Séculos 16 a 17: "Incutindo respeito nos estrangeiros"
Barba – todas as nacionalidades têm.
Bigode sem barba - lituano ou polaco.
Sem barba, nem bigode - "nemtchin" (qualquer europeu, católico ou estrangeiro).
Мужик с дубиной в лесу
Ivan KramskoiA sociedade de Moscou foi abalada por um escândalo: o Grão-Duque Vassíli Ioannovitch raspou a barba e começou a andar "ao estilo lituano", "de bigode". Segundo os boatos, ele fez isso para bajular a Princesa Elena, da família Glinski, que era 29 anos mais jovem.
Портрет польского шляхтича --- Александр Орловский
Aleksandr OrlóvskiElena casou-se com Vassíli e logo deu à luz um herdeiro, que viria a ser conhecido mais tarde como Ivan, o Terrível. Mas, ainda por muito tempo, aquilo foi um horror: barbear-se, naquela época, era proibido aos cristãos ortodoxos.
Na Rússia Antiga e Medieval, barba e bigode eram naturais para todos os homens. Até a Pravda Russa reconhecia o status especial da barba - se alguém danificasse deliberadamente a barba de outra pessoa, tinha que pagar uma multa.
Великий государь, царь и самодержец всея Руси
Serguêi IvanovMas, com o tempo, as barbas passaram a ser cortadas - como na Europa, no início dos tempos modernos, um rosto limpo de pelos tornou-se sinal de alto status social.
Na Rússia, ainda houve resistência à nova moda: os regulamentos do Conselho Stoglavi, de 1551, proibiam cortar bigodes e barbas, sob pena de excomunhão da Igreja e de seus sacramentos.
Com os constantes confrontos entre Ortodoxia e Catolicismo da época e as frequentes tentativas da Igreja Católica de converter a população ortodoxa, usar ou não a barba também era uma questão política.
A barba, na Rússia pré-Petrina, não era apenas motivo de orgulho, mas até mesmo objeto de juramentos. O viajante Adam Olearius observou que dos boiardos de Moscou os mais respeitados eram os de barriga grande e barba comprida.
"Sua majestade o tsar exibe tais homens em audiências solenes, pensando que isso incute nos estrangeiros um maior respeito por sua pessoa."
Século 18: "Espere! E a barba?"
Barba - camponês, comerciante rico, clérigo, velho crente.
Sem barba e bigode - todos os outros.
Портрет А.Н.Демидова
Georg Christoph GroothUm homem de "rosto pelado" nas ruas russas atraía a atenção. A primeira coisa que pensariam era que se tratava de um estrangeiro, alemão ou lituano! Mas, no final do século 17, havia tantos estrangeiros no país que virou moda também entre os jovens russos os penteados europeus e aparar ou raspar a barba.
Em 1675, um decreta especial em Moscou lembrava a nobreza de "não adotar costumes estrangeiros alemães e outros e não raspar os cabelos das cabeças, assim como não usar vestidos, caftans e chapéus deles e não deixar os seus usá-los".
Em 1698, quando Pedro retornou de sua Grande Embaixada, convocou os boiardos e, enquanto lhes contava da campanha e recebia convidados, passou a lhes cortar a barba. Sua chocante ação foi repetida no banquete seguinte, na presença do tsar, e depois em outro...
Da mesma forma que o homem sem barba parecia um estrangeiro na Rússia, os membros barbudos das embaixadas russas eram taxados de selvagens na Europa. Pedro entendeu a necessidade de tirar essa barreira cultural para o comércio florescer.
A partir de 1700 todos os russos, exceto o clero, os carpinteiros e os camponeses teriam que usar vestimentas "alemãs" e, a partir de 1705, foi colocado o famoso "imposto sobre a barba" nas cidades. Ele não se aplicava aos camponeses, que continuavam a andar barbudos — mas tinham que pagar um copeques se tivessem que entrar na cidade.
Os moradores da cidade que quisessem usar barba tinham que pagar um imposto enorme – os cidadãos urbanos ricos ("comerciantes e burgueses") pagavam 60 rublos por ano, enquanto os mais pobres pagavam 30 rublos e os comerciantes ricos, 100 rublos ao ano.
Um soldado do exército recebia 10 rublos por ano. Você consegue imaginar como era caro ter uma barba?
Havia um “controle da barba” em todos os portões da cidade, e as patrulhas subiam e desciam as ruas buscando infratores.
O historiador Grigóri Essipov descreveu aqueles tempos assim: "Um pobre industrial da classe mercante ou do campesinato leva coisas, troncos, madeira, carvão ou qualquer outra mercadoria para a cidade, mas no portão da cidade lhe dizem: ‘Pare! E a barba?’ Assim, um copeque é colocado nos bolsos dos postos avançados — se ele se recusar a pagar e é enviado ao gabinete do governador, de onde é enviado para a prisão, onde passará um longo tempo (como o pobre homem conseguiria 50 rublos?). Em 1723, tantos comerciantes e industriais pobres vindos a Petersburgo com os bens mais mesquinhos se acumularam com suas barbas no escritório provincial que o Senado ordenou que eles raspassem a barba e saíssem sob fiança..."
Século 19: "Bigodes aprovados pela mais alta autoridade"
Barba - camponês, comerciante rico, clérigo, velho crente;
Barba e roupas da moda - dândi, homem de pensamento livre e almofadinha;
Bigode sem barba - militar;
Sem barba e bigode - cidadão comum.
Grupo de velhos crentes de Nijni Novgorod.
Domínio públicoA partir de 1762, Catarina aboliu o imposto sobre a barba para civis - mas o exército continuou a fazer a barba, seguindo com os regulamentos internos. Já não era mais costume na sociedade russa usar barba. Os velhos crentes, por outro lado, tinham direito de andar com barba sem pagar nenhuma multa.
Nicolau 1° com o tsarevitch Alexandre no estúdio do artista em 1854.
Bogdan VillevaldeCom o início do século 19 e de uma época dândi, a barba tornou-se símbolo dos ermitões. O próprio imperador Alexandre 1° disse que deixaria a barba crescer e se retiraria para a Sibéria se perdesse a guerra com Napoleão.
A partir dos anos 1830, a barba passou a ser sinal de boas maneiras. Como escreveu a Revista das Damas (em russo, Damskie jurnal), "muitos jovens imaginam que atrairão a atenção se deixarem crescer a barba da mesma forma que os cidadãos das antigas repúblicas grega e romana".
Retrato do soldado M. Kulakov da Companhia de Granadeiros do Palácio.
Vladímir PoiarkovEntretanto, esses modistas não eram populares na sociedade —eram comparados a "cossacos sujos", dervixes e até mesmo cabras.
Qual não foi a surpresa do público quando, em 1832, as fileiras militares foram autorizadas a usar bigodes e suíças? Isso aconteceu porque o próprio imperador, Nicolau 1°, deixou seu bigode crescer e, para usá-lo, teve que permitir que todo o exército fizesse o mesmo (ele tinha o posto militar de engenheiro-general).
Entretanto, o imperador logo percebeu que os funcionários civis, especialmente nas províncias, começaram a deixar crescer barbas e bigodes. Em 1837, ele teve que emitir um decreto, em que se lia: "Os chefes das autoridades civis devem observar estritamente que seus subordinados não usem barba nem bigode, pois estes últimos pertencem ao uniforme do exército.”
Durante o reinado de Nicolau, o único civil "oficial" com bigode era o pintor da corte Bogdan Villevalde. O imperador posou para ele tantas vezes que o pintor obteve o direito de manter o bigode, que ele apelidou de "bigode aprovado pela alteza".
Em 1874, o imperador Alexandre 2° permitiu que todos os militares (exceto a Guarda, a comitiva e as fileiras superiores) usasse bigodes e barbas, enquanto seu filho, o barbudo imperador Alexandre3°, imediatamente após sua adesão, em 1881, permitiu que todos, independentemente de sua posição, tivessem barba.
Enquanto isso, as fileiras inferiores da guarda e dos granadeiros foram instruídas separadamente "a não ter barba". A partir daí os rostos peludos na Rússia já não eram objeto da legislação, mas da moda e passou a ser impossível entender com facilidade o uso de bigodes e barbas.
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