Certeza com que russos acreditam que as relações com a Ucrânia vão melhorar em um futuro próximo é descrita por socióloga como “intrigante” Foto: Getty Images / Fotobank
A socióloga Larissa Pautova, diretora de projetos da Fundação Opinião Pública (FOM, na sigla em russo), começou a estudar as percepções de estabilidade na Rússia e na Ucrânia ainda em 2006. Ao mesmo tempo em que o estilo de vida parecia semelhante, os problemas em cada um dos países foram gerando mudanças entre eles.
Na época, a persistência das dificuldades econômicas na Ucrânia estava fazendo com que a população local se tornasse extremamente insatisfeita com sua própria situação financeira. Na Rússia, porém, o temor pela própria vida havia passado para o primeiro plano em função da ameaça terrorista e da situação no Cáucaso.
Isso explica porque os entrevistados dos dois países possuíam diferentes percepções no que se refere à estabilidade: enquanto os russos estavam convencidos de que a estabilidade iria surgir no país a qualquer momento, os ucranianos afirmavam que eles já tinham a “estabilidade da pobreza”, mas isso não era o que eles buscavam.
“Como resultado, descobrimos que a relação com a estabilidade é estritamente contextual: em um caso ela foi percebida como algo bom, e no outro, como estagnação”, diz Pautova.
Segundo a socióloga, a diferença nas atitudes dos russos e dos ucranianos pode ser explicada pelas condições em que as populações de ambos os países viveram após a queda da União Soviética, mas também por outras características culturais.
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Na Ucrânia, as relações de parentesco geralmente possuem grande importância, o que explica, em partes, a grande população rural e precária situação econômica. Já na Rússia, as ligações horizontais entre as pessoas muitas vezes são reprimidas pela longa tradição burocrática imperial. “A pessoa conta mais com o poder da máquina do Estado, do que com os recursos de sua comunidade local”, sugere Pautova.
“Nós falamos em adesão da Crimeia, e os ucranianos, em anexação. E essas diferentes maneiras de formular a questão estão inseridas nas enquetes dos sociólogos”, diz a especialista. “Seria preciso ter uma longa conversa com o entrevistado para compreender que parte dessas noções corresponde à experiência pessoal dele e que parte lhe foi imposta. E isso é impossível no âmbito de uma enquete sociológica padrão.”
A certeza com que os russos acreditam que as relações com a Ucrânia vão melhorar em um futuro próximo é descrita pela socióloga como “intrigante”. Mesmo porque, a julgar pelas enquetes análogas no país vizinho, os ucranianos parecem muito menos otimistas.
Denominador comum
"Quando você olha apenas para si mesmo, pode ter uma impressão distorcida. É necessário compreender o contexto da realidade na qual estão inseridos os nossos entrevistados e os entrevistados de outros países”, diz Pautova. “Recorremos a parceiros ucranianos e tentamos comparar dados representativos de pesquisas de opinião realizadas na Ucrânia e na Rússia.”
Segundo a socióloga, a quantidade insuficiente de pesquisas de boa qualidade foi um empecilho na condução do estudo da FOM. Também a forma diferente como as perguntas são formuladas na Rússia e na Ucrânia dificultou, em alguns casos, a busca por um denominador comum. “Mas ainda hoje são evidentes alguns pontos de intersecção, afinal de contas, a sociologia russa e a ucraniana possuem uma origem comum – as escolas de Boris Gruchin e Iúri Levada”, explicou Pautova.
O maior desafio, contudo, foi lidar com as inconsistências nas pesquisas de opinião, garante a diretora de projetos da FOM. “Às vezes, até as respostas encontradas em um mesmo questionário são contraditórias”, diz. “A consciência social tanto na Rússia quanto na Ucrânia encontra-se em um estado de turbulência. A presença de paradoxos na percepção das pessoas é típica de períodos instáveis.”
Publicado originalmente pela Ogoniok
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