Tel’noye: O melhor peixe é carne
“O melhor peixe é carne”, diz uma antiga piada russa usada em tempos de escassez. O peixe sempre foi abundante nas mesas dos povos mais simples da Rússia: em uma terra de rios, era muitas vezes a fonte mais acessível de proteína, além de também ser permitido durante os períodos de jejum, que ocupavam uma boa metade de qualquer ano russo. Tel’noye era um tipo de prato preparado com peixe moído e feito de forma a parecer carne e porco. O nome original significa “algo parecido com um corpo”.
No século 17, “durante o jejum, porcos de tel’noye e patos de tel’noye” podiam permanecer sobre a mesa. Os próprios convidados estrangeiros à mesa do tsar diziam ser impossível distinguir esse prato de carneiro ou porco de verdade.
A receita? “Retire todas espinhas de um peixe, moa até ficar parecido com uma massa, acrescente cebola e açafrão. Depois, coloque a mistura em formas de madeira que lembrem cordeiros e gansos, e frite em óleo vegetal em panelas profundas. O sabor é inigualável, aqueles que não o conhecem acham que é um verdadeiro cordeiro”. Segundo Berngard Tanner, um viajante tcheco, “a arte dos cozinheiros transformou peixes em galos, galinhas, gansos, patos e etc., ao fazer com que eles se parecessem com outros animais. ”
Cisne frito
Ao contrário do tel’noye – a comida do povo – o cisne frito era uma iguaria restrita aos tsares e a mais alta nobreza. Hoje em dia, cisnes são aves raras e delicadas. Porém, na Rússia antes do século 18, eram tão abundantes que caçar e servir cisnes à mesa era uma obrigação para os nobres mais ricos e o tsar.
Os cisnes eram servidos como o primeiro prato de carne. Eles eram levados à mesa totalmente decorados, com os pescoços na posição vertical (sustentados por um fio de metal no interior do pescoço) e seus bicos cobertos com folhas de papel fino de ouro ou prata. Após a “apresentação”, os cisnes eram escavados e servidos com diferentes molhos. Para tornar a carne saborosa, as aves foram marinadas por dias em vinagre ou talvez creme de leite azedo – a receita exata se perdeu durante o século 18.
Botvinia (sopa fria de vegetais)
Uma triste notícia para aqueles que ainda acham que o borsch é um prato russo – os russos tinham sua própria sopa fria de vegetais, a botvinia.
Era um prato para todas as mesas, comum tanto nos casebres dos camponeses como em cortes principescas e nas grandes mansões de condes. Era servido em três tigelas. Na primeira vinha a própria sopa botvinia – folhas de vegetais, como beterraba, espinafre, urtiga e azedinha, eram fervidas em kvass caseiro e depois trituradas para formar uma espécie de purê. Deixava-se a sopa esfriar antes de servir. Na segunda tigela havia peixe, preferencialmente esturjão ou semelhantes. E a terceira tigela era preenchida com gelo picado, para adicionar ao prato gelado (que era muito popular no verão). A botvinia era servido com duas colheres (uma para a sopa, e outra para o gelo) e um garfo. Durante os tempos soviéticos, esse prato saiu de moda porque era difícil e caro de preparar. Atualmente, a okrochka tomou o seu lugar na cozinha russa.
Rubets (rúmen, primeiro compartimento do estômago dos ruminantes)
Rubets – um tipo de tripa – era o prato favorito dos camponeses russos. Todo outono, os camponeses que viviam nas fazendas da aristocracia rural eram obrigados a salgar e marinar a carne bovina para alimentar a família dos proprietários no inverno. Rúmen, por sua vez, não pode ser armazenado e, por isso, os camponeses eram autorizados a levá-lo, e assim eles inventaram maneiras de preparar esse subproduto. O resultado assemelha-se muito ao haggis escocês (exceto pelo fato de haggis é preparado com bucho de carneiro recheado com vísceras), ou ao bucho italiano (neste caso, porém, é composto por todos os compartimentos do estômago dos ruminantes).
Os rubets devem ficar de molho por várias horas (trocando a água de hora em hora) para se livrar do cheiro forte. Em seguida, devem ser fervidos com legumes por cerca de cinco horas, até que estejam macios o suficiente para serem perfurados com um garfo. Como muitos alimentos de camponeses, os rubets eram ricos em nutrientes, como proteínas, vitaminas e outros elementos que melhoram o sistema imunológico.
Rubets era uma comida de rua típica na Rússia tsarista, comercializada nas ruas por vendedoras vestidas com várias camadas de saias que se sentavam em latas cheias de comida para mantê-las aquecidas. Rubets era só um dos subprodutos da carne bovina – na época, quase qualquer parte do animal encontrava seu caminho para a mesa.
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