O que “The Putin Interviews” traz de novo

Pútin: “Estamos ligados à Ucrânia por milhares de fios”

Pútin: “Estamos ligados à Ucrânia por milhares de fios”

Reuters
Na semana passada, o canal americano Showtime exibiu uma série de documentários sobre o presidente russo Vladímir Pútin. Por 4 horas, o cineasta Oliver Stone entrevista um dos líderes mais poderosos do planeta sobre política internacional, economia e até família.

Poucas pessoas tiveram esse grau de acesso ao presidente russo - ainda mais em se tratando de um cineasta ocidental. Mas, antes mesmo de ir ao ar, o documentário “The Pútin Interviews” foi alvo de pesadas críticas nos Estados Unidos. Comentaristas destacaram que Stone tratou Pútin de maneira muito gentil, sem fazer perguntas difíceis e, quando as fazia, se contentava com a primeira resposta. Stone, que gravou o documentário durante mais de um ano, esclareceu que seu objetivo era apenas conversar com Pútin, para que apresentasse o ponto de vista dele sobre o que está acontecendo no mundo.

“Você nunca foi atacado antes?”, pergunta Pútin a Stone em uma das últimas cenas do documentário, prevendo que o diretor seria duramente criticado no Ocidente. Mas Stone rebate que ele está disposto a enfrentar as opiniões negativas, se o seu documentário ajudar a trazer mais paz e entendimento mútuo ao mundo.

Confira abaixo alguns dos principais temas abordados no programa:

Vida pessoal

Tradicionalmente, o presidente da Rússia não dá muitos detalhes de sua vida pessoal - e algumas coisas que contou a Stone surpreenderam até mesmo os russos. Revelou, por exemplo, que já tem netos, filhos de suas duas filhas, e que adora brincar com eles, muito embora a agenda apertada não permita visitas frequentes. A família ocupa um lugar especial em sua vida. Em um trecho, ele lembra de quando foi nomeado primeiro-ministro, em 1999. Na época, o que mais o preocupava era o que aconteceria com suas filhas caso ele caísse em desgraça.

Pútin também falou sobre sua juventude em Leningrado, atual São Petersburgo. O presidente russo diz que “basicamente cresceu na rua” e era bem desorganizado. Isso até começar a lutar judô, o que, segundo ele, fez sua vida “mudar para melhor”. Até hoje o esporte tem papel central na vida dele. Basta lembrar que, aos 60 anos, começou a jogar hóquei para experimentar algo novo.

Problemas com o Ocidente

Saindo da família e falando de política. Stone questiona Pútin sobre as relações com o Ocidente, uma das principais questões da diplomacia nos últimos anos. O presidente russo se mostra insatisfeito com o Ocidente, especialmente com os EUA, pelo que chama de relutância em estabelecer um diálogo com a Rússia. Ele acredita que os EUA veem a si mesmos como a única grande potência mundial, levando a uma política externa agressiva e um pensamento imperialista.

“A União Soviética se desagregou, a Guerra Fria acabou, o inimigo não existe mais”, lembra o presidente. Mesmo assim, ele considera que os EUA seguem criando uma imagem de que a Rússia seria o grande inimigo.

Pútin enumera uma longa lista do que chama de pecados do Ocidente: começando pela guerra na Tchetchênia, onde os norte-americanos teriam fornecido secretamente ajuda aos separatistas, até chegar a uma política provocativa na Ucrânia que fomentou o nacionalismo e a guerra civil.

Depois ele fala na crise da Ucrânia, afirmando que uma política de provocações elevou o nacionalismo e acabou levando à guerra civil.

O presidente ainda considera ser um problema a instalação de um escudo antimísseis na Europa Oriental, o que poderia levar a uma nova corrida armamentista. Ao mesmo tempo ele chama os americanos de “parceiros” e defende mais diálogo para normalizar as relações.  

Crimeia e Síria

Falando sobre a integração da Crimeia à Rússia, Pútin recusa o termo “anexação”: ele enfatiza que essa era a vontade do povo da península e que as tropas russas apenas garantiram a segurança durante o referendo. Ele reconheceu que as relações com a Ucrânia estão muito ruins, mas espera que com o tempo tudo se acerte: “Estamos ligados à Ucrânia por milhares de fios”.

Sobre a guerra na Síria, Pútin garante ter dois objetivos no país: evitar um colapso do Estado, como aconteceu no Iraque e Líbia após a derrubada de líderes autoritários, e lutar contra grupos terroristas, como o Estado Islâmico, que ameaçam também a própria Rússia. Paralelamente, admite que o governo de Bashar al-Assad poderia ter cometido erros e diz se colocar à disposição para cooperar com todos os países para combater o terrorismo.

Eleições norte-americanas e Trump

Em um dos temas mais esperados da entrevista, Pútin fala sobre a eleição nos EUA em 2016, rejeitando as acusações de que teria “determinado” os rumos da votação, com a ajuda de hackers. “Essa é uma afirmação muito estúpida. Não nos envolvemos em quaisquer ataques de hackers”, disse, enfatizando que a Rússia, assim como qualquer outro país, não poderia influenciar as eleições nos Estados Unidos. Pútin acredita que a derrota de Hillary Clinton, é consequência de seu próprio fracasso e do sucesso da campanha de Donald Trump.

Ao mencionar o novo presidente dos EUA, Pútin fala com respeito e recebe bem o desejo da Casa Branca de melhorar as relações entre os dois países. Mas sem deixar de ser um pouco cético. Para ele, a personalidade do presidente decide pouco - quem manda mesmo é a burocracia. Mesmo assim afirma que “sempre existirá esperança (de que virão mudanças para melhor), enquanto nós não formos levados ao cemitério”. Oliver Stone ri: “Isso é muito russo!”.

A vida na Rússia

Quando Stone perguntou Pútin sobre assuntos que geram críticas à Rússia, como opressão à população LGBT, pouca liberdade de imprensa e o sistema político pouco democrático, o presidente disse que as queixas não procedem. Ele garante que não há barreiras para orientações consideradas não-tradicionais. Também diz que há centenas de empresas de comunicação que não são controladas pelo Estado e disse que há rotatividade no poder do país.

Ele reconhece, porém, que a Rússia tem pouca experiência de democracia, pois até a década de 1990 o país viveu sob Monarquia ou sob a ditadura do Partido Comunista. “É claro que é impossível imaginar que de uma hora para outra teremos a mesma estrutura que os Estados Unidos, a Alemanha ou a França”, disse o presidente. Perguntado se seria candidato na eleição presidencial de 2018 (se ele vencer a eleição, então o mais provável é que irá governar a Rússia até 2024), Pútin não respondeu.

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