Lei que condena “insulto religioso” entrará em vigor a partir de 1º de julho

Lei poderá ser aplicada a cidadãos que promoverem "insultos religiosos" durante cerimônias Foto: Reuters

Lei poderá ser aplicada a cidadãos que promoverem "insultos religiosos" durante cerimônias Foto: Reuters

Concebida após a apresentação polêmica da banda punk Pussy Riot na Catedral de Cristo Salvador ,em Moscou, a nova lei que estipula penas para o insulto a sentimentos religiosos. Especialistas qualificam o texto da norma como “vago” e garantem que dá margem a arbitrariedades.

De acordo com as novas alterações ao Código Penal, as ações públicas que expressam nítido desrespeito pela sociedade realizadas com o objetivo de insultar os sentimentos religiosos dos fiéis são sancionadas com uma multa de até 300 mil rublos (cerca de US$ 9,3 mil) ou uma pena de até um ano de prisão.

As mesmas ações realizadas em lugares de prática religiosa poderão dar uma multa de até 500 mil rublos (cerca de US$ 15,4 mil) ou uma pena de até  3 anos de prisão.

Até agora, o artigo “Insulto a sentimentos religiosos dos cidadãos” fazia parte do Código de Infrações Administrativa e previa uma multa de até 1000 rublos (cerca de US$ 30).

"Os autores do diploma formularam muito bem esse artigo”, disse Mikhail Fedotov, presidente do Conselho de Direitos Humanos junto à Presidência do país. Em comparação com a redação anterior apresentada em setembro de 2012, a atual versão diminuiu a pena máxima prevista para esse tipo de crime de cinco para três anos de prisão e substitui a frase “ofensas às crenças e sentimentos religiosos” por “ações públicas (...) com o objetivo de insultar os sentimentos religiosos dos fieis”.

Fedotov também disse que seria incorreto interpretar esse artigo como punitivo. “Como há a presunção de inocência, é preciso provar que as ações tiveram o objetivo de ofender os sentimentos religiosos”, completou. 

Como exemplo, o responsável citou a frase “Deus não existe”. Por si só, isso não constitui um ato incurso no artigo acima citado, mas “se uma pessoa entrar em um santuário empunhando um cartaz com tais dizeres ou gritar isso em lugares de culto, especialmente durante a prática religiosa, suas ações serão obviamente consideradas como contrárias à lei”, acrescentou Fedotov.

O Conselho de Direitos Humanos insistira em que processos criminais nos termos desse artigo tenham início só após a apresentação de queixa pela vítima. No entanto, a proposta foi rejeitada, e pela versão atual do artigo o processo pode ter início com um auto levantado pela polícia.

Juízo final?

Segundo o presidente da Ordem dos Advogados de Moscou, Guenri Reznik, a nova norma legal causa uma duplicação de alguns termos no direito penal russo. Por exemplo, o Código Penal já contém artigos referentes à incitação ao ódio religioso e à humilhação da honra e da dignidade, inclusive por motivos religiosos.

O artigo “Insulto a sentimentos religiosos” do Código de Infrações Administrativas existe há mais de dez anos e nunca foi aplicado na prática. Reznik argumento, contudo, que esse termo não tem uma definição jurídica clara, o que aumenta o risco de abuso do direito.

“Temos de ver como essa norma legal será aplicada”, disse Mikhail Barchevski, representante do governo nos tribunais superiores, em entrevista à emissora de rádio Eco de Moscou. O jurista lembrou a esse respeito os debates travados, em outros tempos, em torno de uma outra lei polêmica que dispunha sobre o extremismo. “As normas estipuladas naquela lei nos pareciam tão vagas que permitiam intimar qualquer pessoa”, completou Barchevski.

“Essa lei deve ser aplicada de forma equilibrada. Mas, para ser honesto, acho que, durante sua aplicação, haverá uma certa guinada em direção à Igreja Ortodoxa Russa”, disse Aleksandr Chatilov, decano da Faculdade de Sociologia e Ciências Políticas da Universidade de Finanças junto ao governo do país.

Segundo ele, a mídia liberal lançou uma campanha contra a Igreja Ortodoxa Russa e o Patriarca Kirill por apoiarem sem reservas o governo atual, para descontentamento da oposição.

“As ofensas aos sentimentos religiosos dos crentes e os atos de profanação de seus objetos venerados têm sido sempre considerados como inadmissíveis. Agora, as sanções para tais ações aumentaram, o que, espero, ajudará a evitar, no futuro, as tentativas de profanar os símbolos religiosos e insultar os sentimentos religiosos dos fieis”, rebateu Vsevolod Chaplin, diretor do departamento da Igreja Ortodoxa Russa para as relações com a sociedade, citado pela agência Ria Nóvosti. 

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