Imagem de Arafat é marcada por contraste entre período soviético e Rússia contemporânea Foto: AFP/East News
Na União Soviética, o líder palestino era bem conhecido. Iasser Arafat fez a sua primeira visita a Moscou em 1968. Na época, ainda não era universalmente reconhecido como líder do povo palestino, mas a sua credibilidade no mundo árabe cresceu rapidamente.
Apresentado em Moscou ao secretário-geral do PCUS (Partido Comunista da União Soviética), Leonid Brejnev, o palestino agradou à liderança da URSS e passou a contar com o apoio do Kremlin. As causas da amizade com o “camarada Arafat” eram evidentes: os soviéticos ganhavam em apoiar os políticos que se opunham à Israel pró-EUA. Paralelamente, Arafat precisava dos recursos poderosos da superpotência para garantir a obra de sua vida – a luta pela libertação da Palestina.
A ajuda financeira da URSS à causa palestina é estimada entre US$ 400 e 700 milhões. Em termos políticos, a ajuda soviética teve ainda maior importância. Em entrevista ao jornal “Izvéstia”, o vice-diretor do Instituto de Estudos Orientais, Vladímir Issáiev, afirma que graças à União Soviética os israelenses não invadiram Beirute, em 1982. Como ali se encontrava a sede da (OLP) Organização para a Libertação da Palestina, haveria grande chance de aniquilar por completo o movimento da resistência.
Mesmo assim, a relação de Arafat com Moscou teve altos e baixos. Segundo o analista político Serguêi Strokan, é provável, por exemplo, que o líder palestino estivesse por trás do sequestro dos cidadãos soviéticos em Beirute, em 1985. Na época, os militantes palestinos chantagearam o Kremlin, exigindo que este exercesse pressão sobre a sua aliada Síria, que combatia os palestinos no Líbano.
Ficou comprovado que os sequestradores não tinham qualquer relação com Arafat, mas o assassinato de um dos reféns teve a participação de dois de seus guardas. O líder da OLP disse que pagou aos terroristas o resgate pelos reféns, mas isso aconteceu depois de os serviços de inteligência terem interceptado uma conversa entre Arafat e sua equipe, na qual ele ordenava que “não libertassem os reféns sem a respectiva ordem”.
Os reféns foram então parar nas mãos do Hezbollah. Para Strokanov, não restam dúvidas de que o próprio Arafat os entregou ao grupo islâmico, embora não exista nenhuma acusação formal.
Terrorista ou pacificador?
Com o colapso da URSS, a situação internacional mudou. Em 1991, a Rússia estabeleceu relações diplomáticas com Israel e passou do apoio incondicional à OLP a uma posição mais contida. Em muitos aspectos, foi precisamente o enfraquecimento da União Soviética e o fim dos investimentos financeiras oriundos da potência socialista que obrigaram Arafat a substituir a luta armada pelas negociações de paz com Israel, cuja destruição defendeu com fervor durante anos.
Enquanto na União Soviética a imprensa oficial descrevia Arafat com termos elogiosos, a queda do regime soviético resultou em uma visão diversificada do líder palestino. Surgiu então quem odiasse Arafat, considerando-o um terrorista. Paralelamente, outros jornalistas, como, por exemplo, o colunista da “Rossiyskaya Gazeta” Aleksandr Sabov, escreviam sobre o importante papel do líder palestino na mudança do posicionamento da OLP em relação a Israel.
Segundo Sabov, o acordo de Oslo, assinado por Arafat, não levou à paz na região, mas “o fato de o ex-lutador implacável contra o sionismo ter apertado a mão do chefe do governo israelense foi um ato de grande importância”.
Cores de Arafat
A Cúpula para a Paz no Oriente Médio em Camp David, em julho de 2000, poderia ter sido a apoteose dos esforços empreendidos por Israel e Palestina. Mas isso não aconteceu, e grande parte da culpa pelo fracasso recaiu sobre Arafat. Dali em diante, o líder palestino ficou conhecido por muitos como um “político incapaz de negociar”.
Após sua morte, vários jornais russos escreveram que a entrada em cena de líderes mais moderados, como Mahmoud Abbas, poderia “realmente tirar do beco sem saída um dos conflitos mais antigos do mundo”. Mas isso também não ocorreu. O Estado palestino jamais foi criado, o confronto interno entre o Fatah e o Hamas se intensificou, e as frequentes desavenças com Israel ainda resultam em mortes de civis de ambos os lados.
Na tentativa de descrever a personalidade de Iasser Arafat, o jornalista especializado em relações internacional Farid Seiful-Mulyukov, que conhecia pessoalmente o líder palestino, resumiu: “Arafat é uma figura política complexa. Ele não pode ser pintado de uma só cor. Sua imagem política foi afetada por mais de meio século de tragédia envolvendo o povo palestino”.
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