Por que os jovens cientistas soviéticos construíam seus próprios apartamentos?

História
ANNA SORÔKINA
Em 1968, um grupo de entusiastas decidiu construir um prédio residencial por conta própria para não esperar anos na fila por moradia. Por incrível que pareça, a ideia acabou sendo apoiada pelo governo.

Na União Soviética era quase impossível adquirir um apartamento. A maioria das novas moradias era distribuída pelo Estado por ordem de chegada. No entanto, nem todos que tinham dinheiro suficiente podiam entrar na fila; para isso, na maioria dos casos, era necessário ter filhos. Antes do nascimento dos filhos, os jovens moravam com os pais ou em dormitórios. Em média, esses cidadãos tinham que ficar entre 5 e 20 anos na fila por apartamentos.

Em 1968, jovens cientistas da cidade de Koroliov, perto de Moscou, decidiram construir um prédio de apartamentos por conta própria para não esperar tanto. Surpreendentemente, a ideia foi apoiada em nível estatal.

Cientistas no canteiro de obras

Na década de 1960, muitos cientistas se mudaram para a pequena cidade de Koroliov, localizada perto da capital soviética, onde se dedicavam ao desenvolvimento da cosmonáutica. Com o passar do tempo, os jovens passaram a enfrentar uma escassez de moradia.

Alguns funcionários de empreendimentos espaciais sugeriram não esperar a ação do governo local, que podia se prolongar por dezenas de anos, e resolveram construir por conta própria um complexo residencial para as jovens famílias locais com toda a infraestrutura para convivência coletiva: jardins de infância, clubes para discussão de livros ou trabalhos científicos, esportes etc. Os cientistas elaboraram o projeto de bairro científico e o apresentaram ao governo local. Depois de cinco anos estudando o projeto, as autoridades permitiram o início das obras, que duraram mais cinco anos.

Como foi construído o complexo residencial?

A Câmara dos Deputados destinou um terreno na cidade para a construção de três edifícios de 16 andares, com 900 apartamentos. Os entusiastas recorreram ao Instituto de Pesquisa e Tipologia de Design Experimental de Moscou para desenvolver a versão final do complexo residencial. Segundo o acordo, os arquitetos também receberiam apartamentos neste complexo.

A construção foi financiada pelo Ministério de Engenharia Geral da URSS, que coordenava o trabalho das empresas espaciais.

O ministério enviou construtores profissionais e os equipamentos necessários, porém estabeleceu uma condição: os futuros moradores também teriam que trabalhar no canteiro de obras. Engenheiros, cosmonautas e doutores em ciências foram dispensados do trabalho em seus institutos de pesquisa espacial por seis meses e receberam salários como construtores. Após o prazo, eles voltaram ao trabalho científico e foram substituidos por outros futuros moradores do complexo.

Quem recebeu os apartamentos?

A distribuição dos apartamentos foi realizada por comissões das empresas locais. Além daqueles que construíram os prédios, os funcionários mais valiosos também receberam imóveis. Os tamanhos desses apartamentos foram determinados de acordo com as normas soviéticas.

Desse modo, uma família com um filho poderia receber um apartamento de dois quartos e cozinha, com área total de cerca de 50 metros quadrados; uma família com dois ou três filhos, um apartamento de cerca de 75 metros quadrados; casais sem crianças, um imóvel de 35 metros quadrados. Quase todos os apartamentos foram distribuídos entre doutores em ciências.

No final, 900 famílias — mais de 3.000 pessoas — ganharam moradias. 

Além disso, o conselho coordenador garantiu que o Estado concederia um empréstimo de 1 mil rublos para cada apartamento para a compra de móveis. Como era extremamente difícil adquirir mobília na URSS, o fornecimento direto de móveis para os novos moradores também foi garantido pelo Estado.

A iniciativa impressionou tanto o governo soviético que este decidiu repetir a experiência de Koroliov. Até o desmantelamento da URSS, vários projetos semelhantes foram realizados em todo o país, nas cidades de Arkhanguelsk, Novosibirsk e muitas outras.

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