Quando Akira Kurosawa levou o Extremo Oriente Russo para as telonas

Kinopoisk
Ao longo de sua ilustre carreira, Akira Kurosawa dirigiu três filmes baseados em obras de escritores russos. ‘Dersu Uzala’, uma coprodução nipo-soviética filmada no Extremo Oriente Russo, ganhou um Oscar em 1976.

Há quase 50 anos, ‘Dersu Uzala’, filme baseado na vida do explorador e escritor russo Vladimir Arseniev, ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro. O longa em russo foi uma coprodução nipo-soviética, dirigido pelo mestre do cinema internacional Akira Kurosawa.

Além de ser o primeiro filme não japonês de Kurosawa, ‘Dersu Uzala’ foi o seu primeiro e único filme rodado em 70mm. A obra-prima foi filmada nas selvas do Extremo Oriente Russo em uma época em que o acesso a esta região era estritamente proibido a estrangeiros.

Kurosawa, que esteve à frente de 30 filmes ao longo da carreira, já tinha 65 anos quando dirigiu o filme sobre a expedição topográfica de Arseniev na região de Usuri. No entanto, a literatura russa influenciou o cineasta japonês desde cedo.

“Ele cresceu lendo os clássicos de Fiódor Dostoiévski, que era seu escritor favorito”, conta Alina Leschuk, cineasta independente de Korsakov, cidade na região de Sacalina, separada da ilha japonesa de Hokkaido pelo estreito de La Perouse. “Percebe-se claramente que ele foi inspirado pela literatura russa ao assistir a alguns de seus primeiros filmes.”

Em 1950, Kurosawa dirigiu uma adaptação de “O Idiota”, de Dostoiévski. O cenário foi alterado de São Petersburgo para Hokkaido, mas o filme seguiu o enredo do livro quase à risca. “O filme foi destruído pelos críticos japoneses, mas ainda assim foi bem nas bilheterias", diz Leschuk. Muito desse sucesso pode ser atribuído ao fato de que o papel do príncipe Míchkin na versão japonesa foi interpretado pelo popular ator Setsuko Hara.

“Infelizmente, o estúdio que editou o filme cortou de quatro horas e meia para menos de três”, acrescenta Leschuk, que fala japonês fluentemente. “Vi a versão sem cortes em um festival em Sapporo e tenho certeza que impressionaria os críticos.”

Kurosawa também dirigiu uma adaptação da peça mais conhecida de Maksim Górki, ‘O Submundo’. A adaptação, intitulada no Brasil ‘Ralé’, se manteve fiel à peça, marca registrada do realismo social russo, mas o cenário do filme de 1957 mudou para o Japão do século 16.

“Ele parecia ter aprendido com os erros de ‘O Idiota’ ao fazer este filme”, ​​diz Leschuk. “Os mesmos críticos que atacaram ‘O Idiota’ ficaram cheios de elogios para ‘Ralé’”.

Filmagens no Extremo Oriente

Em 1975, Kurosawa já era considerado um dos cineastas mais influentes de sua geração. Por conta disso, o diretor obteve acesso sem precedentes ao Extremo Oriente russo, uma região zelosamente guardada pelos soviéticos.

“Eu o vi em Vladivostok em 1975 e ele estava usando seus característicos óculos escuros”, conta a acadêmica aposentada Nadejda Kuznetsova. “Era raro ver um estrangeiro na cidade na época, e ainda mais alguém tão importante.” Uma equipe grande japonesa recebeu permissão para filmar nas florestas do Território de Primorski e da região de Khabarovsk.

Os serviços secretos soviéticos ficaram sondando a equipe japonesa, que se encarregou de levar algumas imagens raras da região para as telonas.

‘Dersu Uzala’ estreou em 1975 e foi um sucesso imediato na União Soviética. Ganhou o Prêmio da Federação Internacional de Críticos de Cinema no 9º Festival Internacional de Cinema de Moscou, antes de vencer o Oscar. O longa também se tornou um sucesso comercial nos Estados Unidos e Canadá, arrecadando US$ 1,2 milhão na época.

Amizade nipo-russa

O ator russo Iúri Solomin, que interpretou o protagonista de ‘Dersu Uzala’, iniciou uma amizade especial com Kurosawa.

“Akira Kurosawa era considerado um ‘déspota arrogante e de mão pesada’, sempre de óculos escuros e que raramente sorria”, disse Solomin em uma entrevista ao Voz da Rússia. Mas garanto que foi o cineasta com mais tato com quem já trabalhei”.

Solomin, que foi diretor artístico do Teatro Mali de Moscou em 1988, também disse na entrevista que aprendeu muito sobre direção com Kurosawa.

Ele reencontrou o cineasta japonês quando o Mali excursionava pelo Japão em 1990 e sugeriu então que Kurosawa encenasse uma peça no famoso teatro de Moscou. Surgiu a ideia de fazer uma adaptação de “O Idiota”, mas os planos nunca se concretizaram.

Os filmes de Kurosawa são exibidos regularmente em festivais de cinema japoneses na Rússia, especialmente nas regiões do Extremo Oriente. O governo também continua promovendo ‘Dersu Uzala’ em festivais de cinema russos no exterior. O longa de quase cinco décadas é considerado um dos melhores exemplos de cooperação cultural russo-japonesa.

Todos os direitos reservados por Rossiyskaya Gazeta.

LEIA TAMBÉM: Por que Hitchcock não é um clássico para os russos?

Caros leitores e leitoras,

Nosso site e nossas contas nas redes sociais estão sob ameaça de restrição ou banimento, devido às atuais circunstâncias. Portanto, para acompanhar o nosso conteúdo mais recente, basta fazer o seguinte:
Inscreva-se em nosso canal no Telegram t.me/russiabeyond_br

Assine a nossa newsletter semanal

Ative as notificações push, quando solicitado(a), em nosso site

Instale um provedor de VPN em seu computador e/ou smartphone para ter acesso ao nosso site, caso esteja bloqueado em seu país.

Autorizamos a reprodução de todos os nossos textos sob a condição de que se publique juntamente o link ativo para o original do Russia Beyond.

Leia mais

Este site utiliza cookies. Clique aqui para saber mais.

Aceitar cookies