Poço Superprofundo de Kola, a misteriosa porta de entrada para o inferno cavada na URSS

Ciência e Tecnologia
GUEÓRGUI MANÁEV
Buraco mais profundo do planeta foi criado como parte de um ambicioso projeto para estudar as camadas mais profundas da Terra. A 12 quilômetros do solo, estudiosos teriam registrado sons semelhantes aos gritos de “almas em dor”.

É conhecido como "poço do inferno", um buraco misterioso de 12.226 metros de profundidade e 23 centímetros de largura; tão grande que merece o título de "o poço mais profundo do mundo". Estamos falando do Poço Superprofundo de Kola, criado no final dos anos 1970.

Este assunto, assim como costuma acontecer com outros fenômenos únicos e raros, está envolto em lendas e mistérios. Diz-se, por exemplo, que quando a broca atingiu os 12 km de profundidade, os pesquisadores identificaram uma cavidade com temperaturas acima de 1.000°C e lá puderam gravar sons semelhantes a “gritos de almas em dor”. A broca, disseram a si mesmos, teria chegado às “entranhas do inferno”.

Mas há muitos detalhes que não combinam com toda essa história: em primeiro lugar, não há microfones capazes de suportar temperaturas de 1.000°C; além disso, quando a broca atingisse 12.261 metros, o termômetro mostraria 200°C a essa profundidade, e não 1.000°C.

Ainda assim, o chefe da operação David Guberman admitiu que, durante as escavações em 1995, aconteceu, sim, uma coisa muito estranha.

As razões para perfurar

O poço está localizado no norte do país, na região de Murmansk, mais precisamente na península de Kola, de onde recebeu o nome. Foi escavado como parte de um projeto colossal executado pela URSS, que previa a construção de poços profundos. 

Ao contrário de outros poços cavados para identificar campos de gás ou petróleo, o de Kola foi construído para fins puramente científicos, para estudar a composição interna da Terra.

O local foi meticulosamente escolhido e a perfuração transcorreu, com algumas pausas, de 1978 a 1992. A península de Kola está localizada na parte superior do escudo Báltico, uma gigantesca base rochosa composta de granito e minerais, originada há cerca de 3 bilhões de anos. É uma das camadas mais antigas da Terra; por isso a importância de estudá-la.

Nas entranhas da Terra

Nos primeiros quatro anos de escavações, atingiu-se uma profundidade de 7 km. Em seguida, uma broca adicional foi acionada - mais uma máquina de 200 toneladas. Como esse equipamento precisava circunavegar um leito rochoso mais duro, os especialistas foram obrigados a endireitá-lo várias vezes, razão pela qual o poço era curvo em alguns trechos.

Em 1983 o furo atingiu a profundidade de 12 km, mas as obras foram interrompidas no ano seguinte devido a problemas no poço principal de perfuração. Os operários foram, contanto, obrigados a reiniciar a perfuração de 7.000 metros.

Em 1990 chegou-se a 12.262 metros de profundidade, mas a broca quebrou novamente - e pela última vez. As escavações cessaram, mas o poço de Kola também entrou para a história como o buraco mais profundo do mundo.

Cinco anos após o término da perfuração, houve uma explosão dentro do poço de causas desconhecidas. Nem mesmo David Guberman conseguiu descobrir o que havia acontecido.

Os estudos do poço de Kola derrubaram as crenças anteriores sobre a composição da crosta terrestre e contribuíram significativamente para o estudo da "descontinuidade de Mohorovičić", a fronteira entre a crosta e o manto terrestre. Mas fato é que as análises realizadas no poço de Kola, em vez de chegarem a novas respostas, nada mais fizeram do que levantar novas perguntas. A descoberta mais óbvia foi que a 4 quilômetros do solo a temperatura começa a aumentar drasticamente, chegando a 220°C a 12 km de profundidade.

Atualmente, o local do Poço Superprofundo de Kola está em estado de abandono. O buraco foi lacrado com uma tampa de metal de 12 parafusos, e a base científica foi oficialmente fechada em 2008.

LEIA TAMBÉM: Do homem que encontrou água em Marte à dupla que descobriu grafeno, conheça os gênios russos de hoje