“Ontem, participei de uma reunião de pais pelo ‘Zoom’. Parecia que eu estava assistindo a um filme. Uma mistura de Woody Allen com filme B dos anos 1990. No momento em que os créditos finais rolaram, percebi que ainda não tinha entendido nada”, escreveu no Facebook o russo Roman, um pai e jornalista. O post ganhou 8.200 curtidas de pais como ele, que também tiveram que comparecer às reuniões de pais pelo “Zoom” e saíram sem entender muita coisa.
Há um mês, os pais russos ainda não sabiam se os filhos voltariam para a escola em 2020. Em meio a conversas sobre uma segunda onda da pandemia de coronavírus, todos os planos do Ministério da Educação pareciam estar suspensos.
Mas, no dia 27 de julho, as autoridades confirmaram que as crianças voltariam às aulas normalmente em 1º de setembro e que a escola não considerava dar aulas on-line.
Rodízio nas escadas
As novas regras para que isso aconteça incluem horários de chegada diferentes para crianças de séries diversas e intervalos separados. Cada turma passará a ter apenas uma sala para todas (exceto para química e educação física). Só os professores poderão passar de uma aula para outra.
Segundo alguns pais, para evitar a aglomeração de crianças, algumas escolas introduziram até um rodízio no uso das escadas – cada sala deve utilizá-las em um horário diferente. Além disso, quando possível, será usada mais de uma entrada para receber as crianças na escola.
O curioso é que, apesar das rígidas medidas – que acabam tornando impossível a vida de pais que têm filhos em escolas diferentes, devido aos horários - não será obrigatório o uso de máscara facial nas escolas russas. Sim, você leu certo: as crianças russas poderão andar sem máscaras nas escolas.
Já os professores são obrigados a usá-las nos corredores e cantinas, mas cabe aos próprios decidir se usarão máscara na sala de aula.
Todas as outras medidas de precaução foram intensificadas nas escolas: a temperatura das crianças é medida na entrada, ocorre a limpeza obrigatória das instalações com desinfetantes durante os intervalos, há álcool para as mãos em todos os andares, a louça das cantinas é desinfetada, assim como etc.
Além disso, todos os professores e outros funcionários das escolas realizaram testes obrigatórios de covid-19. As crianças não fizeram os exames de coronavírus e os pais devem submetê-las a eles caso surjam sintomas. Tampouco se fala ainda em vacinação.
Quando possível, a primeira vacina registrada na Rússia, a “Sputnik V”, será aplicada primeiro nos professores idosos. De acordo com o Ministro da Saúde, Mikhail Murachko, as crianças, definitivamente, não serão vacinadas contra a covid-19 neste ano.
Pais apavorados
“Estamos isolando há cinco meses, e meu marido é do grupo de risco. É assustador mandar nosso filho para a escola em 1º de setembro. Estou considerando várias opções, entre elas a de deixar nosso filho em casa pelo menos durante o primeiro trimestre do ano letivo. Na pior das hipóteses, isso significaria aprendizado on-line permanente”, escreve uma mãe russa na internet.
Mas a experiência do ensino on-line no primeiro semestre foi um fracasso total: o sistema educacional russo provou estar completado despreparado para tal mudança.
A Rússia carece de um único recurso de aprendizagem remota e, assim, o Ministério da Educação simplesmente elaborou uma lista de serviços de internet recomendados e pediu às escolas que organizassem o processo de ensino sozinhas. Como consequência, o conteúdo dessas plataformas passou a receber enormes críticas, e a aprendizagem remota acabou sendo uma imitação da sala de aula no Zoom. As aulas on-line não podiam ser visualizadas posteriormente e os métodos de aprendizagem offline mostraram-se totalmente inadequados na versão on-line.
Para completar, houve interrupções constantes do serviço, brincadeiras dos alunos e a falta de equipamento técnico e acesso à internet por parte dos alunois. De acordo com dados do Rosstat (Serviço de Estatística Federal Russo) do ano de 2018 (os números mais recentes), apenas 72,4% das famílias russas têm computadores.
Com o início do ensino à distância, em alguns locais remotos e sem conexão à internet, os alunos recebiam as lições pelo correio. Assim, o Ministério chegou até mesmo a pedir às regiões com as piores taxas de infecção de covid-19 que terminassem o ano letivo mais cedo para os alunos da 1° à 8° série.
Já nas aulas presenciais, a diretiva é: se o vírus for detectado em um aluno, sua turma será enviada a uma quarentena de duas semanas - e não toda a escola.
“É uma via de duas mãos: como eles podem colocar as crianças em quarentena sem incluir os pais? E o que acontece se um professor adoece? Afinal, estamos todos em contato”, pergunta, sem achar respostas, o professor de uma escola de Moscou que não quer ser identificado.