A expressão “Calçar uma pulga” (em russo, “подковать блоху”; transliterado, “podkovat blokhu”), significa realizar um trabalho delicado e complexo. Ela é proveniente de um conto de Nikolai Leskov escrito no final do século 19.
Nele, o mestre artesão Levcha, de Tula, calça, literalmente, uma pulguinha de aço feita por artesãos ingleses. Assim, ele pretende provar a superioridade tecnológica dos armeiros russos.
Pulga calçada. Uma pulga real com ferraduras douradas medindo 0,25 mm x 0,2 mm. Três furos foram feitos com uma broca de 0,03 mm de diâmetro. Para desenvolver a tecnologia necessária e fabricar esta miniatura, foram necessários 7 anos e meio.
Press photoO conto de Leskov é ficção, mas a Rússia moderna realmente tem um mestre artesão que calçou uma pulga e criou centenas de outras miniaturas tão minúsculas como esta. O nome dele é Anatóli Konenko e ele tem 69 anos.
Anatóli Konenko.
Press photoEntre as criações dele estão:
- um aquário de 30 mm com peixes vivos;
- uma ferradura dourada de 0,25 x 0,2 mm;
- um modelo em miniatura do baixo da banda Scorpions;
- a Torre Eiffel reduzida cem mil vezes, numa antena de mosquito, de 3,2 mm;
- uma miniatura do primeiro satélite artificial da Terra de 0,05 mm;
- um autógrafo de Iúri Gagarin, o primeiro homem a ir ao espaço, gravado em um grão de arroz;
- uma miniatura do álbum “Conquistadores do Espaço 1961-2011” etc.
Em 1981, um ano antes de se formar na Faculdade de Artes Gráficas da Universidade Estatal de Pedagogia de Omsk, Anatóli se perguntou qual era o menor retrato que se podia pintar, de modo que se pudessem reconhecer as características do rosto do retratado.
“Menina com Leque”. Miniatura da pintura de Pierre-Auguste Renoir. Aquarela sobre osso de mamute. Tamanho: 10,2 x 15,6 mm.
Press photo“Sou um artista e minha segunda formação é como inventor. Fiz muitas coisas e, no final, percebi que é na pintura em uma escala muito, muito pequena que o desconhecido se esconde do artista”, disse Konenko.
O ícone Nossa Senhora de Vladimir. A miniatura é feita em aquarela sobre um prato de presa de mamute. Tamanho: 5,0 x 7,0 mm.
Press photoPor tentativa e erro, ele reduziu o tamanho das ferramentas e materiais. Para chegar à perfeição, foram necessários cerca de 15 anos, diz.
Hoje, o processo de criação de obras complexas lhe toma cerca de um mês. Ele criou em três semanas um miniaquário que foi listado pela World Records Academy como o menor do mundo. Ele não tinha detalhes minúsculos, mas trabalhava com ovas reais e esporos de plantas, microalgas e um sistema de suprimento capilar de ar que exigia uma abordagem especial.
Aquário.
Press photo“A tarefa era ter peixes vivos ali, e o ar era fornecido de forma que saíssem pequenas bolhas de ar, o que é muito difícil de fazer na água”, explica Anatóli.
Aquário.
Press photoEle conta que movimenta seus micro escovas e cinzéis seguindo seus próprios batimentos cardíacos – pois os vasos sanguíneos pulsam nas pontas dos dedos. Assim, para um trabalho preciso, é necessário captar os momentos entre os batimentos cardíacos. “Você precisa pegar o ritmo, então o trabalho correrá bem. Às vezes, até coloco uma música para meditação”, conta.
Colar e brincos em semente de maçã. Vidro, ouro. 2,7mm.
Press photoO artista atribui significados especiais a suas miniaturas dedicadas a Omsk, onde reside atualmente. Para o aniversário de 300 anos da cidade, ele colocou um fio de cabelo no meio da letra “O” da palavra “Omsk”, com grãos de areia sobre um prato de cerâmica branca.
O artista coletou a areia na confluência dos rios locais Irtich e Om. Além disso, cada letra da palavra é feita de grãos de areia, cuja quantidade corresponde a sua posição no alfabeto.
Gafanhoto com violino. O violino tem 12 mm de comprimento.
Press photo“Esta obra está no nosso museu e muita gente vem lê-la e pensa: para que serve? Que finalidade tem? Por que é feito assim e não de outra forma? Bem, é só para chamar a atenção”, diz Anatóli.
As obras de Konenko também geram interesse no exterior. Ele já realizou exposições nos EUA, Alemanha, França, República Tcheca, Espanha, Japão e China.
Caravana de camelos no fundo de uma agulha, contrariando a citação bíblica. As estatuetas de camelos e pastores são feitas de ouro. Altura: 0,25 mm.
Press photo“As pessoas têm muito interesse. Parece que querem sentir a magia e ver como é possível trabalhar numa escala tão pequena. Elas não entendem como se pode fazer um livro de um milímetro”, diz Konenko.
Existe uma categoria especial de fãs de seus trabalhos criativos, para quem Konenko traz pessoalmente suas criações. Três vezes por mês, ele visita locais de detenção.
A fechadura e a chave na perna da formiga. O comprimento da formiga é de 2 mm, o comprimento da chave é de 0,24 mm.
Press photo“Há muitas prisões e simplesmente não tenho tempo de visitar onde fui convidado. Os presidiários são um público que aprecia essas obras, estão sempre interessados em ver aquilo que é difícil de encontrar, mesmo em museus. Eles ficam felizes porque lhes trazem, mostram e explicam isso. Pessoas normais podem ir a um museu. Essas pessoas não podem. Então eu vou até eles”, explica Anatóli.
Existem apenas 11 artistas conhecidos no mundo que conseguem criar obras desse porte. Muitos deles são miniaturistas que trabalham no espaço pós-soviético.
Konenko criou também o menor livro do mundo. A história "O sobretudo" de Nikolai Gogol medindo 30 x 32 milímetros. É uma edição completa com capa dura e ilustrações coloridas.
O preço de microminiaturas como o aquário, a pulga calçada, uma caravana de camelos, um gafanhoto com violino, atingiu os 50.000 euros — embora, atualmente, quase todos os clientes sejam da Rússia.
Konenko cria principalmente livros em miniatura com ilustrações para venda. Mas ele também está pintando obras de tamanho normal. Seu salão na Biblioteca de Omsk, em homenagem a Aleksandr Púchkin, tem estudos em aquarela com paisagens de Omsk.
O microminiaturista de Omsk Anatóli Konenko e seu valenki (bota de feltro). Tamanho: 3 mm.
Aleksêi Malgavko/SputnikKonenko explica da seguinte forma o interesse por suas obras e seus altos preços: “Em todos os momentos, o que era feito pela mão humana era muito procurado e tinha um preço bastante alto. Mestres artesãos de todo o mundo continuam a criar peças de edição limitada com técnicas tradicionais, e elas custam muito caro, porque não se pode criar algo assim de forma simplificada, numa fábrica. Eles também preservam as tradições e criam esses itens mantendo um alto padrão e, por isso, seu trabalho será sempre valorizado.”
Enfeite de árvore de Natal em miniatura.
Dmítri Feoktistov/TASSLEIA TAMBÉM: 10 obras-primas da escultura contemporânea russa em pedras preciosas (FOTOS)
O Russia Beyond está também no Telegram! Para conferir todas as novidades, siga-nos em https://t.me/russiabeyond_
Autorizamos a reprodução de todos os nossos textos sob a condição de que se publique juntamente o link ativo para o original do Russia Beyond.
Assine
a nossa newsletter!
Receba em seu e-mail as principais notícias da Rússia na newsletter: