Urso adota aeródromo na Rússia como sua casa

Estilo de vida
NIKOLAI CHEVTCHENKO
Mansur adora andar de caminhão, seus melhores amigos são pilotos e, por isso, já esteve até a bordo de um avião. Ah, e ele é um urso.

Certo dia, um filhote de urso apareceu no aeroporto de Orlovka, na região russa de Tver. Ninguém sabe exatamente como chegou ali, mas supõe-se que tenha se perdido da mãe na floresta. Apesar do perigo, sua fome o fez se aproximar de um assentamento humano. E, em vez de persegui-lo, os pilotos decidiram acolher o animal: deram-lhe comida e abrigo, antes de pensar no que fazer adiante.

O ursinho recebeu o nome Mansur, que na língua altai significa Misha – abreviação de “ursinho de pelúcia” e Mikhaíl na Rússia, já que o proprietário do aeródromo é originalmente da República de Altai). Na base aérea, o urso fez novos amigos. O mais próximo deles, porém, é o piloto Andrei Ivanov.

Salvo pela segunda vez

“Claro, não planejávamos pegar um urso de estimação. Ele apareceu do nada no campo de aviação”, lembra Andrei. “Era pequeno, do tamanho de um filhote, precisava ser alimentado com mamadeira de bebê. Era como um brinquedo. No primeiro ano, os filhotes podem ser realmente fofos.”

Ninguém sabia o que fazer com Mansur. Devolvê-lo à floresta nessa idade teria sido uma sentença de morte. Ele nem sabia que os ursos deveriam hibernar no inverno. “No primeiro inverno, tivemos que mantê-lo aquecido. Ele não fazia ideia do que acontecia no seu organismo”, conta Andrei. “Costumava adormecer no meu colo.”

Os funcionários do aeródromo decidiram então procurar ajuda especializada. O Ministério dos Recursos Naturais e Ecologia da região de Tver os colocou em contato com um especialista que deveria transportar Mansur para a Reserva Seliger. Mas, em vez da reserva, o urso foi levado para uma instalação de treinamento onde cães são ensinados a perseguir ursos. Quando Andrei e seus amigos descobriram e chegaram para resgatá-lo, Mansur literalmente pulava de alegria. “É bom termos chegado a tempo”, diz. “Felizmente, ele jamais descobriu qual destino o aguardava lá.”

O proprietário da instalação de treinamento devolveu o urso sem pestanejar.

Mansur foi levado de volta ao aeródromo porque não havia outro lugar. Os pilotos também conversaram com a família Pajetnov, conhecida por reabilitar filhotes órfãos. Mas, por estar domesticado, já era tarde demais para libertá-lo de volta à natureza.

“Quando um urso aceita uma pessoa como amigo, ele não tem mais medo dela”, explica Andrei. “Teria sido possível devolvê-lo à natureza até o final do primeiro ano, e ele teria sobrevivido perfeitamente bem, mas depois de um certo período de tempo na companhia de humanos, é impossível. Ele procurava pessoas. E se ele entrasse em uma vila, seria certamente baleado.”

Assim decidiu-se que Mansur permaneceria no aeródromo.

O único problema era que o urso estava ficando cada vez maior e já não havia mais espaço suficiente para ele em Orlovka. Um local adequado foi encontrado no imenso aeroporto de Orechkovo, na região de Kaluga, reproduzindo fielmente o ambiente habitual de florestas e aviões de Mansur.

Por meio de um site de crowdfunding (vaquinha on-line), foi possível construir um recinto ao ar livre para Mansur. Russos tocados pela história do ursinho doaram mais de 4 milhões de rublos (US$ 63.000). O resultado foi uma área grande e segura dentro de uma floresta de verdade, onde Mansur pode procurar formigas, subir em árvores e até dar um mergulho (no verão passado, ele teve que ser refrescado com mangueira).

Ursos não esquecem facilmente

Mansur rapidamente se estabeleceu em sua nova casa. Sempre há pessoas no aeródromo – guardas, pilotos, e as favoritas de Mansur, pessoas que o alimentam. Além de pai Andrei, que costuma visitá-lo com frequência.

“Ele é um urso adulto saudável. Pesa 250 kg e mede 2,5 metros de altura, bem grandinho para uma criança de três anos. E ele está sempre querendo brincar”, conta Andrei. “Mas antes de vir vê-lo, sempre tento descobrir seu humor. Se ele estiver calmo, você pode se comunicar com ele, mas não deve se impor a ele. Às vezes, ele pode exagerar ao brincar, e aí é a hora de parar.”

Os pilotos continuam se consultando com os Pajetnov e especialistas do zoológico de Moscou. O conselho geral é não usar força. Quando um urso é pequeno, uma pessoa é mais forte – mas ele se lembrará de como você o dominou e depois revidará.

“Até onde eu sei, os ursos que atacam humanos geralmente foram maltratados por pessoas”, diz Andrei. “Às vezes, encontramos balas alojadas nas patas ou na cabeça. Isso significa que eles foram baleados, muitas vezes pelas costas.”

“Uma equipe de pilotos de helicóptero da região de Magadan contou como, há alguns anos, encontraram duas pessoas em um barco – ambas feridas por um urso”, lembra Andrei. “Um morreu a bordo, o outro disse que eram caçadores furtivos que atiraram em um urso enquanto ele pescava. Eles apenas feriram o urso. Depois de algum tempo, o urso os viu novamente e os atacou. Não havia esquecido.”

Os trabalhadores do aeródromo tentam se comunicar com Mansur de igual para igual –ninguém tenta treiná-lo. “Um urso não é um animal de estimação. Ele tem suas próprias opiniões e vontades. É possível argumentar com ele, atrair seu interesse de alguma forma, como uma pessoa”, explica Andrei.

Adora aviões, mas odeia voar

Mesmo assim, a vida do urso no aeródromo é muito diferente da na floresta. Mansur, de certo modo, se interessa por tecnologia. Ainda filhote, começou a subir nas aeronaves, e os pilotos até o levaram para um passeio na cabine, mas ele ficou com medo. Os ursos são geralmente animais tímidos, embora muito curiosos.

“Quando começamos a dirigir, ele ficou assustado, ajoelhou-se, enfiou o rosto pela janela e abraçou meu pescoço com as patas. Senti então algo quente e, sim, bastante fedido. O medo realmente faz você... você entende”, diz Andrei, rindo. “Mas cinco minutos depois, de volta à terra, ele estava correndo como se nada tivesse acontecido. Decidimos não assustá-lo mais. Por outro lado, ele simplesmente adora andar de carro. Uma vez dentro, era quase impossível tirá-lo. Ao ver o caminhão, ele corria em direção ao veículo e batia na maçaneta da porta.”

Mansur nem sequer hibernou no inverno passado. “Embora os especialistas não conseguissem nos falar o motivo, eles disseram que não havia nada errado.”

Até recentemente, qualquer pessoa que quisesse conhecer Mansur poderia visitar o aeródromo – mas havia tantos visitantes que a equipe local teve que limitar a quantidade para não irritá-lo. Além disso, alguns lhe davam comida pouco saudável. “As pessoas faziam fila do lado de fora como se fosse o mausoléu [de Lênin], ou o zoológico de Moscou”, lembra Andrei. “Decidimos permitir visitas apenas se as pessoas ajudassem ao mesmo tempo, como um subbotnik [dia de limpeza de sábado]. Dessa forma, elas faziam algo útil e tinham contato com Mansur.”

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