Mais de 96% dos eleitores da Crimeia votaram a favor da adesão à Rússia Foto: RIA Nóvosti
Iúlia, 30 anos, cabeleireira em licença-maternidade
Não fui ao referendo, porque não tinha com quem deixar a criança. Se não fosse isso, adoraria ter ido. Nós, é claro, somos a favor da Rússia, mas temos um número muito grande de parentes na Ucrânia, e isso nos detinha. Mas eles nos apoiaram. Pena que agora eles não podem vir aqui.
A única coisa que me deixou indignada antes do referendo foi a proibição da língua russa. A minha avó não conhecia a língua ucraniana e não conseguia preencher os formulários da aposentadoria, teve que contratar um tradutor. Quando ia comprar remédios, não entendia o que estava escrito neles. Eu estudei ucraniano na escola e posso falar ucraniano, mas meus pais não dominam esse idioma.
Alena, 45 anos, enfermeira
No referendo, votei a favor da adesão à Rússia. Há muito tempo que a Crimeia queria tornar-se russa, e isso era discutido tanto no ambiente de trabalho, como em casa, na cozinha. A Rússia começou a se reerguer, enquanto que, na Ucrânia, não param de acontecer revoluções e mudanças de poder.
Em primeiro lugar, esperamos estabilidade. Antes de começar as manifestações na Maidan, a situação na Crimeia também era razoável. Nikolai Azarov [primeiro-ministro da Ucrânia entre 2010 e 2014] havia prometido aumentar os salários em outubro, todos viviam com essa esperança. Mas agora o poder em Kiev mudou e não se pode contar com isso.
Com certeza não devemos aderir à UE. A minha sogra mora em Riga, e meu tio, na Estônia. Os países Bálticos empobreceram assim que entraram na União Europeia, não há emprego. Trabalham um turno e meio, mas são remunerados por um. Comem sabe-se lá que tipo de alimentos. Quando eles vieram nos visitar, simplesmente temperamos uma galinha com um pouco de sal e pimenta, e para eles isso era uma deliciosa iguaria.
Pável, 28 anos, advogado
Votei a favor do governo atual. A lei é dura, porém é a lei. Na qualidade de jurista, não tenho o direito de contestá-la. No íntimo, como pessoa, posso discordar dela, mas ela existe.
Agora os advogados têm diante de si um trabalho colossal. Muitas questões estão sendo levantadas por pessoas físicas e jurídicas, até mesmo estruturas do governo não sabem como proceder. Quando eu estava estudando na universidade, tivemos uma palestra sobre “análise linguística comparativa do quadro jurídico da Federação Russa e da Ucrânia”. Foi muito engraçado: nos deparamos com artigos idênticos, a ponto de conterem os mesmos erros gramaticais.
Eu sei que, na Rússia, a parcela de vereditos de absolvição é menor do que 1%, mas, no espaço pós-soviético, é assim em toda parte. Se a pessoa já foi parar no tribunal, os juízes não estão prontos para admitir um erro do sistema. Agora, na Crimeia, os tribunais estão parados. É claro que eles estão trabalhando, mas como um carro que vai a lugar nenhum.
Natalia, 26 anos, autora de livros infantis
A Ucrânia é ruim, a Rússia também é ruim, mas dos males é o menor. Quero estabilidade, que tudo fique tranquilo e sem guerra. Não conto com mudanças muito significativas. Por que deveríamos ficar em melhores condições do que o resto da Rússia? Vai ser como em todos os outros lugares. Em todo caso, certamente não iremos embora da Crimeia. Os parentes da Ucrânia estão dizendo para irmos lá: “Se vocês estão com medo, venham”. Mas quando se tem moradia e família, não dá para largar tudo e sair por aí. Sou professora de ucraniano e literatura, mas também tenho formação de jurista. Não sei o que me espera no futuro. Será que advogados e linguistas ucranianos serão necessários à Rússia?
Vladímir Pavlovitch, 80 anos, aposentado
Eu fui ao referendo, sem dúvida! É claro que votei a favor da Rússia. Mudei para cá em 1964. Em teoria, sou ucraniano. Mas não estou magoado por mudar de cidadania. O que há para se arrepender? É preciso fazer o que todo mundo está fazendo. Esperamos que seja para melhor. Anteontem recebi a aposentadoria em rublos pela primeira vez, ontem comi um churrasco com ela. Trocar grívnias por rublos não é problema. Já trocamos tantas vezes!
Tenho oito irmãos e irmãs na Ucrânia. Quando os nossos pais estavam vivos, nos encontrávamos todos os anos, eu viajava para visitá-los. E agora nos comunicamos por telefone. Eles não acreditam em mim, dizem que nós não temos alimentos, que em breve ficaremos sem água e que a luz será desligada. E eu digo para eles: aqui está tudo ótimo!
Andrêi, 48 anos, avaliador de imóveis
Sou um oficial russo na reserva, portanto, não é a primeira vez que recebo esse passaporte. A transição é um processo economicamente complicado, e não está claro o que é mais vantajoso. Na Ucrânia, existia a esperança de adesão à União Europeia, e da Rússia espera-se a estabilidade. Mas na Rússia as pessoas também não levam uma vida tão boa financeiramente. Seria bom se a Crimeia fosse transformada em zona econômica livre integrada à Rússia.
Por enquanto, eu não tenho absolutamente nenhum trabalho, e ainda paira a ameaça de elevados gastos com requalificação. É preciso obter o diploma russo, certificados e se associar a sindicatos, mas tudo isso exige dinheiro. Se durante o período de transição fosse permitido trabalhar utilizando as antigas licenças e certificados, seria mais fácil.
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