A história da primeira encenação de Diaguilev do balé "A Bela Adormecida" na Europa

Cultura
ANNA GALAIDA
Na história da cultura mundial, Serguêi Diaguilev e seus “Ballets Russes” representam um salto para o futuro e a busca por novas ideias e formas. Diaguilev via este espetáculo de balé clássico coreografado por Marius Petipa como um experimento excepcional.

O empresário russo Serguêi Diaguilev (também grafado como Diaghilev em português) não queria que seu projeto para Paris e Londres fosse um ponto sem nó. Em 1908, ao se preparar para a primeira “Temporada Russa”, Diaguilev fez questão de incluir um balé originalmente encenado por Marius Petipa, coreógrafo clássico de São Petersburgo.

Mas as circunstâncias eram contrárias a seu desejo: em Paris, o balé russo era considerado uma arte de vanguarda que carregava consigo os mais ousados e modernos significados e formas.

Mesmo assim, Diaguilev não desistiu da ideia de apresentar o balé clássico russo ao mundo. Ele teve de esperar mais de 10 anos, quando, em 1921, por um acaso, sua companhia se viu sem coreógrafo. O momento perfeito chegara e sua escolha recaiu sobre “A Bela Adormecida”, com música de Piotr Tchaikovsky.

"Foi um dia inesquecível! Durante três horas estive em um sonho mágico, embriagado por fadas e princesas, palácios magníficos refletindo seu ouro e o fascínio dos contos de fadas... Todo o meu ser parecia ecoar esses ritmos, esse fluxo radiante e fresco de beleza e melodias já familiares…”, relembrou Leon Bakst, artista convidado para trabalhar no figurino.

Ele foi considerado coautor de “A Bela Adormecida”, um balé em três atos com prólogo e apoteose. Diaguilev apresentou uma produção verdadeiramente luxuosa, com cinco mudanças de cenário e cerca de trezentas fantasias.

Serguêi Grigoriev, diretor da trupe, lembrou que o Diaguilev ficou tão entusiasmado com o projeto que parecia ser sua primeira temporada. Porém, a produção estava destinada a ser encenada não em Paris, mas em Londres, onde Diaguilev conseguiu garantir 20.000 libras para a produção - uma quantia enorme para a época.

O destino presenteara Diaguilev. Naquele momento, o diretor do Teatro Mariínski, Nikolai Sergueiev, apareceu em Paris, sede dos “Ballets Russes”. Sergueiev tinha um conhecimento profundo do espetáculo e assumiu o trabalho de montá-lo.

Diaguilev conseguiu trazer para junto de si as principais dançarinas do Balé Imperial, Liubov Egôrova e Vera Trefílova, para o papel de princesa Aurora, além de contratar, diretamente da Rússia, Olga Spessívtseva, que se tornava uma nova estrela internacional.

Apesar de Diaguilev considerar “A Bela Adormecida” uma obra perfeita, ele decidiu introduzir uma série de inovações - números individuais de Tchaikovsky foram reorquestrados por Igor Stravinsky e coreografados por Bronislava Nijínskaia.

A estreia foi uma ocasião tumultuada, mas não foi tão triunfante quanto Diaguilev esperava. Ao longo de doze anos antes, os “Ballets Russes” haviam cultivado uma reputação como uma trupe que promovia a nova arte. Como resultado, o público de suas produções – uma elite intelectual, empresarial e artística - ficou perplexo com uma representação tão preto-no-branco do velho conto, sem qualquer ironia e cheia de "divertissement" e luxos.

Mesmo assim, “A Bela Adormecida” ficou em cartaz por três meses, com apresentações diárias e, por vezes, oito vezes por semana. O espetáculo bateu todos os recordes de público de um balé.

Porém, apesar de Diaguilev contar com uma temporada de seis meses, a londrina teria que ser maior e, para evitar punições por descumprir o contrato, ele teve que fugir de Londres, e os administradores da trupe tiveram que vender os cenários e figurinos.

Assim, os artefatos físicos da primeira produção europeia do balé clássico de Petipa foram perdidos. Mas o teste tinha dado certo: Diaguilev comprovou que a montagem original tinha um potencial atemporal.

No final das contas, a performance ficou na memória de muitos espectadores como um sonho mágico e exemplo de balé ideal, lembranças que viriam a inspirar novas produções e tendências inteiras na arte por muitas décadas.

De fato, em 2015, quando o coreógrafo Alexei Ratmansky, com o “American Ballet Theatre” em Nova York e o La Scala em Milão, tentou trazer o balé de Petipa de volta ao mundo na forma em que havia sido originalmente concebido, eles deram nova vida ao cenário de Bakst e seus figurinos - gerando assim uma nova onda de interesse pela produção de 1921.

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