Vale ressaltar que as reformas trouxeram certas melhorias à saúde pública da Rússia Foto: RIA Nóvosti
Desigualdade e injustiça na saúde pública costumam andar juntas na maioria dos países, onde a qualidade do atendimento médico depende amplamente da condição financeira do paciente.
Na era soviética, o governo acreditada que o sistema de saúde pública gratuito teria plena capacidade de eliminar qualquer desigualdade entre os pacientes, o que levou à adoção do conceito de assistência médica para todos, que inicialmente trouxe bons resultados no combate de muitas doenças infecciosas, redução da quantidade de casos de tuberculose, assim como no controle de epidemias.
Porém, com o passar do tempo, o sistema de saúde gratuito soviético transformou os médicos, a elite da sociedade, em trabalhadores comuns das "fábricas de saúde".
Os próprios hospitais, sem direito de exercer qualquer atividade comercial, dependiam do orçamento federal e, muitas vezes, não possuíam recursos suficientes para oferecer nem um atendimento de qualidade, nem desenvolver as próprias pesquisas na área médica.
Do outro lado, os pacientes não podiam exercer os seus principais direitos protegidos pela legislação da maioria dos países desenvolvidos, tais como o acesso ao próprio diagnóstico, solicitação das informações em relação ao tratamento oferecido, incluindo a possibilidade de aceitá-lo ou recusá-lo, manutenção do sigilo e confidencialidade dos dados pessoais e ficha médica.
O pai da Aleksandra (que não quis revelar seu sobrenome) foi diagnosticado com câncer no final da década de 1970. Na época, o médico não era obrigado a repassar ao paciente as informações referentes ao seu diagnóstico, porém tinha todos os direitos de divulgá-las aos seus parentes. A decisão do médico de não submetê-lo a nenhum tratamento foi aceito por Aleksandra e sua mãe. Em um ano, ele faleceu, sem ela saber o seu verdadeiro diagnóstico e sem exercer o seu direito de tomar a própria decisão em relação ao possível tratamento, o que o obrigou a depender do bom senso do seu médico e de seus familiares. Quanto à Aleksandra, o tempo mudou a sua percepção em vários aspectos da vida e hoje ela não consegue se perdoar pela decisão tomada há muitos anos.
Vale ressaltar que o registro residencial obrigatório dos pacientes soviéticos inscrevia-os automaticamente em um centro médico específico, tornando impossível o atendimento em qualquer outro ambulatório ou hospital, mesmo pagando pelos seus serviços. Os pacientes graves poderiam ser transferidos para hospitais melhores, mas apenas mediante um pedido emitido pelo centro médico responsável pelo seu primeiro atendimento. Um cidadão comum não tinha direito de escolher um profissional de saúde e pagar pela consulta, o que criou uma injustiça ainda maior: os pacientes foram obrigados a buscar atendimento do médico escolhido usando os seus contatos pessoais.
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Com as reformas do sistema de saúde no final da década de 1980 e do início dos anos 1990 foi introduzido o conceito de serviços pagos, uma maneira de distribuição de bens mais justa. No entanto, com esta novidade, os serviços gratuitos não deixaram de existir. Uma nova lei de saúde pública aprovada em 2011 dividiu os serviços prestados pelos hospitais em obrigatórios gratuitos, que não poderiam deixar de existir devido a uma grande quantidade de cidadãos com baixa renda, cuja maioria era de terceira idade, e adicionais, a serem pagos pelo próprio paciente.
Liudmila (que também não quis revelar seu sobrenome), viúva há dez anos, é uma gerente aposentada que tinha ótima remuneração no passado e que conseguiu formar uma boa poupança e conhecer o mundo através de viagens a trabalho para o exterior, mas que nunca teve filhos.
Recentemente, uma doença oncológica a pegou de surpresa e Liudmila procurou o atendimento médico gratuito.
"Estou internada em um hospital que oferece tratamento e todas as refeições de graça. Quando não consigo me levantar, conto com a ajuda das enfermeiras e auxiliares, serviços os quais também não pago nada. Ao longo da internação, a presença dos familiares não é necessária", explica Liudmila. "A única dificuldade é continuar o tratamento em casa após receber alta, pois os medicamentos não são oferecidos pelo governo. Assim que adoeci, passei a ser considerada uma deficiente, o que me dá direito a ter um pequeno aumento na minha aposentadoria. No entanto, ela não é suficiente. Não imagino o que faria se não tivesse a minha poupança", acrescenta ela.
Vale ressaltar que as reformas trouxeram certas melhorias à saúde pública da Rússia. De acordo com estimativas do Ministério da Saúde e Desenvolvimento Social, os centros médicos russos oferecem a maior parte dos tratamentos e serviços disponíveis no mercado internacional. No entanto, mesmo os tratamentos ausentes nos hospitais do país, mas amplamente utilizados fora do seu território, poderão ser pagos pelo governo russo, caso haja toda a documentação exigida.
Além disso, a nova legislação prevê a proteção dos direitos de pacientes, tais como o direito de saber o próprio diagnóstico, as informações referentes ao tratamento disponível, incluindo a possibilidade de aceita-lo ou recusá-lo, assim como o direito de manutenção do sigilo e direito de escolher qualquer profissional e instituição de saúde pública.
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