A complexidade do território russo

A atual divisão administrativa e territorial da Rússia se estabilizou em 1993, com a aprovação da nova Constituição Foto: Andrêi Mindriukov

A atual divisão administrativa e territorial da Rússia se estabilizou em 1993, com a aprovação da nova Constituição Foto: Andrêi Mindriukov

Há unidades federativas, territórios, repúblicas e distritos federais. Formalmente, perante a Constituição, eles têm direitos iguais. Na realidade, se diferenciam muito.

A Rússia possui um complexo sistema de divisões e subdivisões. Há unidades federativas, territórios, repúblicas e distritos federais. Formalmente, perante a Constituição, eles têm direitos iguais. Na realidade, se diferenciam muito. Os especialistas afirmam que o sistema tão complicado é uma herança ainda dos tempos do Império Russo e da URSS.

No final do século 17, no império de Pedro, o Grande, foi decretada a divisão em províncias; naquela altura, eram apenas oito. Com o passar do tempo, a quantidade de províncias aumentou e foram anexadas terras novas. No início do século 20, o sistema se complicou: além das províncias, surgiram regiões e territórios subordinados.

No período soviético, o princípio divisório essencial era o nacional. Repúblicas autônomas socialistas soviéticas (RASS), regiões autônomas (RA) e distritos nacionais (DN; mais tarde, autônomos) fizeram parte do país. As primeiras RASS eram formadas, na maioria das vezes, por províncias, com prevalência de população nacional; posteriormente, os respectivos DN se transformavam em RASS.

Após o desmoronamento da URSS, antigas autonomias, regiões e territórios, que antes faziam parte da República Socialista Federativa Soviética da Rússia (RSFSR), passaram a se chamar de subdivisões federativas. A própria RSFSR foi denominada de Federação da Rússia (FR), enquanto as antigas RASS obtiveram nomes próprios nacionais, como, por exemplo, Tartaristão.

A atual divisão administrativa e territorial da Rússia se estabilizou em 1993, com a aprovação da nova Constituição, bem como após a ampliação de algumas das subdivisões federativas, no período de 2003 a 2008; de fato, foram abolidos 6 dos 10 distritos autônomos. Resumindo: a Rússia abrange 21 repúblicas, nove territórios, 46 unidades federativas, duas cidades federais (Moscou e São Petersburgo), uma unidade autônoma –Evréiskaia (Judaica) e quatro distritos autônomos.

De todas as subdivisões administrativas, as mais numerosas são as unidades (em russo, oblast). Esta não tem determinação nacional, seu centro é a maior das cidades. A direção administrativa é exercida pelo governo local, dirigido pelo governador. A unidade federativa tem parlamento próprio, que legisla as leis de importância local; regra geral, elabora a pormenorização local para as leis federais. A principal lei de uma unidade é o estatuto. A unidade autônoma Judaica é única, em nada diferente de unidades federativas. Seu nome tem origem histórica.

Um território, nos termos de governabilidade, não é diferente de uma unidade federativa, só que é de maior tamanho. Alguns dos territórios foram compostos por várias unidades federativas.

Um distrito autônomo é uma subdivisão nacional territorial, que faz parte de outra subdivisão da FR –território ou unidade federativa, mas com amplos direitos. Os distritos autônomos são terras natais de alguns povos menores.

As repúblicas, ao contrário de territórios e unidades federativas, são formações nacionais estatais, ou seja, formas de estatismo de vários povos que fazem parte da Rússia. A título de exemplo: no Tartaristão, vive a maior parte dos tártaros da Rússia, um presidente dirige a república, a lei principal é a Constituição. A república tem direito de estabelecer mais uma língua estatal, de importância igual à da língua russa.

“As subdivisões federativas são muito diferentes, o que complica o governo, pois é preciso dispor de vários mecanismos e estratégias”, explica Vladímir Kagánski, cientista do Instituto de Geografia da Academia das Ciências da Rússia. “A Rússia de hoje é um império pela estrutura de espaço geográfico. O coração desse espaço é o centro, mas existe polarização entre o centro e a periferia, em todos os sentidos: político, étnico e, muito mais, econômico.”

Segundo Pável Kudiúkin, docente do departamento de teoria e prática de governo estatal da Escola Superior de Economia, a única explicação de tão complicado sistema administrativo é a inércia histórica. “O sistema que temos hoje em dia foi predeterminado pela organização administrativa do Império Russo e, mais tarde, do Estado Soviético”, esclarece o especialista.

O perito diz que, em conformidade com a Constituição da FR, todas subdivisões são iguais em direitos, mas algumas delas têm Constituições próprias, enquanto outras têm estatutos. “A propósito, nas constituições regionais há pormenores bastante curiosos. Por exemplo, a Constituição do Tartaristão contém uma afirmação de que a república é o sujeito do Direito Internacional, o que, claro está, contraria a legislação federal”, assinala Kudiúkin.

No ano 2000, surgiu uma divisão nova, em recordação da antiga: distrito federal. Esta foi uma das primeiras decisões de Pútin de grande envergadura no cargo de presidente. Atualmente, há 8 distritos federais: Central, de Bacia do Volga, Noroeste, do Extremo Oriente, dos Urais, do Sul, Siberiano e do Norte do Cáucaso. 

Os distritos federais foram necessários para melhorar a coordenação do poder local. Kudiukin explica que, nos anos 90, os dirigentes das entidades federais nas subdivisões fraternizaram com a elite local e estavam defendendo os interesses regionais em vez dos federais.

Contudo, o espaço russo, apesar de dividido em tantas fatias, é muito estável. “O país lembra-me bonecas tradicionais russas, matriochki, metidas umadentro da outra. O sistema pressupõe que a Rússia não se desintegre e, no pior dos casos, se esmigalhe nas bordas”, resume Natália Zubarevitch, a diretora do programa regional do Instituto Independente de Política Social. 

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