Doutora Liza: "Não estou do lado de ninguém. Estou do lado das crianças fracas e doentes".
Serguêi Savostianov/TASS
Quando o presidente Vladímir Pútin condecorou uma das principais filantropas do país, a doutora Elizaveta Glinka, com um dos mais altos prêmios estatais no campo dos direitos humanos, seu discurso de agradecimento era pouco animador.
"Amanhã voarei para Donetsk, e de lá para a Síria", disse a doutora Liza, acrescentando que a guerra era "o inferno na Terra: nunca sabemos se voltaremos vivos".
Mas, infelizmente, a aeronave Tu-154 levando a médica a Latakia, na Síria, com remédios que seriam entregues a um hospital universitário, caiu no Mar Negro no último domingo de Natal. Não houve sobreviventes.
A história da doutora
A morte de Glinka criou uma onda de indignação na mídia e na sociedade russa: ativistas de filantropia, colegas e conhecidos da doutora Liza escreviam mensagens de pêsames e profundo respeito pela médica.
"Ela era um milagre, uma mensagem divina sobre a virtude", escreveu o chefe do Conselho Russo de Direitos Humanos.
A filantropa já foi chamada de "santa" e comparada à "Madre Teresa" por pessoas no país todo, desde funcionários do governo até críticos ferrenhos das autoridades.
Formada em medicina e especializada em emergências, Elizaveta Glinka mudou-se com seu marido para os EUA nos anos 1980. Lá, ela começou a trabalhar em hospitais residenciais.
Então, o sistema de tratamento de doentes terminais na União Soviética apenas começava a ser implementado. Retornando dos EUA, a médica participou do trabalho de hospitais residenciais em Moscou e fundou o primeiro deles em Kiev.
"Todos deveriam ter garantido o direito de uma morte digna, a seu tempo e sem dor", dizia ela.
Em 2007, Glinka fundou a organização de caridade "Ajuda Justa", que ainda funciona no auxílio de pacientes terminais, idosos solitários, deficientes e moradores de rua.
Todas as quartas-feiras, os funcionários da organização visitam as estações de trem de Moscou e proveem com ajuda médica e alimentação os moradores de rua.
Tempos de guerra
Glinka e sua fundação realmente tentavam ajudar a todos. Em 2010, eles coletaram ajuda para vítimas dos incêndios florestais de 2012 e para os sobreviventes das enchentes de Krimsk. Quando a guerra estourou em 2014 no leste ucraniano, Glinka também teve participação no auxílio das vítimas.
A doutora Liza viajou mais de 20 vezes para os locais sob bombardeio, arriscando a própria vida para salvar crianças que estavam em hospitais em meio às hostilidades para evacuá-las.
Ao mesmo tempo, Glinka enfatizava sua rejeição a quaisquer políticos. "Não estou do lado de ninguém. Estou do lado das crianças fracas e doentes, que, por algum motivo, foram deixadas sem assistência", disse a doutora em entrevistas à rádio Kommersant FM.
Ela também dizia que gostaria de colocar todos o políticos que começaram a guerra na UTI para onde eram levadas as crianças de Donetsk para lhes mostrar o que fizeram.
Comprometimento com a causa
A doutora Liza não fazia diferença entre os pacientes nos hospitais, fossem moradores de rua, as crianças de Donbass ou da Síria: ela queria ajudar todos, tentando manter tudo sob controle pessoalmente.
"Como uma médica de sucesso, uma esposa amada e carinhosa, a mãe feliz de três filhos, ela não precisava viajar à Síria uma semana antes do Ano Novo", diz a jornalista Ekaterina Gordeeva, sua amiga pessoal.
Mas, para Glinka, era importante estar "onde as pessoas estivessem sofrendo mais, onde ninguém pudesse ajudar". É por isso que na manhã de 25 de dezembro ela estava à bordo do Tu-154 que rumava à Síria.
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