“Sinto-me bem com o casaco de pele do meu velho, é como se você estivesse vestindo sua própria casa. Eles vão perguntar se está frio lá fora hoje e você não saberá o que dizer: talvez esteja, mas como vou saber?”, escreveu Óssip Mandelstám sobre a chúba russa. Realmente, uma boa chúba ajuda a ficar aquecido, mesmo no frio mais severo.
Um caro calor
A palavra "chúba" veio, segundo se presume, para a língua russa proveniente da palavra árabe “jubba”, que significa " sobretudo de mangas compridas". Na Rússia, desde os tempos antigos, usar uma chúba é um sinal de riqueza, porque a pele animal sempre foi cara e, para fazer uma chúba até o joelho, um peleteiro precisava de 50 a 60 peles de marta ou raposa prateada.
O que as pessoas comuns vestiam, portanto, eram casacos feitos de pele de ovelhas ou lebre, animais muito mais baratos e fáceis de obter do que a marta, a raposa prateada ou a zibelina.
Na Rússia de Kiev e nas terras russas em geral, antes da Invasão Mongol do século 13, as peles eram usadas como dinheiro e, quando exportadas para o Oriente Médio e Europa, trocadas por prata e ouro, promovendo, assim, o uso de metais preciosos para cunhagem de moedas na Rússia. Após a Invasão Mongol, algumas terras russas pagaram tributos aos mongóis com peles - por exemplo, a região de Nôvgorod foi obrigada a pagar em zibelina negra.
Comandantes mongóis de alto escalão usavam peles russas para fazer chúbas e as usavam como símbolo de riqueza e poder. Suas chúbas eram usadas de maneira peculiar. Uma chúba era usada com a pele voltada para dentro, para aquecer, e outra, com a pele voltada para fora, para ostentar.
Os príncipes russos e os boiardos tomaram emprestada essa forma de ostentação, junto com muitas outras coisas que adotaram dos mongóis. Até mesmo as coroas dos tsares russos tinham bordas de pele, seguindo a tradição mongol.
No entanto, os príncipes russos, boiardos e pessoas ricas em geral adotaram o hábito de usar chúbas com pele por dentro. Elas tinham formato de sino (mais largas na base), com mangas largas e golas de pele dobráveis. No lado de fora, o lado da "pele", esses sobretudos eram cobertos com tecidos caros, como brocado, cetim ou veludo, bordados com ouro e pedras preciosas.
Pessoas ricas às vezes usavam várias chúbas ao mesmo tempo - especialmente em ocasiões festivas. Por ser uma "roupa de status", as chúbas eram usadas até no verão! Imagine como os boiares suavam em suas chúbas e chapéus de pele altos em salas abafadas de palácios de madeira!
‘Fábricas de piolhos’
Pedro, o Grande, livrou-se das chúbas na corte no século 18. A partir daí, todos os cortesãos, oficiais e comandantes militares eram obrigados a adotar roupas em estilo europeu. Mas no inverno, eles certamente voltavam para as boas e velhas chúbas, que tinham um visual um pouco diferente do anterior, sem aqueles bordados todos.
Mas as chúbas ainda eram usadas com pele voltada para dentro e só gente simples as usava com a pele voltada para fora, como fazemos agora. A chúba de hoje em dia só serviria para um cocheiro ou um camponês nos séculos 18 a 19.
Mas todas as chúbas, não importasse de que classe, tinham uma enorme quantidade de piolhos. Charles François Masson, um francês a serviço da Rússia no final do século 18, escreveu: “Quando chegam para um baile, as senhoras russas deixam seus magníficos casacos de pele preta e marrom de raposa ártica, arminho, marta e zibelina para os criados; enquanto esperam por suas amas, os criados se deitam sobre esses casacos de pele. Quando as senhoras estão indo embora, os criados as embrulham nessas peles preciosas infestadas de parasitas...”
Esse era o preço que se pagava por usar a chúba. Mas nada freava as damas de então. Havia também certas regras para mulheres que usavam peles.
“Havia regras hierárquicas no uso das peles, que não dizia respeito a classe, mas sim idade e status social. Mulheres mais velhas usavam zibelina e as moças, ou esquilo siberiano, ou pele de ovelha Karakul, ou lebre”, diz a historiadora Iulia Demidenko.
As meninas eram obrigadas a usar peles baratas, mesmo que sua riqueza lhes permitisse usar vison e zibelina - esse era o costume. No final do século 19, para meninas e mulheres, virou moda usar chúbas com a pele para o lado de fora, para mostrar sua beleza — mesmo que fosse menos quente assim.
A chúba na era soviética
Na Rússia, normalmente ninguém pensaria em jogar fora uma chúba velha. Mesmo que estivesse gasta e empoeirada, ela ainda podia ser reformado — ou, pelo menos, partes boas dela podiam ser usadas para fazer um chapéu ou uma gola para outra chúba, porque as peles eram sempre caras.
A situação não mudou muito nos tempos soviéticos: uma boa chúba podia realmente custar muito para um cidadão soviético, enquanto as exportações de peles - tão importantes para a economia russa - continuavam: entre 1925 e 1926, a participação das peles nas exportações soviéticas foi de 89,6%.
A partir da década de 1930, a produção de peles foi monopolizada pelo Estado. Em 25 de novembro de 1939, o governo proibiu a produção e comercialização particular de peles a fim de proteger o comércio doméstico de especuladores.
Com as exportações e as grandes quantidades de casacos de pele produzidos para o Exército Vermelho durante a Segunda Guerra Mundial, a Rússia Soviética quase esgotou suas reservas de animais usados para produção de peles.
As fábricas reclamavam então que apenas um terço das matérias-primas recebidas era de boa qualidade. Em 1958, Nikita Khruschóv defendeu ativamente a introdução da pele artificial – naquela época uma chúba “de ovelha” artificial podia custar 1.000 rublos (contra os 4.000 rublos da chúba de ovelha natural).
O salário de uma faxineira naquela época era de 30 rublos por mês, um vendedor de loja de departamentos ganhava 100 rublos por mês e um trabalhador altamente qualificado podia ganhar até 200 rublos por mês. Portanto, para a maioria das pessoas, uma chúba era um sonho difícil de se realizar.
No entanto, as chúbas de pele artificial apresentavam uma grande desvantagem: tinham apenas metade do calor do pelo natural. Portanto, o povo soviético ainda preferia pele natural, tentava obter chúbas, chapéus e sobretudos "naturais" a qualquer custo e passava muito tempo cuidando deles e consertando-os.
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