Ilustração: Aleksêi Iórch
Ao longo de anos, o Centro Levada realiza o monitoramento da opinião pública na Rússia: mede-se a popularidade dos governantes, identificam-se as principais opiniões da população sobre a situação econômica e política do país, bem como sua opinião sobre os eventos mais importantes da atualidade. E é justamente a comparação dos resultados de 2013 e 2014 que mostra mudanças significativas na mente dos russos no que diz respeito à “informação”.
No final de 2013, as respostas para essa questão eram extremamente variadas: o evento que havia atraído maior atenção dos russos em novembro daquele ano era o tufão nas Filipinas; em dezembro do mesmo ano, foi a vez do revezamento da tocha olímpica. Outros acontecimentos notáveis para russos foram as inundações no leste da Rússia, a Euromaidan, a anistia de Khodorkóvski, a morte de Nelson Mandela e os tumultos nem Biriuliovo, nos arredores de Moscou. Estes e outros eventos atraíram, com certeza, a atenção de pessoas no mundo inteiro, e a Rússia não era muito diferente dos demais.
Um ano depois, a situação mudou bastante. Em dezembro de 2014, a população russa pareceu desligar-se da agenda global de informação. Entre os dez eventos principais do ano figuraram, por exemplo, os acontecimentos relacionados com a situação na Ucrânia e com o confronto entre a Rússia e o Ocidente. Porém, o evento principal, mencionado duas vezes mais do que qualquer outro, foi a desvalorização do rublo. O resto parecia de pouca importância.
Nesse contexto, os surtos de Ebola, o referendo sobre a independência da Escócia e as várias cúpulas internacionais quase não foram marcantes. Em primeiro lugar porque a Ucrânia, e, em seguida, o confronto com o Ocidente, fizeram por muitos meses sombra ao resto. Já em novembro e dezembro, a desvalorização do rublo e a depreciação dos preços do petróleo chegaram para afastar a agenda ucraniana.
Mas por que a agenda global parou de preocupar a população russa? A estrutura do público dos meios de comunicação da Rússia tem, é claro, papel importante nesse cenário. No país, em torno de 90% da população fica sabendo das notícias nacionais e internacionais pela televisão.
Há 4 canais populares entre os telespectadores (Canal 1, Rússia, NTV e Rússia 24), que são controlados por órgãos estatais, seja diretamente ou indiretamente. A quantidade de telespectadores que acompanham os meios da comunicação não estatais não excede 15% da população.
Quase imediatamente após a ocorrência da Euromaidan, a televisão estatal começou a cobrir ativamente o que estava acontecendo no país vizinho. Entre o final de 2013 e o início de 2014, a Ucrânia ocupou a maior parte dos noticiários na Rússia. Nem as eleições do presidente Vladímir Pútin, nem mesmo a guerra com a Geórgia em 2008, provocaram um interesse tão forte dos telespectadores.
No entanto, apesar da abundância de informação, os russos admitiam que não entender muito bem aquilo que estava acontecendo e assistiam as notícias “com pouca atenção aos detalhes”. Assim, apenas 12% dos russos admitiram procurar um ponto de vista alternativo ao oficial – 37% disseram nunca ter ouvido outro ponto de vista.
Mesmo assim, seria errado atribuir o “autoisolamento” exclusivamente à mídia controlada pelo Estado. Em muitos aspectos, isso se tornou possível com base na indiferença comum da população a tudo o que acontece fora do circulo estrito de parentes, amigos e conhecidos.
De acordo com várias pesquisas da opinião pública, a grande maioria dos russos (65%) permanece indiferente aos conflitos internacionais na Síria, Palestina, Líbia, Egito, etc., ou pelas eleições nos Estados Unidos, Ucrânia e outros países.
Paralelamente, a iminente crise econômica, que a população já está começando a sentir, provavelmente só reforçará o foco dos russos sobre os seus próprios problemas, e, assim, aprofundará o autoisolamento, retardando a volta do país a uma maior integração global.
Denis Volkov é sociólogo principal do Centro Levada.
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