Surkharbaan: como a Sibéria celebra o principal festival de verão

Estilo de vida
ANNA SORÔKINA
Enquanto homens fortes competem na luta, no arco e flecha e nas corridas de cavalos, o público se empanturra de buuzes e quilômetros de tchebureks.

Estamos no verdadeiro calor siberiano: 30 graus Celsius parecem 50. Cavalos fumegantes correm a toda velocidade, faltando apenas alguns segundos para a linha de chegada. A plateia se cala. De repente, um dos líderes da corrida, um garanhão chamado Pogrom, lança seu cavaleiro no chão e foge rumo ao vale. Todos ficam sem reação e uma ambulância aparece no campo. Mas o cavaleiro tem tanto ímpeto quanto o seu cavalo; ele corre atrás do animal e o devolve à pista, finalizando a corrida.

É assim que se realiza, todo início de julho, o antigo festival cultural e esportivo Naadan Surkharbaan na Buriátia, uma república russa perto do lago Baikal, na Sibéria Oriental. Os melhores atletas competem em modalidades como: luta livre tradicional, tiro com arco, corrida de cavalos e esmagamento de ossos com as próprias mãos — sim, você leu corretamente.

Nascido sobre a sela

Um dos principais eventos é no hipódromo do datsan Yangazhinskiy, a 50 quilômetros da capital da Buriátia, Ulan-Ude. No início do século 20, um famoso devoto budista, Dashi-Dorzho Itigilov, serviu no local como abade.

Apesar da distância e do calor, cerca de dez mil pessoas compareceram este ano para assistir às competições, e mais de 130 cavalos correram.

“Eles nasceram sobre a sela”, dizem os espectadores sobre os cavaleiros. A toda velocidade, correm pelos vales das estepes, ultrapassando-se com maestria nas curvas perigosas. Para aprender a manobrar assim, os atletas costumam subir na sela assim que aprendem a andar.

O curioso dessa corrida é que a maioria dos cavalos são da raça Buryat: animais indígenas, baixos e leves, mas incrivelmente resistentes. São nove percursos no total, de 1.200 metros até 21 quilômetros.

Os cavaleiros ficam ansiosos. Está quente e há muito barulho; e os cavalos têm uma personalidade e tanto — sempre tentam fugir. Apenas uma pessoa literalmente nascida na sela pode lidar com eles.

Três jogos de homens

O festival Naadan Surkharbaan tem raízes antigas, e os melhores guerreiros nômades sempre competiam. O evento é realizado na época do verão quando termina a semeadura, mas ainda falta tempo para a colheita. Os locais até dizem que o verão só começa de verdade depois de Surkharbaan.

Naadan pode ser traduzido como jogos, enquanto Surkharbaan, como atirar em um alvo. As principais competições são tiro com arco, luta livre buriate e as corridas de cavalos. Antes, o festival era, inclusive, apelidado como tal – “três jogos de homens”. Hoje, mais esportes foram adicionados, como quebrar um osso com as próprias mãos (!), erguer uma vara de seis metros durante a cavalgada, o jogo de ossos shagai naadan, o xadrez shatar, além de uma demonstração de arqueiros a cavalo.

Lute até o fim

As arquibancadas do estádio central da capital buriate lotam desde cedo. Muitas pessoas chegam de regiões remotas para torcer pelos compatriotas.

Curiosamente, a luta livre da Buriátia é uma disciplina real no mundo dos esportes. Os participantes competem em shorts extravagantes com faixas enroladas em seus corpos. Antes da luta, eles executam a Dança da Águia para intimidar o oponente. A luta dura até cinco minutos. O atleta perdedor, em sinal de respeito, deve passar debaixo do braço do campeão.

Bair Omoktuev, o atual campeão de sambo na Rússia, Europa e no mundo, foi também o campeão da luta livre buriate neste ano.

As finais da competição para quebrar um osso com as próprias mãos — chamada heer shaalga — não foram menos emocionantes.

Neste jogo, um participante pega um osso de gado com uma das mãos e deve quebrá-lo com um golpe rápido com a lateral do outro punho.

Um jovem esportista chamado Valéri Lubsanov se consagrou o melhor “quebra-ossos”; ele, aparentemente, compete há apenas dois anos. Durante as competições, Valéri quebrou 26 ossos da coluna vertebral.

O arqueiro mais famoso da Rússia

Em seguida, é a vez dos arqueiros lendários entrarem na arena: todos estão vestidos com longas túnicas bordadas e chapéus cônicos. No entanto, em alguns deles, tênis modernos escapam sorrateiramente de suas vestes. Eles ficam posicionados a 45 metros do alvo, tornando-se quase indistinguíveis quando vistos do outro lado da arena. Mas isso não intimida os arqueiros buriates raiz. Um deles prepara o arco e solta a flecha – e acerta o alvo! “O principal é mirar bem e deixar que o instinto domine”, explica.

Estamos falando de Baljinima Tsirempilov, um dos atletas mais notáveis da Rússia, multicampeão nacional e da Europa e ex-membro da seleção russa nas Olimpíadas de Sydney e Atenas. Algumas horas depois, Tsirempilov superou os participantes e também se tornou o vencedor do Surkharbaan.

Mais do que esporte

Jovens mulheres da Buriátia — escolhidas para essa função pela TV vários dias antes dos jogos — premiam os vencedores nas finais.

Vinte e cinco garotas de diferentes regiões da Buriátia competiram pelo direito de se tornar a primeira Danguina (beldade) de Surkharbaan.

Além de mostrar seus talentos ao público, elas falaram sobre seus locais de origem, bem como tradições e cultura. Todas as participantes receberam prêmios memoráveis; além disso, a vencedora recebeu uma coroa de prata.

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