Hadaia (à dir.), que sobreviveu a um ataque de mísseis na Síria, lamenta por locais: “Há mortos por toda parte”.
RIA NôvostiViajar a trabalho para a Síria foi uma iniciativa pessoal?
Já tinha feito cobertura de guerra antes, na Ucrânia. Expressei o desejo de ser enviado à Síria, pois tinha interesse em olhar para a situação por dentro. Até então eu vinha trabalhando com os processos políticos de resolução do conflito na Síria. Havia entrevistado [o presidente sírio] Bashar al-Assad e coberto as negociações em Genebra, Viena e Moscou.
Você se preparou antes da viagem?
Tínhamos consciência de que estávamos indo para a guerra. A guerra não é uma imagem que vemos na televisão. A guerra é feita de tragédias e histórias pessoais difíceis de vivenciar. O que eu não esperava é que iriam atirar em jornalistas e que nossas vidas ficariam por um fio.
Como isso ocorreu?
Estávamos indo fazer uma filmagem no assentamento de Degmashlie, que havia sido libertado pelo Exército sírio. Fomos em três veículos. O primeiro míssil atingiu a encosta. Dois carros estavam à frente, estávamos no terceiro. Um segundo míssil acertou nosso carro.
Durante as três horas seguintes, enquanto o Exército sírio tentava nos transferir para um local seguro, Aleksandr Júkov, um cinegrafista militar, ficou filmando tudo com sua câmera. Enquanto nos tiravam de lá através de jardins destruídos e desativavam as minas, mais três ou quatro mísseis atingiram o quarteirão por onde caminhávamos.
O que sentiu naquele momento?
Logo me veio à cabeça que a situação era grave, estavam atirando para matar e eu precisava me concentrar para escapar dos disparos.
Depois, o mais complicado foi falar com os parentes, quando, no dia seguinte, eles viram tudo pela televisão. Já tínhamos sobrevivido a tudo, mas, pelas imagens, eles tinham que vivenciar tudo aquilo novamente, a partir do zero. Liguei para meus parentes, disse que os pés, a cabeça – estava tudo no lugar. Falei para não se preocuparem, pois tudo o que veriam já fazia parte do passado.
Você também encontrou com o piloto do Su-24 derrubado pelas forças turcas...
Ele não estava gravemente ferido, ficava em pé. Foi realmente ele quem deu a entrevista apresentada na imprensa. O seu rosto não foi mostrado por motivo de segurança, incluindo a segurança de sua família. O resto será informado pelo Ministério da Defesa.
De que forma a situação na Síria mudou após a intervenção russa?
Atualmente, a situação pode ser chamada de positiva para o Exército sírio e seus aliados, pois estão avançando em várias frentes, incluindo pelo norte de Latakia [no nordeste da Síria].
Tréguas estão sendo discutidas em paralelo, e esses avanços serão um excelente fator auxiliar para o início do processo político. Mas agora a prioridade consiste no combate ao terrorismo. Quando forem colocados pontos finais mais sólidos, então será possível falar sobre o avanço do processo político com base no Comunicado de Genebra e dos acordos de Viena.
Como os sírios comuns estão reagindo à presença russa?
Em Latakia, Homs, Tartus e Jableh, nos lugares onde estivemos, as pessoas estão contentes, gratas. Mas é preciso entender que, após cinco anos de guerra, qualquer que seja a alegria despertada pelo fato de que os russos vieram, o pesar permanece: há mortos por toda parte. Para as pessoas, a chegada dos russos não irá compensar as crianças mortas em ambos os lados do conflito.
Nem todos da oposição são terroristas. Por isso, é possível que a intervenção da Rússia acelere o processo político. Finalmente surgiu uma esperança para as pessoas. Elas estão satisfeitas? É difícil dizer. A libra síria está perdendo valor, o custo de vida sobe, não há dinheiro, há pouco trabalho e o inverno está na soleira da porta.
Por que você decidiu voltar a Moscou?
Nossas fotos publicadas na mídia russa foram postadas em um dos sites da chamada oposição moderada síria com a legenda: “Jornalistas russos foram feridos durante agressão russa contra o povo sírio”. Depois vinham os comentários: “Não morreram, temos que terminar o serviço”.
Os nossos rostos se tornaram reconhecíveis, e as ameaças endereçadas a jornalistas russos foram explicitadas várias vezes. Analisamos a situação e foi decidido que seria melhor a gente não se expor ao risco, nem os nossos colegas, pois estávamos atraindo a atenção não só para nós, mas também para o grupo todo.
A segunda razão do meu retorno foi que os nossos médicos na Síria não conseguiram retirar um dos estilhaços – ele se instalou profundamente na região da axila. Precisei ser operado em um hospital militar em Moscou.
Você retornaria à Síria depois da recuperação?
Por enquanto, a Síria se fechou para mim. Pode ser que o processo político se inicie depois do Ano Novo. Tenho um bom relacionamento com o governo sírio e com todos os seus negociadores que atuam junto ao pessoal da oposição. Por ora, vou me ocupar desse tema.
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