Por que Nicolau 1º da Rússia foi apelidado de "gendarme da Europa"?

História
EKATERINA SINELSCHIKOVA
Na Rússia, Nicolau 1º, um dos tsares mais conservadores da história, ficou conhecido como "autocrata inflexível", "carrasco", "assassino de revolucionários" e "pai da burocracia russa". Mas, no exterior, o monarca recebeu outro apelido: "gendarme da Europa". O Russia Beyond explica a origem desses apelidos.

O período do reinado de Nicolau 1° (1825-1855) é considerado complexo e contraditório. Este monarca entrou na história principalmente sob epítetos negativos. Nicolau é mais lembrado como um conservador cujo reinado foi marcado por uma grande expansão territorial, repressão de dissidentes, estagnação econômica, políticas ruins de administração, burocracia e guerras.

Como Nicolau ascendeu ao trono?

Nikolai (Nicolau) Pávlovitch Romanov era o terceiro filho do imperador Paulo 1º e o último na linha de sucessão ao trono. Assim, ele não estava sendo preparado para virar imperador e quase nunca se envolvia em problemas de Estado. Como outros grão-duques, ele recebeu uma excelente educação militar e, antes de ascender ao trono, foi comandante de diversas unidades da guarda real, ocupando o posto de engenheiro-chefe do exército russo.

No entanto, em 1825, seu irmão mais velho, o imperador Alexandre 1º morreu repentinamente. O irmão do meio, Konstantin, estava, na época, em Varsóvia e se recusou terminantemente a assumir o trono — mas também a renunciar oficialmente a ele. Enquanto Konstantin hesitava, os militares e até o próprio Nicolau já haviam prestado juramento a Konstantin na capital.

No entanto, sob pressão da família e das elites, Nicolau decidiu mudar de posição, declarou-se imperador e marcou a posse para 14 de dezembro. Nesse dia, os revolucionários, junto com diversos militares, saíram para a Praça do Senado, em frente ao Palácio de Inverno, residência do imperador russo, para proteger os direitos de Konstantin e não permitir que Nicolau assumisse o trono.

O plano dos revolucionários, mais tarde chamados de “dezembristas”, fracassou, o exército não os apoiou, e a rebelião foi reprimida. Nicolau executou cinco instigadores da rebelião por enforcamento. Esse sangrento episódio marcou o início do reinado de Nicolau 1º.

Como Nicolau governou?

Nicolau 1º estava fortemente convencido de que a monarquia era a única forma de governo adequada à Rússia. Consequentemente, ele considerava desastrosas quaisquer mudanças liberais. Ele era um rígido conservador, sua política de Estado era descrita por historiadores por três postulados: autocracia, ortodoxia e nacionalidade.

“Nicolau tinha o objetivo de não mudar nada, não introduzir nada de novo, apenas manter a ordem existente, preencher as lacunas”, escreveu o historiador Vassíli Kliutchévski.

Ele concentrou o governo do país em suas mãos e nas mãos dos ministros, a quem os funcionários públicos estavam totalmente subordinados, enquanto a sociedade foi excluída dos processos políticos.

Para saber como vivia a sociedade e controlá-la, ele criou um novo órgão, a Chancelaria Própria de Sua Majestade Imperial. O Terceiro Departamento dessa Chancelaria foi apelidado de “polícia secreta”, e vigiava “elementos não confiáveis”, censurava a literatura, os jornalistas e enviava relatórios regulares ao imperador.

Nicolau era uma pessoa religiosa e considerava que a revolta dezembrista mostrava seu “direito divino” ao trono. “Ele considerava o que tinha acontecido como a providência de Deus e resolveu que aquilo era um chamado do Senhor para combater a infestação revolucionária não apenas em seu próprio país, mas na Europa em geral: ele considerava a conspiração dezembrista parte de uma revolução pan-europeia”, escreveu o historiador Leonid Liáschenko. Essa confiança na ameaça revolucionária determinou a política externa de Nicolau 1º.

Gendarme da Europa

Nicolau 1º chegou ao trono convencido de que o Império Russo estava ameaçado por uma revolução organizada a partir dos países europeus. Ele acreditava que a Rússia tinha que manter paz e um poder forte na Europa. Assim, enquanto se iniciava uma revolução na Europa, o tsar considerava seu dever sagrado combatê-la e reagir rapidamente.

Em 1830, o exército russo reprimiu severamente a revolta polonesa contra as autoridades russas.

Após a revolução na França em 1848, quando o rei Luís Filipe 1° foi derrubado e a Segunda República foi proclamada, os acontecimentos revolucionários da França se espalharam para outros países, como Itália e Áustria.

Uma semana após o levante francês, o imperador da Áustria, Francisco José 1º, pediu ajuda ao tsar russo contra o levante da Hungria, que poderia levar ao colapso do Império Austro-Húngaro e à formação de uma coalizão contra a Rússia.

Nicolau 1º ficou horrorizado com a situação, e, em 1849, enviou um enorme exército de 170 mil soldados e oficiais em socorro a Viena. Esta intervenção militar desempenhou um papel crucial na derrota dos húngaros por sua independência.

Foi quando que a imprensa europeia começou a chamar o tsar russo de "gendarme da Europa". Mais tarde, na historiografia soviética, essa expressão seria associada à declaração de Vladímir Lênin de que, em 1849, a Rússia teve que desempenhar um papel de gendarme europeu — ele escreveu isso em um artigo de 1908 intitulado “Eventos nos Bálcãs e na Pérsia”.

De qualquer maneira, a revolução nunca cruzou as fronteiras do Império Russo. O regime de Nicolau 1º superestimou tanto suas próprias forças em outra guerra, aquela contra o Império Otomano entre 1853-1856, que isso o enfraqueceu. Nicolau 1º cometeu vários erros desastrosos e perdeu a guerra, minando a fé em seu regime — mesmo entre os conservadores mais leais.

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