O que significa a expressão ‘nem sempre é Maslenitsa para um gato’?

Kira Lisitskaya (Photo: fanjianhua, Rainer Elstermann/Getty Images; Legion Media)
Mais uma expressão obscura que vai te ajudar a desvendar a alma russa!

— Posso jogar mais videogame, mãe?

— Não, querido, nem sempre é Maslenitsa para um gato!

ou

— Por que não temos mais dinheiro?

— Há uma crise financeira no momento, nem sempre é Maslenitsa para um gato!

Estes são alguns exemplos de como o provérbio “Nem sempre é Maslenitsa para um gato” pode ser usado. Em essência, ele significa que todas as coisas boas eventualmente chegam ao fim... ou, para o bom brasileiro entender, “todo carnaval tem seu fim”.

Como surgiu a expressão?

“Не все коту масленица” (Ne vsio kotu Máslenitsa): é assim que a expressão soa em russo. “Nem sempre é Maslenitsa para um gato”. A Maslenitsa (ou “entrudo”) é um feriado folclórico eslavo, a semana popular de alimentação generosa antes do início da dura época da Quaresma e uma semana de panquecas que simboliza o fim do inverno e a chegada da primavera.

As pessoas comemoram esta semana em grande estilo: as festividades folclóricas duram uma semana inteira e geralmente incluem muita comida (especialmente panquecas) e bebidas.

Mas por que um gato se beneficiaria de Maslenitsa? Porque, claro, ele é bem alimentado durante esta semana e ganha muitas guloseimas e, provavelmente, muito leite. Resumindo, esta é provavelmente a melhor semana para um gato no ano inteiro.

Na verdade, o provérbio costumava ter uma segunda parte que foi esquecida. Era assim: “Nem sempre é Maslenitsa para um gato e o período da quaresma também chega!”.

Realmente, após as festividades de Maslenitsa, o rigoroso período quaresmal começava no dia seguinte e continuava por 48 dias até a Páscoa. Durante esses dias, muitos alimentos são proibidos — em primeiro lugar, qualquer produto de origem animal.

De acordo com a Igreja Ortodoxa Russa, a quaresma não é só sobre comida, mas também sobre se livrar de quaisquer pensamentos negativos (e sexualidade) para que as pessoas purifiquem mente e corpo.

Historicamente, a quaresma significava que todos os estoques de alimentos que os camponeses prepararavam no final do verão para o inverno provavelmente terminariam em fevereiro. Assim, eles precisavam diminuir a quantidade de comida que ingeriam.

No final do inverno, portanto começavam tempos difíceis para as pessoas — assim como para os gatos!

Imortalizado na literatura

A expressão foi imortalizada em uma peça de 1871 escrita por Aleksandr Ostróvski, que foi encenada em muitos teatros pela Rússia afora.  Ela contava a espirituosa história  de um rico comerciante e tirano, Ermil Zotitch Akhov, e seu ambicioso administrador, Ippolit.

Os dois queriam se casar com Agnia, uma moça modesta sem dote, filha da viúva de um comerciante. Ermil não tem dúvidas de que Agnia o escolherá e acha que está fazendo um favor ao se casar com ela. No entanto, ela o choca ao decidir se casar com Ippolit.

Ermil, então, fica bravo e grita: “Por que esses pobres não se deitam aos meus pés como antigamente?” A isso, Agnia responde: “Eis o porquê, Ermil Zotitch, como diz o provérbio russo: ‘Nem sempre é Maslenitsa para um gato’, porque a quaresma também chega!”.

O que ela quer dizer é que os bons tempos chegam ao fim e mesmo as pessoas pobres têm orgulho e nem sempre bajulam os ricos e poderosos.

Ao usar este provérbio, o povo russo está basicamente lembrando que tudo de bom termina. Dessa forma, é possível se preparar mentalmente e reagir a essa situação pensadamente e, ao mesmo tempo, lembrar que o contrário também acontece: “depois da chuva vem o arco-íris”. 

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