Os contos e peças de Tchékhov não são repletos de ação intensa, mas de mistério e suspense, figurando em um realismo impressionante. “Se no primeiro ato você pendurou uma pistola na parede, então no seguinte ela deve ser disparada. Caso contrário, não a coloque lá”, afirmou ele de certa monta.
Paradoxalmente, Tchékhov via muitas de suas peças como comédias — entre elas, "A Gaivota" e "O Jardim das Cerejeiras". Ele tinha um talento especial para construir detalhes cômicos e refletir sobre a vulnerabilidade da vida. O humor característico de Tchékhov é existencial por sua própria sua natureza. O escritor colocou no papel tudo o que é inexplicável, ridículo, trágico e paradoxal.
“Meu conselho: tente ser original e o mais inteligente possível em uma peça, mas não tenha medo de parecer estúpido. Pensar livremente é uma obrigação, mas para uma pessoa ser um pensador livre, ela não deve ter medo de escrever bobagens”, escreveu Tchékhov em 1889.
Muitos críticos literários e diretores de teatro consideram Tchékhov o melhor dramaturgo da história do teatro mundial. Curiosamente, quando Tchékhov visitou Lev Tolstói na Crimeia e se curvou para abraçá-lo, o autor de “Guerra e Paz” disse: “Mesmo assim, eu odeio suas peças. Shakespeare escrevia mal e você é ainda pior!”
Ele não se ofendeu com o comentário, pois era, realmente, um baita elogio. Tolstói, que geralmente era cauteloso com elogios, comparou Tchékhov ainda ao grande poeta russo Aleksandr Púchkin e ao compositor polonês Frederic Chopin. Isso porque, em muitos aspectos, os escritos de Tchékhov se assemelham a sinfonias – embora escritos em dó menor, eles se movem através da escuridão em direção à luz.
Liubóv Ranevskaia é gentil e generosa, mas também distraída e pouco prática. Chefe de uma família da alta sociedade, ela não sabe o valor do dinheiro e está falida. Depois de passar cinco anos na França, Ranevskaia retorna à Rússia, onde está prestes a perder a propriedade da família, junto com seu pomar de cerejeiras, símbolo de juventude e esperança.
Eis que um rico comerciante chamado Emelian Lopakhin, cujos pais já foram servos dos pais de Ranevskaia, torna-se o novo proprietário da bela propriedade. A transição marca o início de uma nova era.
Tchékhov escreveu esta sua última peça, em 1903, como um epílogo de sua própria vida e talvez também da literatura russa. Todos os personagens deste drama (que Tchékhov classificou como comédia, diga-se de passagem) são os arquétipos da vida russa, e “O Jardim das Cerejeiras” serve de metáfora para o destino da Rússia.
Mas as alusões de Tchékhov provocaram algumas críticas. O Prêmio Nobel russo Ivan Búnin criticou abertamente a peça, com a cândida questão: “Onde, na Rússia, Tchékhov viu enormes jardins de cerejeiras? Houve maçãs, mas não me lembro de nenhuma cerejeira.”
Com todo o respeito a Búnin, não importa se existem grandes jardins de cerejeiras na Rússia. Na peça de Tchékhov, a cerejeira representa efemeridade, a irracionalidade e a fragilidade da vida. As peças de Tchékhov evitam o convencionalismo, e “O Jardim das Cerejeiras”, ainda mais.
Olga tem 28 anos, Macha, 25 e Irina, apenas 20. Uma está permanentemente cansada, a outra está tentando se organizar e a terceira é obcecada por si mesma a ponto de se preocupar em envelhecer, se afastando da “vida real e maravilhosa” que existe em algum outro lugar.
Descendentes da aristocrática e rica família Prozoro, de Moscou, as irmãs estão fartas com a vida na pequena cidade da província para onde se mudaram há 11 anos. “Para Moscou, para Moscou, para Moscou!” Esta frase é repetida como um mantra pelas irmãs. As três pensam o tempo todo em voltar para Moscou, mas seu sonho está condenado ao fracasso.
A busca pelo sentido da vida percorre a peça de Tchékhov que se concentra em pessoas aparentemente sem importância. Meyerhold as chamou de “grupo de pessoas” unidas por um destino e humor comum. As buscas espirituais dos heróis de Tchékhov adquirem um caráter extremamente intenso e dramático em “As Três Irmãs”.
A atriz Irina Arkadina, seu filho Konstantin Treplev, o famoso escritor Boris Trigorin e Nina Zaretchnaia, que sonha em ser uma estrela de palco, estão envolvidos em um emaranhado turvo de relacionamentos cheios de drama e amor não correspondido.
Trigorin, amante de longa data de Arkadina, a deixa para ficar com Nina, mas acaba voltando para seus “antigos afetos”. Nina, por sua vez, prefere Trigorin a Treplev, mas, mesmo depois que ele a abandona, ela continua a amá-lo. O desfecho causa o suicídio de Treplev.
Cada personagem sofre com um amor não correspondido e, ainda assim, não consegue poupar os sentimentos daqueles que os amam. Tchékhov disse que há “muita conversa sobre literatura, pouca ação e cinco quilos de amor” em “A Gaivota”.
Tchékhov criou a peça, aparentemente realista, de uma maneira muito incomum para o século 19: com total desrespeito pelas “leis do drama”. “A Gaivota” marcou um ponto de viragem não apenas na obra de Tchékhov, mas também na dramaturgia mundial.
Nesta peça, detalhes insignificantes, trivialidades cotidianas e pequenas ninharias ocupam o centro do palco, atuando como elementos independentes e igualmente importantes do drama. O que acontece aos heróis, muitas vezes, ocorre nos bastidores, entre os atos, en passant. As relações entre os personagens são confusas e avassaladoras, sujeitas a constantes mudanças.
Dmitri Gurov, um mulherengo de quarenta e poucos anos, seduz Anna Sergueievna, uma jovem provinciana em férias à beira-mar em Ialta, na Crimeia. Mas o verão acabou e os dois amantes se separam para sempre, como ditam as regras do jogo.
Gurov retorna a Moscou, onde tem esposa e três filhos. Mas por algum motivo, desta vez, ele não consegue esquecer o caso extraconjugal e apagar a memória do que aconteceu. “A Dama do Cachorrinho” é a história mais lírica de Tchékhov, na qual um simples caso entre duas pessoas pode se transformar em algo maior.
Acredita-se que a atriz Olga Knipper, do Teatro de Arte de Moscou, inspirou Tchékhov a escrever a história. Tchékhov mudou-se para Ialta,uma cidade turística no litoral sul da Crimeia, para restabelecer a saúde, enquanto Olga Knipper ensaiava em Moscou.
Mas Ialta foi onde eles começaram a se apaixonar e construíram um relacionamento à distância. É esse sentimento de separação que formou a base de “A Dama do Cachorrinho”, cujas personagens também são forçadas a viver separadas.
Vladímir Nabôkov acreditava que Tchékhov tinha transgredido “todas as regras tradicionais de contar histórias” em “A Dama do Cachorrinho”, mas que essa história de amor tinha se provado “uma das maiores da literatura mundial”.
Ivan Gromov é um ex-oficial de justiça que sofre de mania de perseguição e está confinado em um antigo hospital psiquiátrico em algum lugar da Rússia. Há quatro outras pessoas com ele na enfermaria número 6, todas abandonadas emocionalmente, negligenciadas e abusadas.
Andrei Raguin administra o precário hospital há vinte anos. Ele era um médico talentoso, mas acabou se desiludindo com o trabalho e quase deixou de ir ao hospital, localizado em uma cidade cheia de gente de mente estreita.
Um dia, Raguin vai ver a enfermaria número 6 e faz amizade com Gromov, em quem ele descobre um homem incrivelmente interessante para conversar. Rogov agora visita Gromov todos os dias e logo se espalha pelo hospital o boato de que o médico enlouqueceu.
“Enfermaria número 6” é uma das histórias mais comoventes da literatura russa, em que Tchékhov (que era médico por formação e clinicava ao mesmo tempo em que escrevia) trata de insanidade, solidão, sofrimento, desespero e injustiça: em outras palavras, todas as doenças fatais de qualquer sociedade.
Escrita em 1892, a obra é uma alegoria puramente simbolista e consolidou a posição de Tchékhov como mestre dos contos.
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