Campanha negativa em excesso e calúnia podem sair pela culatra
IorchO Partido Democrata dos EUA encontrou um novo slogan para sua campanha eleitoral: “Trump é agente de Pútin”. No entanto, por enquanto, este mote só tem dado mais vigor à campanha do candidato republicano. Nos últimos dias, o bilionário excêntrico assumiu pela primeira vez a liderança nas pesquisas sobre a ex-secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, na corrida pela Casa Branca.
O escândalo do vazamento de 19.000 e-mails trocados pela presidente do partido, Debbie Wasserman Schultz, e outros seis dirigentes eclodiu na véspera da Convenção Nacional Democrata em que Hillary foi oficialmente apresentada como candidata à presidência. Descobriu-se (e já havia suspeitas) evidências explícitas de que a máquina do partido teria sido usada pela ex-secretária de Estado para se favorecer sobre o rival Bernie Sanders nas primárias. Acusada de abuso de “recurso administrativo”, Schultz demitiu-se antes mesmo da convenção.
E, agora, assim como os “patriotas” russos que sempre põem a culpa de tudo no onipresente departamento de Estado do Estados Unidos, os democratas norte-americanos querem transformar o fracasso interno do partido em uma vantagem eleitoral, afirmando que o presidente russo, Vladímir Pútin, estaria por trás dos hackers que invadiram correspondência privada – hackers, isto é, do FSB ou da GRU, a principal agência de inteligência. Essa teoria está sendo analisada pelo FBI e membros importantes da administração de Obama.
‘Tudo é possível’
Jornalistas do círculo do secretário de Estado dos EUA, John Kerry, fizeram indagações incisivas a respeito do assunto ao ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguêi Lavrov, durante as conversações entre os dois em Laos, no dia 26.
Obama também ficou a um passo de acusar oficialmente Moscou. “Tudo é possível”, disse o presidente dos EUA, quando perguntado por um repórter da NBC se a Rússia poderia ter influenciado as eleições norte-americanas para favorecer Trump. “E eu acho que Trump tem uma cobertura bastante favorável lá na Rússia”, acrescentou.
Acontece que um dos principais objetivos da campanha eleitoral dos EUA, julgando por essa lógica, é eleger um presidente de quem Pútin não goste. Como se os Estados Unidos não tivesse que enfrentar problemas mais importantes.
Nem mesmo o ex-agente da NSA, Edward Snowden, que denunciou um programa de vigilância em massa dos EUA, não conseguiu ficar em silêncio em seu asilo político na Rússia. Ele lembrou a todos que a Agência Nacional de Segurança e a CIA dispõem de um programa chamado XKeyscore, que foi lançado em 2013 para ajudar a determinar o lugar de origem do ataque de um hacker. Quando a Coreia do Norte foi acusada de invadir o site da Sony, em 2014, o XKeyscore foi peça fundamental na investigação. Atualmente, porém, a administração dos EUA limita-se a alusões ou direciona as acusações a empresas privadas especializadas em segurança cibernética.
Tiro pela culatra
Seja qual for o caso, o uso de uma arma tão estranha – basicamente “roupa suja que se lava em casa” – contra Trump pode ter efeitos inesperados para os democratas.
Em primeiro lugar, analistas políticos experientes sabem que “campanha negativa” em excesso e calúnia podem sair pela culatra: quem é pintado como o diabo por seus oponentes, mais cedo ou mais tarde, começa a ganhar pontos. Não se pode manchar uma pessoa de forma tão escancarada.
Além disso, como o ideólogo republicano Patrick Buchanan respondeu às acusações dos democratas, os Estados Unidos foram “os primeiros” a interferir nas políticas de outros países usando ONGs (cujas atuações foram restringidas na Rússia, na China e, recentemente, em Israel), e com outros métodos de espionagem e vigilância internet.
Buchanan insiste ainda que, se a Rússia invadiu ilegalmente e-mails dos democratas, então o país deveria receber um prêmio Pulitzer de jornalismo – por revelar métodos de manipulação suja e a subversão de eleições honestas.
Foi isso que o “The New York Times” fez na década de 1970 quando publicou documentos secretos das administrações Kennedy e Johnson sobre a preparação para a Guerra do Vietnã, revelando métodos sujos e provocações. Foi por essas publicações que o jornal recebeu o prêmio Pulitzer em 1971. “Por que não atribui-lo a Pútin agora?”, disse Buchanan, sarcasticamente.
Até certo ponto, concordo com ele. Mas fato é que os mais de 19.000 e-mail do Partido Democrata que o Wikileaks divulgou comprovam que Hillary não ganhou as primárias de maneira honesta. E Trump não tem nada a ver com isso. Nem Pútin.
Geórgui Bovt é membro do Conselho para a Política Externa e de Defesa.
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