Como o mundo se lembrará de Mikhail Gorbatchov, o primeiro e único presidente da URSS?

Legion Media
O último líder da URSS e pai da Perestroika morreu na noite de 30 de agosto de 2022, em Moscou, aos 91 anos.

Mikhail Gorbatchov (também grafado como Gorbachev) nasceu em 2 de março de 1931 e, como ele mesmo se lembrava, iniciou, quando ainda era estudante, “um longo processo de repensar a história do país que se estendeu por anos”.

Sua ascensão ao cargo mais alto da URSS, o de secretário-geral do Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética (PCUS), equivalente ao cargo de presidente, em muitos outros países, deu-se em 11 de março de 1985.

E não foi surpresa para outros altos funcionários soviéticos: Gorbatchov tinha boas relações com Leonid Bréjnev e com outros líderes do país e demonstrava ótimos resultados como ministro da Agricultura da URSS.

Gorbatchov como candidato a membro do Politburo.

O ambicioso líder era amado por seu povo e pelos governos de países ocidentais, e prometeu realizar muitas mudanças.

Em 1991, um ano depois de receber o Prêmio Nobel da Paz pelo "seu papel de liderança no processo de paz”, ele disse: “Na hora de aceitar o cargo mais alto do país, o de secretário-geral do Comitê Central do PCUS, percebi que é impossível continuar a viver assim, e não me permitirei permanecer neste cargo se não for apoiado na implementação de mudanças fundamentais”.

Recebendo o Prêmio Nobel em 1990.

Muitas dessas mudanças fundamentais foram realizadas, mas nem todas foram aceitas ou compreendidas.

A campanha contra o alcoolismo, por exemplo, que buscava a sobriedade de uma população que morria devido ao uso abusivo de bebidas, foi o primeiro passo difícil dado pelo novo secretário-geral no caminho à Perestroika (reconstrução), seguido por um expurgo massivo de altos funcionários públicos e o rejuvenescimento do partido no poder.

Gorbatchov encontra o povo.

Mais tarde, Gorbatchov pôs fim ao sistema de partido único da URSS, à exclusividade do PCUS  garantida pela Constituição, instaurou as eleições no país (realizadas seguindo um modelo democrático), e pôs um fim à perseguição aos chamados “dissidentes”. 

Gorbatchov trouxe o acadêmico exilado Andrei Sakharov de volta ao país e prosseguiu com a reabilitação das vítimas das repressões de Stálin que não tinham sido reabilitadas sob Nikita Khruschov.

Seu principal mérito foi proclamar a liberdade de expressão e o fim da censura. Após a chegada de Gorbatchov ao poder, as tiragens de jornais ultrapassaram a cifra dos milhões, o PCUS e os governantes se tornaram pela primeira vez objeto de crítica pública.

Posteriormente, Gorbatchov foi culpado pela reforma da liberdade de expressão: supostamente, ela teria despertado a autoconsciência nacional, levando, assim, ao colapso da URSS. 

Sem essa liberdade, o país e o mundo provavelmente não saberiam tão cedo sobre o desastre nuclear de Chernobyl, um dos capítulos mais tristes na biografia política de Gorbatchov, junto com o conflito em Nagorno-Karabakh, a entrada de tropas no Azerbaijão e a dispersão de manifestantes em Alma-Ata.

Em 26 de abril de 1986 ocorreu o desastre de Tchernóbil.

O mundo, porém, sem dúvida, se lembra de Gorbatchov como o homem que parou a corrida armamentista e transformou o "Império do Mal" em um aliado na prevenção de cataclismos geopolíticos e ambientais. 

Foi ele quem proclamou o "novo pensamento de política externa", iniciou o processo de reunificação alemã e retirou as tropas soviéticas do Afeganistão. Foi ele quem expressou a ideia, que parecia uma utopia absoluta, de eliminar as armas nucleares até o ano 2000 e criar sistemas internacionais de segurança, assinou o tratado Start-1 e o Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermediário com os Estados Unidos. 

Fim da retirada de tropas soviéticas da República Democrática do Afeganistão. Comboio de veículos blindados atravessa a fronteira afegã-soviética na Ponte da Amizade sobre o rio Amu-Daria.

Durante uma reunião em Malta, Gorbatchov pôs fim à Guerra Fria em nível diplomático, mas, mais tarde, foi acusado de perder essa guerra. Gorbatchov respondeu: “Queremos ser compreendidos [...] isso não significa que devemos nos tornar exatamente iguais aos outros, mas nos tornarmos compreensíveis aos outros".

Malta. Primeira conferência de imprensa conjunta entre líderes da URSS e dos EUA, em Valletta, em 3 de dezembro de 1989. Na foto, Gorbatchov, Secretário Geral do Comitê Central do CPUS, e George W. Bush, presidente dos EUA, em coletiva de imprensa.

Após sua renúncia, ele continuou monitorando o desenvolvimento do país, estabeleceu a Fundação Gorbatchov e a Cruz Verde Internacional, tentou retornar à grande política, mas na eleição presidencial teve apenas 0,51% dos votos.

O único presidente da URSS entrou em forte oposição com o primeiro presidente da Federação Russa, Boris Iéltsin, depois apoiou seu sucessor, Vladimir Putin — embora não por muito tempo —, e entrou em uma fase de introspecção e admissão de erros.

Gorbatchov (esq.) e Borís Iéltsin (1931-2007), membro da Politburo do Comitê Central do Partido Comunista Soviético, durante reunião na Casa Branca (sede do Parlamento russo).

"A Perestroika venceu! Fui eu quem perdi como político”, resumiu em 2009. Embora, talvez, ele tenha formulado e expressado uma das principais conclusões em 1991: “A vida é muito mais rica e complicada do que os planos mais perfeitos de como torná-la melhor. No final, ela vinga cruelmente a imposição forçada de esquemas sobre ela, mesmo as que foram criadas com boas intenções."

Lembrando Gorbatchov

À medida que as milhares de palavras de condolências continuam a chegar, destacamos as mais importantes de figuras proeminentes que conheceram ou foram inspiradas por Mikhail Gorbatchov

O presidente russo Vladimir Putin (dir.) se encontra com o ex-presidente soviético Mikhail Gorbatchov (esq.).

Vladimir Putin, presidente da Rússia, em um telegrama para familiares e amigos:

“Por favor, aceite as mais profundas condolências pela morte de Mikhail Gorbatchov.

Mikhail Gorbatchov foi um político e estadista que teve uma enorme influência sobre o curso da história mundial. Ele liderou nosso país durante mudanças complexas e dramáticas, política externa de grande escala, desafios econômicos e sociais. Ele entendeu profundamente que as reformas eram necessárias e tentou oferecer suas próprias soluções para os problemas prementes.

Também gostaria de fazer uma menção especial às extensas atividades humanitárias, beneficentes e educacionais que Mikhail Gorbatchov realizou nos últimos anos.

Mais uma vez, por favor, aceite minhas sinceras palavras de solidariedade e apoio em relação à sua perda.”

 

 Gorbatchov na tribuna do mausoléu de Lênin.

António Guterres, secretário-geral da ONU

“Mikhail Gorbatchov foi um estadista único, que mudou o curso da história. O mundo perdeu um líder global imponente, multilateralista comprometido e incansável defensor da paz. Estou profundamente triste com o seu falecimento.”

 

Joe Biden, presidente dos Estados Unidos

“Mikhail Gorbatchov era um homem de visão incrível.

Ele tinha as características de um líder raro, com a imaginação para ver que um futuro diferente era possível e com a coragem de arriscar toda a sua carreira para alcançá-lo. O resultado foi um mundo mais seguro e maior liberdade para milhões de pessoas.

Mesmo anos depois de deixar o cargo, ele ainda estava profundamente engajado. Quando Gorbatchov visitou a Casa Branca, em 2009, conversei com ele por um longo tempo sobre o trabalho para reduzir os estoques nucleares dos EUA e da Rússia. Era fácil ver por que tantos em todo o mundo o tinham em tão alta estima.

Enviamos nossas mais profundas condolências à sua família e amigos, e às pessoas em todos os lugares que se beneficiaram de sua crença em um mundo melhor.”

 

James Baker III, ex-secretário de Estado dos EUA

“A história lembrará de Mikhail Gorbatchov como um gigante que guiou sua grande nação para a democracia. Ele desempenhou o papel crítico em uma conclusão pacífica da Guerra Fria por sua decisão de não usar a força para manter o império unido […] O mundo livre sente muita falta dele.”

 

O ex-presidente Ronald Reagan (esq.), e o ex-presidente soviético Gorbachev vestem chapéus de cowboy no Rancho del Cielo, de Reagan, na Califórnia, em 2 de maio de 1992.

Henry Kissinger, ex-secretário de Estado dos EUA

“Mikhail Gorbatchov prestou grandes serviços, mas não conseguiu implementar todas as suas visões. O povo da Europa Oriental e o povo alemão e o povo russo têm uma grande dívida de gratidão pela inspiração, pela coragem de apresentar essas ideias de liberdade. Ele ainda será lembrado na história como um homem que iniciou transformações históricas que beneficiaram a humanidade e o povo russo”.

 

Mikhail Gorbachev ao lado do memorial do Muro de Berlim.

Emmanuel Macron, presidente da França

“Minhas condolências pela morte de Mikhail Gorbatchov, um homem de paz cujas decisões abriram o caminho para a liberdade dos russos. Seu compromisso com a paz na Europa mudou nossa história comum”.

 

Boris Johnson, primeiro-ministro do Reino Unido

“Estou triste ao saber da morte de Gorbatchov. Sempre admirei a coragem e integridade que ele mostrou ao levar a Guerra Fria a uma conclusão pacífica.”

 

Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia

“Mikhail Gorbatchov era um líder confiável e respeitado. Ele desempenhou um papel crucial para acabar com a Guerra Fria e derrubar a Cortina de Ferro. Abriu caminho para uma Europa livre.

Este legado é um que não vamos esquecer.

Descanse em paz, Mikhail Gorbatchov”

 

Gorbatchov nos bastidores do desfile militar que marcou o 73º aniversário da vitória russa na 2° Guerra Mundial.

A ex-secretária de Estado dos EUA Condoleeza Rice:

“Estou triste em saber do falecimento de Mikhail Gorbatchov. Ele era um homem que tentou dar uma vida melhor para seu povo. Sua vida teve consequências porque, sem ele e sua coragem, não teria sido possível acabar com a Guerra Fria pacificamente.”

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