O ferreiro conta que, hoje em dia, há um número suficiente de bons mestres em Moscou Foto: Anton Agarkov
É difícil de acreditar, mas no Vernissage de Izmailovo, em Moscou, há uma forja de verdade. É lá que todos os finais de semana Víktor Mizgirev ensina aos interessados como transformar peças de metal pouco atraentes em objetos graciosos. Ele possui alunos regulares, mas há também os espectadores ocasionais. Até recém-casados e estrangeiros às vezes aparecem.
Víktor é nativo da cidade de Velikii Ustiug, que se tornou conhecida como a pátria de Papai Noel. Mas a verdade é que ela é a pátria de heróis que existiram na vida real, os viajantes russos Semion Dejnev e Erofei Khabarov, desbravadores da Sibéria. Antes de se empolgar com o ofício de ferreiro, Viktor trabalhava com escultura em madeira.
"Eu precisei de uma ferramenta engenhosa que não podia comprar e então fui procurar um ferreiro local. Era época de semear os campos e ele estava ocupado com a manutenção do maquinário agrícola, por isso, sugeriu-me que fizesse, eu mesmo, aquilo o que precisava", conta Víktor. Depois, ele começou a visitar a forja com maior frequência, adquiriu as suas próprias ferramentas e, aos poucos, começou a trabalhar.
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"Mais tarde tive um desentendimento com o meu empregador e me mudei para Tula, onde imediatamente me ofereceram um trabalho de ferreiro", disse o jovem.
Ele conta que mais tarde, quando veio à Moscou depois de ter trabalhado três anos e meio como ferreiro, um mestre moscovita disse-lhe que ele não sabia fazer nada e o tomou como aluno. Em 9 meses, ele foi capaz de aprender todos os segredos de seu mestre. "Aprendi a forjar nos estilos barroco e moderno e forjei diferentes artefatos artísticos complexos”, conta. “Ensinaram-me a enxergar o metal. Então, surgiu o meu próprio estilo.”
Atualmente, além do trabalho de ferreiro, Víktor continua fazendo esculturas de ossos, madeira e casca de bétula. Ele tenta preservar um ofício original, o entalhe vazado em casca de bétula, que teve origem em Shemogodskaia Volost (unidade administrativa na Rússia czarista). Também participa de festivais de reconstrução histórica e, junto com os reconstrutores históricos, desenvolve atividades na área da "arqueologia experimental", ou seja, a determinação da funcionalidade dos objetos antigos encontrados. Agora pretende ocupar-se da confecção de joias, juntamente com um joalheiro. Mas o forjamento ocupa posição central nesse cenário.
“O metal me permite fazer muitas coisas. Se você estabelecer uma relação amigável com ele, poderá fazer o que quiser. Mas se você veio de mau humor, então não conseguirá fazer nada certo, nem mesmo um prego”, observa o mestre. Víktor tem seu próprio cartão de visita –um prego grande com um retrato em sua cabeça.
O ferreiro conta que, hoje em dia, há um número suficiente de bons mestres em Moscou, mas o verdadeiro forjamento é algo cara e acessível a poucas pessoas. É exatamente por isso que surgiu um método mais barato de produzir padrões de decoração em aço, que frequentemente é apresentado como forjamento. “Atualmente, é comum apresentarem algo feito com a ajuda de uma máquina de dobra como sendo um produto de forjamento. As pessoas compram barras de metal nas lojas e, utilizando uma máquina especial, flexionam essas barras, depois conectam tudo com a ajuda de uma solda”, conta Víktor.
Durante a conversa com Víktor, quatro alunos trabalhavam na sua oficina. Vania (diminutivo de Ivan), o mais jovem na forja, conta que sempre quis se ocupar com o ofício de ferreiro –já faz mais de um ano que frequenta a oficina para aprender com Víktor. Ele sonha em fazer do ofício a sua principal ocupação. Enquanto isso, tendo um diploma de engenheiro, trabalha numa agência de publicidade. O que ele consegue fazer melhor é criar flores de metal.
Foto: Anton Agarkov
Outro aluno, Dmítri, se concentra em uma armação de óculos forjada. Ele tem a sua própria empresa, onde faz lentes para óculos. Ele conta que já faz muito tempo que tinha vontade de inventar algo especial. Entrou na oficina por acaso e acabou ficando. "É claro que fico cansado fisicamente, porque passo aqui os finais de semana, mas não há melhor descanso do que uma mudança no tipo de atividade", diz.
O mestre ferreiro destaca que pessoas muito diferentes aparecem para aprender o ofício de ferreiro. Alguns não sabem fazer absolutamente nada, outros não precisam de nenhuma explicação. "Certa vez um banqueiro dos EUA, que havia herdado a sua posição, veio à minha oficina e disse que estava vendo um martelo pela segunda vez em sua vida e que a primeira vez havia sido no Museu do Velho Oeste. Ou ainda um deputado do Parlamento russo que não conseguia fazer absolutamente nada com as mãos. É justamente o trabalho manual que permite desenvolver o pensamento imaginativo e criativo. Quando uma pessoa começa a trabalhar com as mãos, até a sua cabeça começa a funcionar de uma maneira diferente."
Muitas pessoas vêm apenas para olhar o ferreiro. Os estrangeiros entram com bastante frequência na oficina, mais por curiosidade, mas há aqueles que realmente tentam forjar. "Eu tenho aulas master especiais para recém-casados. O noivo forja uma base para a ferradura e a noiva dá uma forma a ela. Para que as pessoas sintam que o homem deve criar uma base para a vida familiar, e a mulher dar os contornos adequados, embelezá-la”, ele explica.
O ferreiro conta que os japoneses foram os que mais se surpreenderam com o seu trabalho, porque para eles um mestre deveria ser um homem em idade avançada e não alguém com 25 anos. "Eles não conseguiam acreditar de maneira alguma que tudo isso é trabalho meu e que eu tenho alunos" acrescenta Víktor.
Víktor tem dois filhos ainda muito pequenos para irem à oficina, mas a criança mais velha, de três anos, escolheu um martelo de quatro quilos como brinquedo favorito. “Como ele consegue erguê-lo permanece um mistério para mim, porque até mesmo um martelo de um quilo e meio me pareceu pesado", conta o ferreiro aos risos.
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