Arranha-céu da Kotelnicheskaya, o refúgio da elite soviética construído por prisioneiros (FOTOS)

Legion Media
Havia rumores de que este famoso prédio tinha seu próprio Gulag. Mas, depois de abrigar a elite da Tcheka, quem mora ali hoje?

Endereço: Marginal Kotelnicheskaya naberezhnaya 1/15.

Estações de metrô mais próximas: Taganskaya, Kitay-gorod

Anos de construção: 1937-1952

O que ele tem: apartamentos, lojas, restaurantes, um banco, companhias de prestação de serviços e cinema.

Após a vitória da URSS na Segunda Guerra Mundial, o país iniciou um programa stalinista para a reconstrução de Moscou que transformaria a cidade em uma “capital exemplar”.

Um conjunto de arranha-céus apelidados de “Sete Irmãs” personificava a grandeza e triunfo do projeto, e um desses famosos edifícios stalinistas, a apenas 900 metros do Kremlin, foi construído inicialmente como um edifício residencial. No entanto, ele nunca foi apenas residencial.

Como ele surgiu

O arranha-céu da Kotelnicheskaya foi fundado em um local que antes abrigava armazéns de farinha — anteriormente, tradicionalmente, havia muitos moinhos de vento na confluência dos rios Moskva e Iauza. Quatro travessas também foram demolidas para dar lugar ao prédio.

1946.

A escolha do bairro não foi coincidência. Na época, este passeio, assim como parte da Ilha Baltchug que ficava do outro lado do rio, estava em pleno vapor com a construção de edifícios pomposos no estilo do “Império Stalinista”.

Inicialmente, de acordo com o plano geral de Stálin, Moscou deveria ter oito arranha-céus: o de Zariadie, que devia ser o oitavo, não foi finalizado.

O arranha-céu da Kotelnicheskaya foi proejtado pelos arquitetos Dmítri Tchetchúlin e Andrêi Rostkõvski – ambos ganhadores do Prêmio Stálin.

Construção.

Assim como na construção do prédio principal da Universidade Estatal de Moscou (que também faz parte do conjunto arquitetônico das “Sete Irmãs”), havia prisioneiros do Gulag trabalhando compulsoriamente para erguer este arranha-céu.

Até 1953, havia um campo de prisioneiros bem no canteiro de obras — para não deixar nenhum deles escapar, todo o território foi envolvido por uma cerca de três metros de altura com cinco linhas de arame farpado e uma zona de alerta de meio metro, e ninguém tinha permissão para entrar nessa área.

Até meados de 1951, prisioneiros de guerra e presos comuns também participaram da construção. Eles eram chamados de “contingente especial”.

O fato de o prédio ter sido construído por prisioneiros era bem conhecido por todos os seus habitantes. Então, hoje, uma das histórias mais populares dos moradores veteranos é: “Quando você martela um prego na parede ou faz um buraco com a furadeira, não se assuste se acertar um esqueleto. Os prisioneiros que construíram este prédio emparedaram um capataz que eles odiavam...”

Por que ele é como é

Os arquitetos afirmam que o estilo arquitetônico moscovita do final do século 17 – como o que regeu o projeto da Igreja da Intercessão em Fili – serviu de referência para este edifício.

Igreja da Intercessão  em Fili.

O edifício central tem 32 andares; com a torre, são 176 metros de altura. Anteriormente, o edifício tinha 540 apartamentos, mas hoje tem cerca de 700.

Devido à sua composição estreita no topo, muitos apartamentos na parte superior do edifício são diminutos e têm uma divisão interna estranha — mas isso não incomodava seus habitantes, já que só de viver ali o status social de qualquer um dava um salto.

Vista do arranha-céu.

A escada central lembra a de um palácio luxuoso: uma grande escadaria de mármore com colunas, baixos-relevos de porcelana cor de marfim, paredes revestidas de granito, esculturas, lustres de cristal empilhados. O pátio do edifício tem uma garagem subterrânea e a laje dessa garagem já abrigou quadras de tênis.

A ideia era que, se quisessem, os habitantes do edifício não precisavam sair para lugar algum. O edifício foi construído aos moldes dos edifícios comuns soviéticos, ou seja, como um complexo social e doméstico – com o primeiro andar reservado para comércio e funções domésticas (o que era uma novidade absoluta para a época).

O prédio contava com mercearias, correio, cafés, salão de beleza, lavanderia, estúdio de arte, e escola de xadrez e cinema, onde eram exibidos filmes do “Gosfilmofond” – o maior acervo cinematográfico do país.

O prédio também abrigava o lendário estúdio de costura que cosia uniformes e roupas civis - os marechais Jukov, Budiônni e Konev faziam seus uniformes ali. Curiosamente, os candelabros do estúdio de costura foram usados nas filmagens de “Guerra e Paz”, adaptação de Tolstói pelo diretor Fiódor Bondartchuk.

Coisas que tornaram o edifício notável

O arranha-céu da Kotelnicheskaya é um dos principais símbolos de Moscou. Ele apareceu em filmes e séries de TV icônicos – desde “Moscou não acredita em lágrimas” (1979) a “Brat 2” (2000) e “Hardcore: Missão Extrema” (2015). Mas havia mais artistas morando nele do que os registrados em filmes.

Inicialmente, o prédio foi habitado por funcionários do NKVD e do MVD. A construção teve curadoria de Lavrênti Béria, o aliado mais próximo de Stálin, e os dois decidiram dar os apartamentos "só para os aliados".

Físicos nucleares também entraram nessa lista – os que tinham trabalhado com Béria e pesquisado armas nucleares. Para destacar ainda mais o status de elite do edifício, a intelectualidade criativa também se estabeleceu lá.

Em momentos diferentes, o poeta Evguêni Evtuchenko, as atrizes Faina Ranévskaia e Nonna Mordiukova, a bailarina Galina Ulanova, os atores Aleksandr Chirvindt e Mikhail Jarov, os escritores Konstantin Paustovski e Vassíli Aksiônov, além de outros artistas, moraram no prédio.

E, embora tenha caído em desgraça após a morte de Stálin, o arquiteto Tchetchúlin, como criador do edifício também recebeu as cobiçadas chaves de um apartamento ali.

Os apartamentos do arranha-céu eram alugados em regime “chave na mão”, totalmente mobiliados (e de forma muito luxuosa): tinham parquet caro, gesso no teto, lustres de cristal, luminárias de bronze, encanamentos importados e móveis modernos.

Os cidadãos comuns soviéticos teriam que economizar toda a vida só para comprar um lustre de cristal daqueles apartamentos.

Os moradores, porém, eram proibidos de trocar os móveis de lugar em seus próprios apartamentos — isso sem falar em qualquer reforma, e os porteiros estavam de olho e realizavam verificações regulares.

Isso acontecia porque o “prédio dos tchekistas [os funcionários da Tcheka]” estava grampeado com microfones por todo lado e, ao mexer um armário ou escrivaninha, um morador podia quebrar acidentalmente alguns fios.

Quem vive ali hoje

Hoje, o arranha-céu da Kotelnicheskaya não é um local tão pomposo. Quem vive lá são, principalmente, os descendentes daqueles que receberam os apartamentos nos tempos soviéticos — muitos deles, já idosos. Outros apartamentos do prédio estão sendo vendidos e alugados ativamente.

O preço médio atual de um apartamento de dois cômodos ali é de cerca de 50 milhões de rublos (aproximadamente US$ 617 mil). Também é possível alugar esse mesmo tipo de apartamento no prédio por algo entre 100 e 170 mil rublos (de US$ 1.250 a US$ 2.100) por mês. Os jovens costumam dividir esses apartamentos com coinquilinos.

Não resta muito da antiga glória deste arranha-céu. No foyer central, restou um teto de mosaico e o forro de mármore. No entanto, o mobiliário original dos apartamentos não sobreviveu (embora alguns elementos, como um candelabro original ou um espelho ainda existam em algumas unidades).

Além disso, muitas instalações estão obsoletas, o que gera transtornos constantes para os moradores. Tudo o que se passa nos apartamentos vizinhos é claramente audível, devido à ventilação antiga e aos pisos e tetos de madeira.

Vista do edifício em 1974.

“Algo queima ou quebra o tempo todo no apartamento – dois meses depois de me mudar para cá, percebi que o prédio foi criado para ser bonito, e não habitável. Sim, fica no centro da cidade, mas ainda é longe da estação de metrô mais próxima. E é preciso pelo menos 20 minutos para dar a volta no prédio”, diz a locatária de um apartamento ali, Ksenia Vetchtomova.

Como entrar

Antes, era possível entrar no prédio comprando um ingresso para ver o apartamento-museu da bailarina Galina Ulanova. Mas ele já está fechado para reconstrução há vários anos.

A única maneira de ingressar, portanto, é comprando um ingresso na agência “Krichi i viche” (“Telhados e acima”), que lhe dará um passeio pela escadaria por 2.000 rublos e lhe oferecerá chá em um apartamento com vista panorâmica.

Para quem quiser visitar o interior do lendário edifício, pelo menos formalmente, há um caminho seguro – visitando o cinema “Illiusion”, o mais antigo de Moscou. Ele fica no primeiro andar do arranha-céu e é o mesmo que exibia filmes dos arquivos do Gosfilmofond (eles ainda fazem isso, aliás).

Cinema

Recentemente, o cinema passou por reformas e hoje tem salas modernas e uma programação diferenciada.

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