Boris Iéltsin assumiu o poder da RSFSR em 1991 Foto: Reuters
Refletir sobre a Rússia pós-soviética é difícil até mesmo para quem acompanha a história de perto. Se, por um lado, a maioria dos especialistas e historiadores tende a acreditar que o novo Estado russo passou no teste do tempo, por outro, muitos chamam a atenção para o seu caráter contraditório.
Para eles, a contradição é nada mais que um reflexo da própria ambiguidade na aprovação do documento da soberania da Rússia no contexto da URSS. Afinal, a Rússia era a principal estrutura de sustentação da União Soviética, que deixou de existir em dezembro de 1991.
A Declaração de Soberania do Estado da RSFSR foi adotada no Primeiro Congresso dos Deputados do Povo, em 12 de junho de 1990. O documento fala sobre a “determinação de criar um Estado democrático de direito no contexto da renovada União Soviética”. A declaração estabeleceu a supremacia da Constituição no território da RSFSR.
Em entrevista à Gazeta Russa, o diretor do Centro de Estudos Políticos do Instituto de Economia, Boris Chmelev, ressaltou que, embora ao longo dos últimos 27 anos a Rússia tenha criado instituições de governabilidade e sociedade civil, o Estado russo ainda não foi capaz de organizar o seu sistema econômico nem adquirir a estabilidade necessária.
“Apesar de ser um regime brando, o que temos não deixa de ser um regime autoritário: ainda não temos um sistema de freios e contrapesos, o Parlamento funciona apenas como uma máquina de votação, não existe um sistema partidário estável e a corrupção é uma prática comum”, disse Chmelev. “Isso se deve, em parte, ao fato de a Rússia não ter ainda conseguido construir um sistema político democrático eficaz.”
O presidente do Instituto de Estratégia Nacional, Mikhail Remizov, concorda que o país ainda não se formou como um sistema republicano estável, já que não há concorrência nem alternância de poder. “Mudar de equipes por concorrência pública é algo que não acontece no nosso país– aqui atua o mecanismo da sucessão, é uma dinastia presidencial informal”, afirma o cientista político.
Mesmo assim, Remizov acredita que o atual sistema tem as suas vantagens em termos de consolidação do poder e superação de crises. Segundo ele, a instituição de um poder presidencial forte na Rússia atua como uma “pedra angular sobre a qual assenta a construção nacional”.
Herança soviética
Embora o poder presidencial forte tenha suas vantagens, os cientistas políticos destacam a fraqueza de outras instituições do Estado, nomeadamente o Parlamento. Entre as demais vulnerabilidades do atual sistema, alguns observadores apontam também para a existência de repúblicas étnicas dentro da Federação Russa.
Nesse aspecto, mantém-se s lógica soviética de construção nacional: em vez de criar uma nação como uma entidade política única, a Federação da Rússia se apoia na construção de um Estado multiétnico.
“Se falamos da pluralidade de povos dentro do país, isso significa que o país é composto por unidades federativas com direito à autodeterminação e todas as consequências que daí resultam”, observa Remizov. Mas esta não é a única característica contraditória relacionada ao passado soviético.
De acordo com Mikhail Vinogradov, presidente da Fundação Política de São Petersburgo, a Federação Russa sente uma espécie de vergonha da sua atual condição de Estado e tenta fortalecê-lo à custa da continuidade da URSS.
“É um grande risco porque, ao considerar toda a história desde Rurik [o fundador do Estado da Rússia Antiga], a Federação Russa se priva do sentimento de país jovem. Enquanto isso, os países pós-soviéticos que se consideram jovens apresentam uma dinâmica melhor”, disse Vinogradov à Gazeta Russa, apontando para o exemplo de países bem-sucedidos como Cazaquistão e Azerbaijão.
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