100 anos da morte de Lênin: para além das lendas e especulações

História
GUEÓRGUI MANÁEV
Este domingo (21) marca os 100 anos da morte do fundador da URSS. Os documentos sobre o tema ainda são parcialmente secretos e não foram publicados na íntegra, por isso não faltam teorias acerca do evento. Compilamos abaixo os fatos que não causam mais dúvidas entre os historiadores.

Lênin sentia fadiga crônica

Em julho de 1921, três anos antes da morte, Lênin escreveu ao escritor soviético Maksim Górki: “Estou tão cansado que não consigo fazer nada”. Ainda assim, Lênin participava de até 40 reuniões e comitês por dia e recebia dezenas de pessoas. “Das reuniões do Conselho dos Comissários do Povo”, lembrou sua irmã Maria Uliánova, “Vladimir Ilitch chegava por volta das 2 horas da noite, completamente exausto, pálido, às vezes nem conseguia falar ou comer, costumava se servir de um copo de leite quente e o bebia andando pela cozinha onde costumávamos jantar.”

O professor Livéri Darkchevitch, que examinou Lênin em março de 1922, notou “uma enorme quantidade de manifestações neurastênicas extremamente graves que o privaram completamente da possibilidade de trabalhar como [o fazia] antes” e “uma série de obsessões que assustam muito o paciente”. “Isso não levará a loucura, né?”, perguntou Lênin ao professor.

O primeiro derrame ocorreu depois da remoção da bala

Em abril de 1922, Lênin começou a se sentir tão doente que os médicos sugeriram que ele poderia ter sido envenenado por balas de chumbo que permaneceram em seu corpo após a tentativa de assassinato em 30 de agosto de 1918. Segundo o acadêmico e cirurgião Iúri Lopukhin, “a decisão [de retirar balas do corpo] é muito polêmica e duvidosa, tendo em conta que durante esses quatro anos desde a tentativa de assassinato, as balas já estavam alojadas e, como acreditava o professor Vladímir Rozanov, a sua remoção “fará mais mal do que bem”.

Em 23 de abril de 1922, o cirurgião alemão Borchardt retirou uma bala do corpo de Lênin, e em 27 de abril, o líder soviético já tinha voltado para as reuniões. Ele continuou a trabalhar ativamente por mais um mês, até que em 25 de maio sofreu seu primeiro acidente vascular cerebral em sua casa em Górki, perto de Moscou. O derrame levou à perda da fala, às vezes não conseguia ler ou escrever, e tinha pouco controle da mão direita.

Em 29 de maio, o conselho de médicos, que contou com a participação do grande neurologista Grigóri Rossolimo e do comissário do povo (ministro) para a Saúde, Semachko, admitiu que a doença não era clara. Presumiu-se ser aterosclerose, mas os médicos estavam surpresos ao ver que o intelecto de Lênin permanecia completamente intacto.

Lênin pediu a Stálin que lhe desse veneno

Em 30 de maio, após a reunião do conselho dos médicos, Lênin pediu a Ióssif Stálin que viajasse a Górki. Como escreve o acadêmico Lopukhin, “conhecendo o caráter forte de Stálin, Lênin lhe pediu para trazer veneno para cometer suicídio”. No entanto, Stálin conseguiu persuadir Vladimir Ilitch a se submeter ao tratamento. No verão de 1922, a saúde de Lênin começou a dar sinais de melhora. Em 16 de junho, ele começou a sair da cama e, como contou a enfermeira Petrácheva, o líder soviético “até dançou comigo”. No entanto, as manifestações patológicas continuaram durante todo o verão; Lênin, às vezes, perdia o equilíbrio e, em 4 de agosto, teve um espasmo com perda da fala após a injeção de arsênico com a qual era tratado.

A saúde piorou após voltar ao trabalho

Cinco meses após o derrame, Lênin retornou a Moscou. Os professores acreditavam que ele estava totalmente recuperado, mas ele admitiu: “Fisicamente me sinto bem, mas não tenho mais o mesmo frescor de pensamento. Para colocar na linguagem de um profissional, eu perdi a capacidade de trabalhar por longos períodos.”

Em outubro e novembro de 1922, Lênin participou de diversas reuniões do Conselho dos Comissários do Povo e discursou em congressos e convenções. Suas forças chegaram a fim em 7 de dezembro, quando partiu para Górki. Em 12 de dezembro, Lênin retornou a Moscou, onde sofreu convulsões e o segundo derrame, após o qual o lado direito de seu corpo ficou paralisado.

Em 24 de dezembro de 1922, Stálin convocou uma reunião com a participação dos líderes da URSS: Lev Kámenev, Nikolai Bukhárin e os médicos de Lênin. Decidiram protegê-lo de notícias sobre a vida política, “para não fornecer material para reflexão e preocupação”. Também foi proibido de receber visitas.

Apesar disso, Lênin continuou a ditar notas e cartas até 9 de março de 1923, quando foi acometido pelo terceiro derrame. Ele novamente perdeu a fala e jamais mais voltou ao trabalho. No verão de 1923, sob a supervisão da sua esposa, viu-se obrigado a reaprender a andar, pegar objetos e falar. Krúpskaia escreveu: “Ele já anda com ajuda e de forma independente, apoiando-se no corrimão, sobe e desce escadas. [...] Ele está com muito bom humor e agora já percebe que está se recuperando.” De 18 a 19 de outubro, Lênin esteve em Moscou pela última vez; dali, voltou para a sua datcha em Górki.

As circunstâncias da morte que ocorreu há exatos 100 anos ainda são secretas

Vladimir Lênin morreu em Górki na noite de 21 de janeiro de 1924, às 18h50. Ele tinha 53 anos. A autópsia do corpo foi realizada no dia seguinte pela manhã. Os historiadores ainda não sabem por que o corpo não foi levado para autópsia em Moscou, onde ficavam os melhores institutos médicos.

Existem duas versões da principal causa da morte de Lênin: aterosclerose cerebral e complicações de sífilis. Hoje, 100 anos após a sua morte, ainda não há consenso sobre esta questão. O acadêmico Iúri Lopukhin sugere que a verdadeira causa da doença e morte de Lênin foi o bombeamento insuficiente de sangue ao cérebro causado pelo ferimento em 1918.

Uma parte significativa dos documentos sobre a morte e doença de Lênin permanecem secretos até hoje a pedido de sua sobrinha Olga Uliánova (1922-2011), porém o sigilo expira agora em 2024.

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