecologistas e cientistas do solo. Eugenio era entusiasta da botânica e da geologia – e tinha um futuro promissor. Mas assim que eclodiu a Primeira Guerra Mundial, ele foi recrutado pelo Exército. Não conseguiu terminar os estudos, embora não tenha participado de combates e apenas servido como reservista na retaguarda. Mais tarde, ingressou no Exército Voluntário (um dos primeiros exércitos do Movimento Branco) e, por isso, teve que emigrar para Constantinopla, depois aos EUA e de lá à América do Sul.

O navio de Yacovleff atracou no porto de Callao, em Lima, e aparentemente decidiu permanecer no Peru. Pouco depois de sua chegada, começou a colaborar com o Museu Nacional e a escrever regularmente para a Revista do Museu Nacional.

Ave marinha e peixe, desenhados em uma bola redonda com dois espinhos, por volta de 145/115 a.C. (1955, 2090)

Yacovleff usou seus conhecimentos de botânica e zoologia em seus estudos sobre a cerâmica peruana pré-colombiana. Seu primeiro artigo, O Andorinhão, sobre a arte decorativa de Nasca (1931) foi dedicado a imagens de Cypseloides (gênero de andorinhão). Estudos posteriores sobre falcões, condores e outras aves de rapina foram ainda mais ambiciosos. Ele realizou um estudo transcultural detalhado das imagens dessas aves, tanto naturalistas quanto míticas, em todas as sociedades pré-colombianas do Peru, incluindo Chavín, Nasca, Moche, Guari e Inca. “Ele foi capaz não somente de distinguir diferentes tipos de pássaros com base em suas representações em escultura e pintura, mas também de interpretar seu significado cultural, em parte usando descrições de crônicas”, explica o pesquisador e ornitólogo Evguêni Chergalin.

Desenhos de pássaros de várias obras de Yacovleff em diferentes anos (1932, 1934)

De acordo com Chergalin, sua identificação do olho do falcão nos vasos com cabeça de Nasca, por exemplo, o levou a argumentar que os guerreiros pintavam os seus rostos com sinais de falcão, que simbolizavam arrogância, força e impetuosidade.

Em sua terceira obra, A Jíquima (um tipo de tubérculo comestível extinto no Peru, 1933), Yacovleff identificou a cultura da raiz representada em diversas cerâmicas de Nasca – e sabe-se que era amplamente utilizada como alimento na época pré-colombiana. O pesquisador conseguiu identificar uma série de outras plantas por imagens nas cerâmicas.

Yacovleff também demonstrou a associação dessas espécies de plantas com as criaturas míticas de Nasca. Em todos os seus artigos, Yacovleff combinou seu conhecimento científico com fontes etnográficas e evidências contemporâneas. Isso ajudou a apresentar a imagem mais completa da iconografia representada na cerâmica de Nasca. 

A inscrição no verso da foto diz: Uma das múmias no baú de seu caixão, equipada com tudo o que é necessário para a vida após a morte. Nós nos parecemos um pouco. 1930

A Divindade Primitiva de Nasca (1932) é provavelmente a obra mais importante– e mais especulativa e discutível – de Yacovleff. Neste artigo, o autor alega que a criatura mítica mais importante representada nas pinturas de Nasca é a orca, ou Orcinus orca.

O artigo de Yacovleff também contém uma excelente descrição da arte cerâmica de Nasca, que estava notavelmente à frente de seu tempo. Além disso, era um artista muito habilidoso e pintou centenas de desenhos baseados na Coleção Nasca do Museu Nacional de Lima.

Yacovleff morreu prematuramente em 1934.

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