Produtora criativa de um dos primeiros espetáculos de teatro imersivo da Rússia, “As aparições”, Anastasia Timofeeva fala ao Russia Beyond sobre sua experiência em levar o novo formato ao país.
Qual é a base principal do teatro imersivo?
O teatro imersivo é definido não pelo conteúdo do espetáculo, mas pelo papel do público ao experimentá-lo. O público passa a ser não apenas espectador passivo, mas participante ativo nas histórias apresentadas em todos seus entornos.
Assim, uma grande parte de sua experiência gira em torno de sua própria bagagem e capacidade emocional para chegar com a mente aberta e deixar de lado as expectativas.
Sensações, emoções e curiosidade podem revelar muito sobre você. Não só porque a história está se desenrolando ao seu redor, mas também porque você tem a liberdade de escolher o que ela é para você, de uma perspectiva pessoal.
Assim, podemos começar a observar a si mesmos e nossas próprias vidas por meio deste prisma teatral, aprendendo a confiar em nossos verdadeiros instintos.
O teatro imersivo nos dá a oportunidade de redescobrir os impulsos que realmente desejamos, mesmo os de infância. É um tipo de liberdade e de aventura que a pessoa acha que nunca mais sentiria.
A imersão como método de apresentação nasceu nos tempos do genocídio no Camboja (no final da década de 1970). Não há documentos ou provas disso - todas as gravações foram destruídas. As pessoas decidiram recriar os eventos de uma forma artística, já que queriam reconstituir os eventos e revivê-los uma vez mais.
A empresa [britânica] de teatro Punchdrunk Theatre foi a primeira a realizar espetáculos imersivos como gênero, já que fazia os projetos mais bem-sucedidos comercialmente e populares.
Como você treina os atores? Para eles, é mais difícil estar bem preparado ou improvisar?
Usamos um método de treinamento de apresentação que foi criado e desenvolvido nos Estados Unidos para desenvolve as habilidades dos atores para trabalhar em conjunto, para apagar seus egos e abrir suas mentes para o inesperado.
Ensinamos nossos atores a achar histórias no dia a dia de suas vidas. Desafiamos nossos atores a se sentirem desconfortáveis. Por exemplo, a se deitarem no chão em um lugar lotado para sentirem a liberdade de se tornarem algo inesperado na normalidade coletiva da vida cotidiana.
Como o público reage aos atores?
É possível listar historinhas demais que são engraçadas ou inspiradoras entre os membros da plateia, mas, para mim, é a sensação de camaradagem silenciosa - os olhares sutis, o contato visual e a proximidade física. Durante o show, o público se preocupa menos com seu espaço pessoal.
É como se você flutuasse ao se colocar em um espaço fechado por várias horas para encontrar um diálogo interior e levar o corpo físico à paz e ao relaxamento. Acredito o gênero tenha se tornado tão popular na Rússia porque geralmente as pessoas aqui são muito tensas e bloqueiam as emoções.
Desejamos que nosso público se abra para nós e confie em nós só um pouco, mas, mais importante, que confie em si próprio. Isso os ajudará a se concentrar em suas emoções reprimidas. O teatro imersivo é, na verdade, sobre descobrir seus sentimentos, verdadeiros e sem preconceitos.
Quais são as dificuldades com o marketing de um espetáculo imersivo na Rússia?
Fazer o marketing do teatro imersivo é difícil, independentemente do país. Isto porque temos que atrair o público para um mundo movido pela emoção e pelo clima, sem entregar muito. É um desafio explicar o mistério.
Os russos reagem a performances imersivas de forma diferente?
O espectador russo tem um tipo de pensamento muito inteligente e analítico. Ao mesmo tempo, um espectador local pode dizer: "Eu paguei e quero de ver a apresentação inteira e não perder nada".
Isto leva alguns dos russos que iniciam a experiência neste gênero a se sentirem frustrados após o espetáculo. Você tem liberdade de ação, por isso é responsável pelo conteúdo que vê e pelo entretenimento que recebe.
Desde a infância, nós, russos, temos a cultura de ser os “espectadores passivos” sendo entretidos. É uma forma de consumismo artístico. Mas, no teatro imersivo, o espectador é nosso parceiro.
Há muitos aspectos psicológicos no comportamento de uma pessoa enquanto ela assiste a um espetáculo imersivo; o espectador reage a um certo personagem conscientemente, não por acaso.
Sua percepção de um espetáculo imersivo é tratada da mesma maneira com que você vê a vida: ou você presta atenção para saber o que está acontecendo o tempo todo, ou simplesmente relaxa e segue o fluxo.
Outra especialidade do público russo é que ele nunca segue as regras. Então as pessoas sempre tentam se juntar com seus amigos (normalmente o público é dividido em vários grupos e cada um inicia o espetáculo em um horário diferente).
Assim, as pessoas poderiam dizer a um ator: "Tome 200 rublos e nos deixe entrar ao mesmo tempo". Mas é muito importante receber diferentes experiências diferentes no espectáculo e poder compartilhá-las com seus amigos para juntar as peças deste quebra-cabeça, para se comunicar, para entender o que aconteceu durante o show, combinando suas impressões. Não é nem mesmo um show, não é uma performance, é um estilo de vida.
Anastasia Timofeeva viveu em Nova York por dez anos, trabalhando com documentários e projetos de relações públicas. Depois de visitar um espetáculo imersivo local “off-Broadway” chamado The Alving Estate, ela se sentiu tão inspirada que decidiu levar o formato para a Rússia.
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